Rio Grande do Sul

OPINIÃO

Artigo | Arte e Cultura: ferramentas de denúncia e fortalecimento coletivo

É de extrema importância valorizar os artistas populares e garantir que o Estado pense em medidas emergenciais

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Arte tem sido importante como forma de aliviar tensão no isolamento e como crítica social - AFP

“No anfiteatro, sob o céu de estrelas
Um concerto eu imagino
Onde, num relance, o tempo alcance a glória
E o artista, o infinito”

Chico Buarque - Tempo e Artista

O mundo vive um momento histórico e sem precedentes com a chegada do novo coronavírus. Somada à crise econômica que tem se desdobrado desde 2008, seus impactos desestabilizaram não somente a economia, mas também agravaram problemas sociais, políticos, ambientais e sanitários. No Brasil, temos um cenário caótico desde o golpe na então presidente Dilma Rousseff em 2016. O governo interino de Michel Temer colocou em vigência uma agenda neoliberal que ataca diretamente os interesses das classes populares. É nesse governo que é aprovada a PEC do Teto de Gastos que congela os investimentos públicos por 20 anos. O que já não estava bom, ficou ainda pior com a eleição de Jair Messias Bolsonaro. O mesmo intensificou o desmonte do Estado, dos direitos sociais, além de declarar seu desprezo às liberdades democráticas. Poucos são os elementos para se comemorar.

Do mesmo modo que a pandemia tem afetado a Saúde, setores da economia e outros aspectos de nossa vida, a arte e a cultura também vivem uma época muito difícil e de muitas incertezas. Sendo assim, museus, teatros e instituições culturais tiveram suas portas fechadas devido à necessidade do isolamento social. Tal medida tem sido essencial para a preservação de milhares de vidas brasileiras, porém a não abertura desses espaços e a falta de público tem deixado muitos artistas em más condições socioeconômicas.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 44% dos artistas brasileiros trabalham de maneira autônoma. Contudo, o povo - principalmente a juventude - tem buscado refúgio através da arte. Ou seja, para enfrentar o impactos do coronavírus, uma parcela da população brasileira precisou achar formas de aliviar a tensão enquanto vivem o isolamento social.

Artistas do mundo inteiro estão fazendo performances através de lives, transmissão de saraus culturais, além de livros, filmes e materiais que estão sendo distribuídos gratuitamente. Nesse caminho, museus de arte acabaram abrindo portas apenas virtualmente. Mesmo que o acesso à arte e a cultura ainda sejam temas, por vezes, negados às classes populares, sendo muito invisibilizado nas periferias brasileiras, muitos artistas moradores de periferia estão organizando saraus por meio de redes sociais com vídeos gravados nas próprias casas e outras atividades.

Além disso, com os vários problemas financeiros que os artistas têm passado nesse momento, muitos editais estão sendo abertos com a intenção de financiá-los, porém a demanda de artistas precisando do financiamento é muito maior do que a oferta. Ainda assim, a arte está ajudado muitos brasileiros a se reinventarem e construirem meios de aliviar a tensão diante do momento atual.

O próprio artesanato, como a confecção de máscaras feitas na maioria das vezes por costureiras autônomas, está influenciando em nossa vida. Assim como a cultura visual está presente em nosso cotidiano, um bom exemplo são as máscaras customizadas com bandas, times de futebol, filmes, personagens preferidos e afins. Embora sejam detalhes, nos deixam de certa forma mais confortáveis em usar, por que de alguma forma essas máscaras têm uma identificação com nossos gostos e nossa história.

Além de toda essa tensão e adoecimento que a covid-19 tem proporcionado ao povo, o Brasil enfrenta também grandes dificuldades políticas. Sendo assim, a arte virou uma forma de denúncia. Temos exemplos dos panelaços denunciando Bolsonaro que ocorreram no país inteiro. Em São Paulo as grandes projeções tomaram toda a atenção nos prédios, por exemplo, colocando cards, desenhos e fotografias denunciando o governo Bolsonaro. Claro, além dos artistas que estão demonstrando sua insatisfação com esse governo de outras formas, a arte reafirma seu papel, sendo sua maior voz de denúncia.

Assim, como forma de reduzir danos à saúde mental e também dar voz e visibilidade a temas coletivos importantes da política como ferramenta de denúncia, a arte e a cultura têm se mostrado necessárias para a construção de uma sociedade crítica e que seja capaz de dar voz ao povo e suas denúncias, seja com desenhos, poemas, músicas, performances e até mesmo nas máscaras que precisamos usar...

Por fim, cabe reforçar que a arte e a cultura possuem papel fundamental na produção de conteúdo e conhecimento, principalmente através da Agitação e Propaganda de movimentos sociais. A arte é uma ferramenta política essencial para o povo brasileiro, a mesma deve servir ao povo, ser do povo e pensada por ele. Além disso, arte e cultura devem nos acompanhar em todos os momentos de nossas vidas, como forma de denúncia, forma de expressão, nas ações de solidariedade e até mesmo como uma forma ajudar enfrentar momentos difíceis como o que estamos vivendo com a pandemia. É de extrema importância valorizar nossos artistas populares, valorizar a arte e a cultura popular e garantir que o Estado pense em medidas emergenciais para que os mesmos e as mesmas possam enfrentar o momento caótico com proteção e direitos sociais.

 

* Thamires Bibiane da Silva Messerchimidt é estudante de Artes Visuais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM),  1ª Diretora de Cultura da União Estadual do Estudantes do Rio Grande do Sul (UEERS) e militante do Levante Popular da Juventude.

Edição: Marcelo Ferreira