Rio Grande do Sul

ENTREVISTA

Pandemia agrava desmonte da Educação do Campo

Para Conceição Paludo, professora e pesquisadora em Educação do Campo, ensino rural sofre gigantesco retrocesso

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Historicamente, o MST debate e desenvolve alternativas para educação no campo pensando a realidade dos camponeses - Divulgação/MST

A educação no campo sofre um processo de aprofundamento da lógica neoliberal retomada com força no meio rural após o golpe que destituiu a presidenta Dilma Roussef em 2016 e realinhou o país com os interesses dos mercados internacionais, como é o caso do agronegócio. Situação que fica ainda mais grave em tempos de pandemia do novo coronavírus. A avaliação é de Conceição Paludo, docente no curso de Licenciatura em Educação do Campo e pesquisadora na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na Faculdade de Educação (FACED).

Para ela, o papel do Estado deveria ser o de prover, nesse momento, condições de reprodução da vida com o menor sofrimento possível, o que não acontece. Contrária à proposta de retomada das aulas presenciais reafirmada pelo governador Eduardo Leite nesta segunda-feira (24), no seu entendimento “nem um ano escolar está acima ou vale uma vida sequer. Esse ano deveria ser suspenso, não se deveria voltar para a escola, a menos que houvesse uma vacina segura”.

Em entrevista ao Brasil de Fato RS, Conceição faz uma análise do ensino na pandemia “associada ao processo histórico brasileiro que, como capitalismo colonizado e dependente, sempre combinou, com breves momentos de respiro para a classe trabalhadora, altíssima concentração de propriedade e de riqueza e produção ampla de pobreza e miséria histórico”. Ela traz o relato de professoras que enfrentam variados desafios para manter um formato de educação emergencial à distância que não é pensado para a realidade de quem vive no campo.

“O debate em torno do ensino na pandemia, muitas vezes, trata tudo como se fosse à mesma coisa. Não parte da realidade, mesmo quando parte, é unilateral, sem articulação da parte com o todo. Não faz a distinção rigorosa entre as escolas privadas e públicas. No interior das públicas, não distingue as frequentadas pela classe média e remediadas, das frequentadas pelas que se localizam no campo e nas vilas e morros do nosso país. E há o desgaste profundo dos professores que, além do envolvimento próprio com a pandemia, salários parcelados, e etc devem dar conta, nesse contexto, do ensino”, afirma.


Para a professora, transformar a Educação Básica rural em EAD é "desconhecer o papel da escola e o sentido e agregação que oportuniza as comunidades" / Reprodução Facebook

Conforme a pesquisadora, o que possibilita a esperança “é que no rural há uma massa crítica, capaz de realizar análises”. Ela destaca as articulações que vêm ganhando densidade na Educação do Campo por movimentos sociais, o campo da agroecologia e organizações da sociedade civil “se constituindo como um importante eixo organizador dos currículos e potencializador das relações escola-comunidade”.

A seguir, confira a entrevista com Conceição Paludo destacada por tópicos:

Histórico da educação no meio rural

A análise do ensino na pandemia deve ser associada ao processo histórico brasileiro que, como capitalismo colonizado e dependente, sempre combinou, com breves momentos de respiro para a classe trabalhadora, altíssima concentração de propriedade e de riqueza e produção ampla de pobreza e miséria.

Na especificidade do meio rural/campo, de 1889 até meados de 1964, apesar do breve período democrático, a educação que era destinada aos trabalhadores no campo, por meio das políticas públicas, era a chamada educação rural, cujas características centrais eram a de ser deficitária (as primeiras letras), nos moldes da educação urbana, insuficiente e excludente. Esse período correspondia à passagem do modelo agrário exportador de desenvolvimento para o de industrialização, também chamado de substituição de importações e de desenvolvimentismo.

Do golpe civil militar de 1964 até a constituição de 1988, há uma forte luta e resistência pela democratização do país. No campo, organizam-se os Movimentos Sociais do Campo, em decorrência da modernização da agricultura (Revolução Verde), que buscou homogeneizar os padrões de produção agrícola, com forte impacto social e ambiental e expulsou inúmeros agricultores e trabalhadores do campo, além da continuidade da concentração da terra.

