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Bolsonaro faz novo apelo pela proibição de reajustes salariais; sindicatos reagem

Manifestação foi feita durante reunião com governadores. "O que estão fazendo é atacar os servidores", diz trabalhadora

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Em reunião com governadores, Bolsonaro contou com a participação dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre - Marcos Correa / Presidência da República

Em reunião virtual ocorrida na manhã desta quinta-feira (21) com governadores, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) fez um apelo para que se produza um consenso em torno da proibição de reajuste a servidores públicos durante a pandemia.

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Ele anunciou que deve sancionar, ainda nesta data, a proposta de auxílio aos estados, aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado nas últimas semanas, mas reafirmou o interesse no veto de alguns trechos, incluindo o que prevê esse tipo de reajuste. Na contramão do que vêm manifestando os segmentos trabalhistas, o presidente fez um apelo para que o Congresso Nacional não derrube o veto.

"Bem como nesse momento difícil que o trabalhador enfrenta, alguns perderam seus empregos, outros tendo salário reduzido, os informais que foram duramente atingidos nesse momento, buscar maneiras de, ao restringirmos alguma coisa até 31 de dezembro do ano que vem, isso tem a ver com servidor público da União, Estados e municípios, nós possamos vencer essa crise", disse Bolsonaro, reforçando o discurso que vem sendo feito pelo ministro da Economia, o ultraliberal Paulo Guedes.  

Em nota publicada após a reunião, a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), sem fazer avaliação de mérito sobre o pedido, lamentou o apelo. “Esse assunto não é consenso entre os governadores, mas, como já dito em outras oportunidades, sou contrária à medida. Não porque não reconheça as dificuldades concretas que enfrentamos, mas porque considero uma interferência da União nos estados e municípios”, disse.

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A proposta em questão é o Projeto de Lei Complementar (PLP) 39/2020, que instaura o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus e libera um valor de até R$ 125 bilhões aos estados e municípios, além do Distrito Federal (DF). A ideia é auxiliar os entes federados nas medidas de combate à covid-19 e minimizar o impacto da queda das receitas, que se agravou em meio ao aprofundamento da crise econômica nacional. O PLP prevê não só repasse de verbas, mas também a suspensão de dívidas.    

De autoria do governo Bolsonaro, o PLP fixava, inicialmente, o impedimento de reajuste para servidores, mas, durante o processo de debate da proposta no Legislativo, os parlamentares modificaram o texto, a contragosto da cúpula da gestão. A versão aprovada no Congresso lista algumas categorias profissionais que não poderão ser afetadas pela medida. Entre elas, estão profissionais de saúde, segurança pública, trabalhadores da educação, agentes socioeducativos e membros das Forças Armadas. Incomodado com a mudança, o governo atua agora para tentar reverter a modificação.

"Aprofunda a crise"

A defesa de Bolsonaro pelo impedimento de aumento salarial é duramente criticada por entidades sindicais e preocupa especialmente segmentos que acumularam perdas nos últimos anos. É o que caso dos professores da rede pública do Distrito Federal, onde a categoria está caminhando para o sexto ano de congelamento nos vencimentos e também no auxílio-alimentação. Para a diretora do Sindicato dos Professores do DF (Sinpro-DF), Rosilene Corrêa, a medida do governo federal tende a gerar prejuízos multilaterais, alcançando outros setores.   

“Isso agrava, aprofunda uma crise. E é uma coisa também não inteligente porque, se você considerar isso pra todos os servidores do DF, por exemplo, quanto também o próprio comércio do DF deixa de ter? Porque é o efeito dominó, levando em conta o alto número de servidores que tem aqui. Então, isso é levar para o sacrifício e fortalecer uma política de Estado mínimo, porque o que eles estão fazendo é atacar os servidores, que é o jeito de enxugar a máquina e servir ao mercado, porque eles estão aí pra isso”, critica a dirigente.

Isso é levar para o sacrifício e fortalecer uma política de Estado mínimo, porque o que eles estão fazendo é atacar os servidores

A presidenta da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), Shirley Morales, disse que vê a defesa de Bolsonaro com indignação. Ela afirma que o veto a reajustes ofende direitos trabalhistas e desconsidera também contextos específicos. No caso da categoria, que é uma das mais diretamente relacionadas ao combate à pandemia, a dirigente ressalta que muitos profissionais estão tendo despesas extras por estarem trabalhando diretamente com pacientes infectados pela covid-19. Com o eventual congelamento dos salários, tendem a ser ainda mais prejudicados.

“Hoje nós temos trabalhadores que precisam alugar casas porque, [convivendo] com as famílias, eles sabem que podem ser instrumentos de transmissão e infecção. Então, tem que alugar casas, tem que ter uma outra vida praticamente pra poder evitar esse risco aos familiares. E muitos ainda estão adoecendo e têm que custear o próprio tratamento porque, na rede pública, eles nem estão sendo testados, não há prioridade, não há fornecimento de EPIs ”, enumera a presidenta da FNE.

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Shirley Morales destaca ainda que a categoria, assim como outros profissionais, já vinha acumulando perdas. “E eu falo de perdas reiteradas, tanto nos âmbito municipal quanto estadual e, inclusive, no federal. Isso tudo, pra nós, é uma temeridade, porque o presidente nem estabelece medidas de prevenção à saúde desses trabalhadores nem não vê forma de corrigir os danos e prejuízos que eles já vinham sofrendo há anos”, finaliza.

Edição: Rodrigo Chagas