Pesquisa

Propagação silenciosa: crianças assintomáticas podem carregar coronavírus por semanas

Estudo se soma a evidências de que circulação do vírus entre jovens tem dificultado controle da doença no mundo todo

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Crianças usam máscara para se proteger da covid-19 em Vila Vintém, na cidade do Rio de Janeiro - Mauro Pimentel/ AFP

Um estudo liderado por pesquisadores sul coreanos da área de pediatria indica que o coronavírus pode ser encontrado nas mucosas nasais e na garganta de jovens pacientes por até duas semanas.

A pesquisa pode indicar que crianças e adolescentes estão associados à propagação silenciosa da covid-19. Há algumas semanas a Organização Mundial da Saúde (OMS) já vem alertando para a grande quantidade de jovens infectados no mundo todo. No entanto, a organização é cautelosa ao falar sobre os níveis de disseminação causados pela infecção em crianças.

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Os estudiosos da Coreia do Sul, avaliaram 91 jovens com idade média de 11 anos por cerca de três semanas. Eles perceberam que apenas 8,5% desenvolveram sintomas. A pesquisa só foi possível por causa do índice alto de testagem no país asiático, que faz exames em larga escala mesmo em assintomáticos.

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Apenas 3% dos pacientes chegaram a desenvolver a forma grave da doença e não houve nenhuma morte. No entanto, o período de presença do vírus no trato respiratório acendeu o alerta.

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Não foi investigada a infecciosidade desses pacientes, mas o estudo pondera as evidências globais de transmissão assintomática da covid e o fato de que o pico de propagação pode ocorrer dias antes de qualquer tipo de sinal da doença.

Em entrevista ao site Koreal Herald, a especialista em doenças infecciosas pediátricas, Han Mi-seon, coautora do estudo, afirmou que o vírus foi detectado em crianças por "um tempo inesperadamente longo". Ela destacou a importância do isolamento rápido, para diminuir as chances de transmissão a pessoas mais vulneráveis. 

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Não é a primeira vez que a ciência se debruça sobre os impactos do coronavírus em pacientes mais jovens, mesmo assintomáticos. No início do mês, pesquisadores estadunidenses publicaram os resultados de avaliações com mais de 100 crianças, que recebiam tratamento no Hospital Geral de Massachusetts.

A pesquisa, feita em meio a decisões sobre o retorno das aulas presenciais nos Estados Unidos, observou carga viral alta nos examinados e concluiu que "crianças podem ser uma fonte potencial de contágio na pandemia, apesar da doença mais branda ou da falta de sintomas."

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Na semana passada, a OMS alertou que crianças acima de 11 anos parecem estar mais propícias a apresentar sintomas e transmitir a doença. A diretora técnica da organização Maria van Kehkove, afirmou que "todas as crianças podem transmitir, mas isso seria mais frequente entre as mais velhas".

Em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a instituição oficializou uma recomendação de uso de máscaras para quem tem 12 anos ou mais com a mesma rigidez sugerida para adultos.

Brasil não tem dados exatos

Segundo documento elaborado pelo Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz (IFF/Fiocruz), não há dados disponíveis sobre o número de casos da covid na faixa etária pediátrica no Brasil.

O relatório aponta que o principal indicador para dimensionamento dos efeitos da pandemia é o sistema de registro da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Os dados mais recentes, consolidados até o último dia 22, registram mais de 7 mil e 400 hospitalizações de pacientes com SRAG abaixo dos 19 anos.

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Como o país não realiza grande quantidade de testes e não examina pacientes assintomáticos, não há como saber se crianças e jovens estão carregando o vírus sem apresentar nenhum sinal da doença.

Os dados que chegam a público são relativos à pacientes sintomáticos e óbitos. De acordo com o Portal da Transparência do Registro Civil, administrado pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen- Brasil), mais de mil pessoas com menos de 19 anos já morreram no Brasil por causa da covid-19.

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O relatório da Fiocruz indica ainda que a agenda da saúde pública no Brasil já é complexa e tem elementos estruturais de vulnerabilidade social.

Até 2017, 23,4 milhões de pessoas com menos de 14 anos viviam em extrema pobreza. O documento pondera que estudos em todo mundo mostram que as crianças desenvolvem menos a forma grave da covid-19, mas ressalta, "a faixa pediátrica se constitui como uma população suscetível à infecção viral aguda e tardia pelo SARS-Cov-2."

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Ainda de acordo com as conclusões do relatório, ainda são necessários "estudos robustos nos aspectos considerados centrais para a concepção global da pandemia como, por exemplo, a presença de marcadores clínicos e laboratoriais de apresentações graves; a eficácia de intervenções terapêuticas e o papel desempenhado pelas crianças na cadeia de transmissão do vírus."

Edição: Leandro Melito