Nascimento de uma Educação do Campo

Nesse período, além do debate sobre o projeto popular de país e de experiências práticas de construção de outro desenvolvimento do campo, a educação entra na pauta, principalmente pelo Movimento Sem Terra - acampamentos e assentamentos -, como um bem público e social. O MST inicia, a partir do acumulado histórico do campo do trabalho, que é nacional, latino-americano e internacional, uma rica experiência pedagógica que se amplia e vai constituindo o Movimento por uma Educação do Campo. Esse Movimento se torna nacional e passa a reivindicar políticas públicas. Todo esse processo de organização e luta popular foi impulsionado, de um lado pela necessidade de retomada da democracia e, por outro, pela ideia de direitos, que culminaria na Constituição de 1998, nomeada como ‘cidadã’ e, nela, há a garantia da educação como direito, inclusive para os trabalhadores do campo.

Nas diferentes produções desses Movimentos que compõem a Articulação por Uma Educação do Campo, fica explicita uma concepção de educação que se distancia da educação rural, sendo oposta a ela, e que se firma como Educação do Campo, apontando claramente o caráter de não neutralidade da educação, como diz Paulo Freire, e o seu papel emancipador, libertador, vinculado à construção de outro desenvolvimento do campo e outro projeto de país. Nesse projeto, a reforma agrária é essencial e o conceito de soberania alimentar, por exemplo, toma o lugar de segurança alimentar, proposto pela FAO.

Redirecionamento neoliberal

O terceiro período, meados dos anos 2000 e que se estende até a atualidade, já sofre o impacto da crise mundial da acumulação capitalista dos anos 1970 que, aliada a outros fatores, redireciona o modelo de desenvolvimento, tendo como carro chefe o capital financeiro. Esse, passa a ser orientado não mais pela social democracia e seu horizonte de um Estado de bem-estar social (Keynes) e, sim, pelo neoliberalismo, no qual o capital volta a estar no comando da sociabilidade humana (Hayek), por isso, tudo vira mercadoria.

“Onda progressista sul-americana”

O impacto desse redirecionamento vai chegando à América Latina. Entretanto, de 1988 até 2016, se tem uma “onda progressista sul-americana”. No Brasil ela inicia com os governos populares, num direcionamento de desenvolvimento que se chamou de neodesenvolvimentismo: um pé nas políticas neoliberais e outro nas políticas públicas sociais, tendo como horizonte os direitos sociais, incluindo o direito a sermos, como individualidades, diferentes uns dos outros.

Na educação, o avanço foi considerável: mais universidades, inclusão de setores historicamente excluídos das mesmas, quase universalização da Educação Básica, os IFs, EJA, e outras medidas. Muito do que foi produzido, fruto do processo de resistência e luta, pelo Movimento da Educação do Campo, se transforma em Lei. E houve um avanço, tanto na formulação da concepção quanto nas práticas. Os Movimentos e seus aliados tomam os espaços da cultura e inúmeros cursos são desenvolvidos em parceria, no âmbito da EJA, Ensino Médio, Superior e Pós-Graduação.

Golpe no Brasil

Em 2016, há o impedimento da presidenta Dilma (golpe) e a orientação do desenvolvimento passa a ser, efetivamente, o mercado. A economia volta a comandar o mundo. E eu me pergunto quando deixou de comandar? Marx tinha razão quando dizia que, sob o modo de produção capitalista, vai e vem, a instância máxima de regulação da sociabilidade é o capital e que ele está sempre, de algum modo, acima dos seres humanos e do seu bem-estar.

No meio rural ou no campo, dois movimentos são implementados pelas políticas neoliberais:

a) a intensificação de práticas extrativistas intensivas, que desrespeitam de modo cruel à natureza, pondo em risco a vida no planeta;

b) o agronegócio, uma matriz produtiva tecnológica controlada pelas empresas, que configura uma etapa ainda mais violenta do que foi a chamada “Revolução Verde” e que transforma o campo num lugar de negócio e os pequenos em empregados. Mas, os Movimentos Sociais e os povos do campo resistem e, tanto teórica como praticamente, vão assumindo a agroecologia, como matriz produtiva e como modo de vida, que vai se firmando como uma das alternativas, que se incorpora nas propostas político pedagógicas da Educação do Campo, em múltiplos espaços.

