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“A orientação do Papa Francisco aponta para uma Igreja pobre para os pobres”

Conversamos com o Padre Vileci Vidal sobre os rumos da Igreja Católica no Brasil à luz do papado pastoral de Francisco

Brasil de Fato | Crato (CE) |
“A missão da Igreja é evangelizar à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, para que todos tenham vida". - Foto: Juanca Guzman Negrini / Fotos Públicas

O Brasil de Fato CE conversou com o Padre Vileci Vidal, coordenador de pastoral da diocese de Crato e pároco em Araripe, sobre a situação do Brasil nesse contexto de pandemia e como a Igreja tem se posicionado. Padre Vileci relembra a postura que o Papa Francisco assume, que retoma no seio da instituição uma postura pastoral, de trabalho em comunidades de base, priorizando sobretudo a população mais pobre. Um retorno a postura missionária que marcou o país nas décadas de 1970 e 1980 do século. Período onde surgiram muitas das pastorais sociais, como a Comissão Pastoral da Terra e Pastoral da Juventude.

“A missão da Igreja é evangelizar à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, para que todos tenham vida. E a ação dos seus agentes é também uma ação política cristã não partidária, numa postura de serviço, diálogo, respeito à dignidade humana, defesa dos excluídos e marginalizados, compaixão, busca da justiça e do bem comum, e cuidado com o meio ambiente”, afirma Pe. Vileci e completa, “Estas atividades expressam a atuação política dos cristãos que visa promover a paz e os direitos humanos fundamentais em sintonia com as mesmas motivações da ONU presentes na Carta da Terra”. Confira abaixo a entrevista na íntegra.

Brasil de Fato: Como o senhor vê a postura pastoral do Papa Francisco se desdobrando no cotidiano da Igreja Católica no Brasil?

Pe. Vileci: Enquanto Igreja Instituição, as Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil (DGAE) tem orientado os bispos a criarem o plano de pastoral em suas dioceses. São diretrizes que servem de bússola para fazer crescer uma verdadeira tradição pastoral e expressar uma significativa colegialidade e missionariedade da Igreja católica neste imenso país. As DGAE 2011-2015 organizaram-se a partir de cinco urgências: estado permanente de missão; iniciação à vida cristã; animação bíblica pastoral; comunidade de comunidades; serviço à vida plena para todos. Enriquecidas pelo início do Magistério do Papa Francisco, as DGAE 2015-2019 mantiveram as mesmas urgências e continuaram inspirando o planejamento da Pastoral de Conjunto das Igrejas particulares (diocesanas). Já as DGAE 2019-2023 estão estruturadas a partir de Comunidade Eclesial Missionária, que são as pequenas comunidades, também conhecidas na América Latina como Comunidade Eclesial de Base (CEBs) e procura desdobrar a orientação pastoral do Papa Francisco que aponta para uma Igreja em saída, “pobre para os pobres”, estimulando a formação de novas comunidades, inseridas no espírito da Laudato Si’ e alicerçadas em quatro pilares: a Palavra de Deus, o pão da eucaristia, a caridade pastoral e a missão de Jesus, num mundo cada vez mais urbano. As diretrizes reafirmam a eclesiologia que nasce do Vaticano II e recorda que a Igreja existe para evangelizar, por isso deve ser uma Igreja em saída que na vivência e na prática da misericórdia, cumprindo sua missão com “prudência e audácia, coragem e ousadia”, como pede o Papa Francisco. Mas um dos desafios pastorais na execução dos planos tem sido mudar as estruturas que lhes dão suporte. E o Papa Francisco tem apontado o caminho da conversão pastoral para a superação da pastoral de conservação na realização de eventos e espetáculos, sustentada, sobretudo, por movimentos carismáticos que dificultam o compromisso comunitário com e a transformação social.

Brasil de Fato: Como a Igreja e seus agentes pastorais podem intervir na política sem ferir a laicidade do Estado prevista na Constituição de 1988?

Pe. Vileci: A missão da Igreja é evangelizar à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, para que todos tenham vida. E a ação dos seus agentes é também uma ação política cristã não partidária, numa postura de serviço, diálogo, respeito à dignidade humana, defesa dos excluídos e marginalizados, compaixão, busca da justiça e do bem comum, e cuidado com o meio ambiente. Estas atividades expressam a atuação política dos cristãos que visa promover a paz e os direitos humanos fundamentais em sintonia com as mesmas motivações da Organização das Nações Unidas (ONU) presentes na Carta da Terra no que diz respeito aos seguintes princípios: respeitar e cuidar da comunidade de vida; integridade ecológica; justiça social e econômica. Democracia, não violência e paz. Pois, a Igreja não pretende impor seus ensinamentos, mas afirmar uma ação ecumênica em respeito à constituição sem ferir a laicidade do Estado. 

Brasil de Fato: Vivemos uma crescente do pensamento e de posturas conservadoras, que por vezes se apresentam na sociedade através de pautas dos direitos humanos como, os direitos reprodutivos das mulheres ou sobre campanhas educativas de combate à homofobia, como era o Projeto ‘Brasil sem Homofobia’ do Governo de Dilma Rousseff, que são combatidas por vários setores da sociedade civil. Como você vê essa questão? 

Pe. Vileci: Numa sociedade plural e urbana, marcada pela mudança de época, onde ainda predomina posturas conservadoras, torna-se urgente trabalhar pela criação e aplicação de mecanismos legais para combater qualquer forma de discriminação, sobretudo no quesito homofobia, e evitar a afirmação exasperada de direitos individuais e subjetivos, bem como a ideologia do multiculturalismo relativista. Temos que promover a sociedade que respeite as diferenças, combatendo esse tipo de preconceito e a discriminação no que diz respeito a questão de gênero nas mais diversas esferas, efetivando a convivência pacífica.
 

Edição: Monyse Ravena