curado?

No Chile, proposta de “carnê de alta médica” a recuperados de covid-19 gera polêmica

Documento seria dado pelo governo, mas cientistas questionam se recuperados não podem adoecer de novo

Brasil de Fato | Valparaíso (Chile) |
O ministro da saúde chileno, Jaime Mañalich - Ministério da Saúde do Chile

No afã de regressar à normalidade e reativar o máximo possível das atividades econômicas, o governo chileno lançou uma ideia que vem causando controvérsia no país: entregar aos pacientes de covid-19 considerados recuperados da doença um documento que seria chamado “carnê de alta médica”, comprovar que essa pessoa superou a doença, e que supostamente, não estaria mais em risco de contrair novamente a doença.

A medida foi apresentada pelo ministro da Saúde chileno, Jaime Mañalich, como um mecanismo para que “as pessoas que já superaram a doença e podem retomar suas vidas, e que têm anticorpos positivos fiquem liberadas de todo tipo de quarentena ou outras restrições”.

Entretanto, a proposta vem causando forte polêmica no país, uma vez que muitos especialistas consideram que não há evidências científicas comprovadas de que os doentes que se recuperam não podem voltar a desenvolver a infecção.

O Colégio Médico do Chile foi o primeiro a se manifestar contra a ideia do governo, devido à ausência de estudos científicos que possam justificar tal medida.

Segundo Patricio Meza, vice-presidente do Colégio Médico, “ainda não existe clareza a respeito de qual será o comportamento imunológico dessa infecção. Há doenças que, uma vez superadas, a imunidade dura para a vida inteira, como a catapora, mas em outras essa imunidade pode durar menos tempo, e neste caso ainda não sabemos como esse fator se desenvolve no corpo de cada paciente”.

Segundo a determinação do Ministério da Saúde do governo de Sebastián Piñera, o carnê de alta médica seria outorgado mediante exame para comprovar os anticorpos que o paciente possui. O Colégio Médico do Chile considera que esse teste tampouco é suficiente para garantir que uma pessoa estaria totalmente livre do vírus, ou se poderia, por exemplo, contraí-lo posteriormente, de forma assintomática, tornando-se um vetor que poderia retransmiti-lo a outras pessoas.

Na semana passada, no dia 14 de abril, foi a vez da Associação Chilena de Imunologia (ASOCHIN) expressar sua contrariedade com relação à medida, por meio de um comunicado no qual afirma: “Não temos tempo nem estudos em quantidade suficiente para ter um conhecimento mais comprovado sobre a resposta imune do ser humano contra a covid-19, e, embora o organismo gere anticorpos para combater o vírus, a duração dessa resposta e o que pode conferir imunidade ainda é objeto de estudo”. Além disso, a entidade assegura que a produção de anticorpos é “altamente variável entre indivíduos”, e os pacientes que apresentam sintomas mais leves os desenvolvem em menor quantidade.

“Além disso, embora tenha sido observado que a geração de anticorpos é acompanhada de uma redução progressiva da carga viral, esta queda não é abrupta (…) por isso, nos parece que os critérios atuais de alta médica, e as medidas como o carnê de alta, merecem uma análise mais profunda da evidência científica disponível”, acrescenta o comunicado.

Polêmica por estatísticas de recuperados

Dias atrás, o ministro Mañalich protagonizou outra controvérsia, ao comunicar que as pessoas falecidas por covid-19 formavam parte — estatisticamente — do grupo de pessoas que “já não contagiam”.

Os questionamentos pelo manejo da epidemia por parte do governo de Sebastián Piñera incluem a forma como tem sido implementada a quarentena, de forma “estratégica e dinâmica”, segundo o termo preferido dos porta-vozes do Palácio de La Moneda.

Especialmente na capital Santiago, o governo tem decretado quarentena em algumas zonas da cidade, além de conceder uma grande quantidade de exceções, atendendo principalmente o critério de não afetar a economia, o que não permite um efetivo isolamento social, conforme o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Atualmente, o Chile tem 10,5 mil casos de covid-19, com 139 falecidos. Esta segunda-feira (20) foi uma das jornadas que registrou o maior aumento diário das cifras, com 419 novo infectados nas últimas 24 horas. As novas mortes foram 6. A região metropolitana de Santiago é a que apresenta os maiores problemas, com 5,7 mil casos (54% do total do país) e 67 mortes (48% do total do país).

Edição: Camila Maciel