Pandemia agrava situação

Antes da pandemia, portanto, já se vivia a desconstituição do Estado Democrático de Direito no Brasil, que estava querendo nascer e que tinha por horizonte os direitos sociais e humanos, por meio de estratégias que envolviam a política econômica, cuja financeirização da economia, a reforma trabalhista, da previdência e as privatizações são componentes essenciais, além do carreamento do fundo público para o privado; a desconstituição das políticas públicas sociais; a política de segurança, que é extremamente violenta; a política cultural, de natureza fascista e sustentada nos fake, no obscurantismo, no desrespeito a ciência, as diversidades. Enfim, o ensino na pandemia se coloca nesse contexto, cuja política educacional também concretizava um gigantesco retrocesso, no acesso, permanência e qualidade da educação das classes populares, acentuando o caráter de classe da educação e retomando com intensidade uma concepção de educação reducionista e fortemente atrelada às necessidades do mercado capitalista.

Sem vacina o ano letivo deveria ser suspenso

Daí que não há como avaliar o que ocorre no Ensino, notadamente na Educação Básica, dissociado do tratamento dado à pandemia, num contexto crescente da desigualdade social e das condições de reprodução da vida na sua totalidade. Além do obscurantismo, sonegação de informações, a indecisão do isola, não isola, que permeou o enfrentamento a pandemia, agora, há o processo do empurra das responsabilidades, do governo central para governadores e, desses, para os prefeitos. Esse tratamento coloca o mercado acima da vida das pessoas. O mesmo ocorre com a educação escolar, cuja responsabilidade das consequências da permissão das crianças irem para a escola recai nas famílias. Daí que no meu entendimento, nem um ano escolar está acima ou vale uma vida sequer. Esse ano deveria ser suspenso, não se deveria voltar para a escola, a menos que houvesse uma vacina segura.

O debate em torno do ensino na pandemia, muitas vezes, trata tudo como se fosse à mesma coisa. Não parte da realidade, mesmo quando parte, é unilateral, sem articulação da parte com o todo. Não faz a distinção rigorosa entre as escolas privadas e públicas. No interior das públicas, não distingue as frequentadas pela classe média e remediadas, das frequentadas pelas que se localizam no campo e nas vilas e morros do nosso país. E há o desgaste profundo dos professores que, além do envolvimento próprio com a pandemia, salários parcelados, e etc devem dar conta, nesse contexto, do ensino.

Qual o papel do Estado?

O papel do Estado deveria ser o de prover, nesse momento, condições de reprodução da vida com o menor sofrimento possível. Ações intersetoriais, por exemplo, entre saúde, educação e assistência social deveriam ser potencializadas, para os mais de 50 milhões de brasileiros que estão desprovidos nesse momento. A taxação das grandes fortunas poderia ser outra medida. Uma política educacional poderia ser formulada e os professores poderiam ser envolvidos, utilizando-se da televisão, que alcança a grande maioria da população, dirigindo-se aos estudantes de todas as idades e as famílias, orientando sobre a pandemia, e com atividades culturais e lúdicas dirigidas para a juventude e crianças, assim como para as famílias. ‘Aproveitar’ o momento, como diz Florestan Fernandes, para elevar o patamar cultural das comunidades. Mas, para isso, deveríamos ter em curso outro projeto de nação, que não esse, para quem as mortes são tidas como naturais e, talvez, oportunas. A nós, cabe resistir, no sentido do esperançar, de Paulo Freire: capacidade de levantamento das contradições, o que implica em análise crítica da realidade, e de ação consequente.

“Neoruralismo pedagógico”

O que se observa, nos estudos, é que na medida em que os conflitos e negociações se intensificavam entre as forças políticas, no âmbito do Estado, entre o campo popular, que o governava, e as forças neoliberais, os programas de Educação do Campo perderam a força de sua concepção de origem. E, efetivamente, em 2016, ocorre o golpe. Analisando esse período, uma aluna minha, em sua tese de doutorado, Magda, G. Cruz dos Santos, constrói o conceito de neoruralismo pedagógico, explicando esse fenômeno.

Outro aspecto a considerar, são os anos e anos da educação rural nas escolas, romper com isso, não é tarefa fácil. Como se sabe, a educação ocorre nas relações sociais, a escola tende a reforçar visões sociais e valores que são internalizados desde que somos crianças. Mudar isso significa desconstruir e reconstruir, processo lento, mas que ia acontecendo, no que diz respeito à Educação do Campo.

Dificuldades se aprofundando

Ainda antes do impedimento da presidenta (golpe) havia sinais importantes, mas, depois dele, observa-se nos territórios rurais brasileiros um aumento do antagonismo entre os que detêm a posse da terra e a tratam como um negócio e os que nela trabalham e produzem o seu sustento e sua sobrevivência por meio da agricultura familiar e cooperada (no RS, teve até quem defendesse a volta do chicote). Pensar a Educação do Campo pública de qualidade, socialmente referenciada é pensar, portanto, na terra como bem público e coletivo. Nas pesquisas que vem sendo realizadas, por diversos autores, podem-se sintetizar as dificuldades enfrentadas pela Educação do Campo e que vão se aprofundando:

O primeiro conjunto de problemas, que agrega a questão das ‘condições socioeconômicas dos estudantes e de acesso aos bens culturais’, refere-se às transformações que ocorrem no trabalho no campo e expressa à nova forma de ser do capitalismo. A esse respeito observa-se um “novo jeito de trabalho no campo”, que pouco diversifica a produção e diminui o plantio para a subsistência, principalmente dos pequenos produtores, que plantam apenas um cultivo, e que são safristas e diaristas no campo. Além de atividades não agrícolas: diaristas nas cidades, pedreiros, entre outras. A produtividade é o grande fim que tem regido as relações no campo. As políticas nacionais de extensão rural e financiamento, voltadas para o meio rural, estão atreladas a um tipo de desenvolvimento dependente, que é produto do capitalismo internacional articulado, hoje, pelo agronegócio.

O agronegócio representa uma concepção de campo, que aprofunda e atualiza as relações históricas de exploração do trabalho, desigualdades sociais, devastação ambiental e violência, que são o cerne das relações socioeconômicas e culturais e de poder estruturadas, desde sempre, no Brasil. Os estudantes possuem, ‘renda muito baixa’ e ‘não têm acesso a revistas, livros ou jornais a não ser na escola’. Aqui se poderia falar da problemática enfrentada pelos quilombos e indígenas, que também constituem os sujeitos do campo e que lutam para manter seus territórios.

O segundo conjunto de problemas integra as questões de ‘proposição, entendimento, aprofundamento e acompanhamento na execução da proposta pedagógica’, da ‘formação de professores’, das ‘condições da escola e do trabalho docente’ e da ‘gestão cada vez mais administrativa e as novas tarefas da escola’. Essas questões indicam, como centralidade, que a escola cada vez mais trabalha menos a partir dela mesma, como um coletivo que pensa a educação. Ela é obrigada a realizar o seu propósito a partir das demandas das políticas atuais: do Ensino Médio, da Base Nacional Comum Curricular – BNCC, das tentativas de privatizações, etc.

O que se evidencia é que, em acordo com o movimento do passado e das relações políticas que compõem este movimento, neste momento histórico, a escola passa a ser excessivamente regida pela lógica do mercado e da acumulação capitalista, a partir da qual, sistematicamente, vem se planejando, ordenando, priorizando e implementando propostas educativas, metas e resultados, tudo isso se utilizando das políticas públicas. Aqui também pode ser ressaltado às condições de infraestrutura, como acesso a internet, laboratórios, entre outros; bem como, a desvalorização dos professores como profissionais da educação, a dificuldade de acesso à escola rural, pelos estudantes e o fechamento das mesmas. É isso que se vive com profundidade desde 2016 e que, com especificidades, atinge o rural, mas também o urbano.

Agora, na pandemia, o Conselho Nacional de Educação volta a debater sobre quando será um possível retorno as aulas e legitima os dias letivos e as aulas dadas de forma remota. Esse debate ocorre nos estados e também nos municípios. Em nosso estado, pelo relato dos colegas que integram a Articulação em Defesa da Educação do Campo, lives, documentos oficiais, etc, sabe-se que a rede estadual está com aulas remotas, o que vale para os municípios que não possuem sistema próprio. Ainda, sabe-se que o Conselho Estadual de Educação vem questionando a legitimidade dessas atividades no calendário escolar.

Relatos de dificuldades

As denúncias são as de que há um esvaziamento do papel dos Conselhos de Educação, tanto no estado como municípios. Também, há a continuidade do fechamento de escolas do campo, mas, pelas pesquisas atuais que estamos realizando, há uma dificuldade de encontrar dados: tanto do número de escolas do campo na rede estadual e em muitas redes municipais, quanto do número de escolas que foram e estão sendo fechadas no último período.

Vejam depoimentos sobre esse momento de pandemia: “somos uma escola do município x, do RS, temos a maioria dos alunos acessando o Classroom, e o restante recebendo atividades impressas pela escola, com atendimento uma vez por semana, agendado pela direção, devido à bandeira vermelha. O professor se desloca até a escola somente se muito necessário. Também entregamos alimentos recebidos da agricultura familiar e doações que a escola recebe. As formas de acesso são muito inconstantes, em momentos os aparelhos não funcionam e, em outros, a internet”.

Ou esse, de outro município: “a direção está na escola todas as terças-feiras, o envio das atividades acontece de três formas: pelo Classroom, grupos de Whats e impressa. A escola entrega cestas básicas para algumas famílias”. Outra diz que na sua escola “as professoras levam as atividades para as escolas, alguns pais vão buscar e os que não conseguem a Kombi escolar leva”. Outra, ainda, “os pais vão a cavalo buscar as atividades. Infelizmente, o ensino remoto se resume a pegar um saquinho de atividades e entregar depois”.

Desigualdade e falta de política pública

Quer dizer, as escolas rurais no RS não estão tendo aulas presenciais. De alguma forma, cada sistema educacional, e há alguns que delegam para as escolas, tomará a decisão de validação e quanto será validado, desse ensino remoto, para a contagem do ano letivo. Isso remete para o entendimento que a questão não é como se ensina remotamente, há questões profundas implicadas nesse debate, que extrapolam o âmbito da técnica do ensinar remoto. Além das desigualdades de acesso ao remoto, que reportam as desigualdades de reprodução da vida fora do ambiente escolar, a questão é que temos uma política pública que constitui uma não política nesses tempos de pandemia. Visto que uma política pública equaliza condições, orienta com certa normatização e investe os recursos necessários para a concretização, o que não ocorre. Aí, cada sistema de ensino e cada unidade tomam as suas medidas.

Passar adiante é desresponsabilizar-se. Exatamente o que ocorre em relação à pandemia, ocorre em relação à educação em tempos de pandemia. Ora, sabe-se que quem se prejudica, nessa situação são as classes populares. Mas, enquanto política educacional, muito antes da pandemia, o que se colocava para as classes trabalhadoras, era um retorno ao início da República, as primeiras letras. Então, não é de estranhar, o que ocorre deve ser analisado criticamente e não naturalizado, como querem fazer crer.

Massa crítica é a esperança

O que possibilita a esperança, nisso tudo, é que no rural há uma massa crítica, capaz de realizar análises. Na Educação do Campo, as articulações vêm ganhando densidade, intensificando e qualificando debates e processos formativos. O Fórum Nacional da Educação do Campo (FONEC) vem desempenhando um importante papel de articulação nacional. A Educação do Campo retoma, com força, suas proposições de origem, seu papel e função social e a agroecologia vem se constituindo como um importante eixo organizador dos currículos e potencializador das relações escola-comunidade. Enfim, junto com o sofrimento pelo que ocorre no Brasil, e até por causa dele, a Educação do Campo, que sofreu um forte impacto, sinaliza de forma importante e volta a se organizar e a lutar pela educação que interessa aos sujeitos que vivem e produzem suas vidas no campo.

Quanto à pandemia, não se deve voltar esse ano. As atividades deveriam ser leves, lúdicas e culturais, junto aos estudantes e famílias. A educação deveria ser um processo que ajudasse os professores, os estudantes e as famílias a atravessar esse momento, com menos estresse, sofrimento e mais leveza, e não ao contrário. Quanto a essa história de transformar a Educação Básica rural em EAD, tal proposta significa desconhecer o papel da escola e o sentido e agregação que oportuniza as comunidades. É um espaço vital para as comunidades, no campo.

Edição: Marcelo Ferreira