Rio Grande do Sul

EDUCAÇÃO

Governo do RS propõe retorno das aulas presenciais a partir de 8 de setembro

Educadores, pais e prefeitos são contrários à proposta em meio à alta taxa de contaminação e sem vacina disponível

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Cobrando diálogo com o Executivo, Comissão da Assembleia Legislativa decidiu convocar o secretário da Educação para reunião após inúmeros pedidos de adiamento - Foto: Cesar Manso/AFP

Um novo calendário de retomada das aulas presenciais no Rio Grande do Sul foi apresentado pelo governo estadual, nesta terça-feira (1). A proposta mantém o retorno escalonado, começando pelo Ensino Infantil já no dia 8 de setembro. O anúncio foi feito nesta manhã em reunião entre representantes da educação, da Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs), do Tribunal de Contas e do Ministério Público.

Em seguida, a proposta de calendário prevê o retorno do Ensino Médio geral e Ensino Superior para 21 de setembro; do Ensino Médio estadual para 13 de outubro; do Ensino Fundamental – anos finais para 28 de outubro e do Ensino Fundamental – anos iniciais para 12 de novembro. A decisão final sobre o retorno, porém, cabe aos municípios.

Retorno precipitado

A decisão contraria uma ampla parcela de setores da sociedade gaúcha, que entende não ser o momento para a retomada de aulas presenciais, já que o estado ainda apresenta altas taxas de contaminação e mortes pelo novo coronavírus. Mesmo a Famurs posicionou-se contrária à proposta, seguindo a posição manifestada por 93,75% dos prefeitos em pesquisa realizada pela federação em agosto.

Em nota emitida após a reunião, a entidade afirma que o estudo apresentado pelo Executivo não levou em consideração o estágio da pandemia no estado, na comparação com outros estados brasileiros e países, e não considerou um programa efetivo de testagem. Em sua explanação, o presidente da Famurs e prefeito de Taquari, Maneco Hassen, argumentou que ainda não há uma estrutura mínima para garantir que os protocolos sejam cumpridos.

“O estado, que deveria ser o primeiro a nos dar segurança, só vai retornar daqui a 45 dias. Nós, municípios, teremos que fazer o experimento, o teste e correr o risco de ter alunos contaminados, enquanto o estado espera e, se tudo der certo, voltar em 45 dias. Mais uma vez a responsabilidade fica com os prefeitos e prefeitas”, reprovou. A entidade também reforçou que o calendário de retorno deveria ser invertido, não começando pelas crianças de 0 a 5 anos.

O Sindicato dos Professores e Funcionários de Escola do RS (CPERS Sindicato) vem se manifestando contrário a aulas presenciais no atual momento, ressaltando a ineficiência do governo em garantir EPIs e outras medidas de segurança nas escolas. Nesta manhã, divulgou uma pesquisa consolidada pelo Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos (Dieese) que mostra que ao menos 142 escolas da rede pública estadual já tiveram educadores contaminados pela covid-19, somente no desempenho de atividades em plantão.

Outra pesquisa realizada pelo CPERS Sindicato, em parceria com a Associação Mães & Pais pela Democracia, com cerca de mil professores e professoras das redes da educação municipal, estadual e privada de Porto Alegre, revelou que a comunidade acadêmica é contrária ao retorno das aulas presenciais. Entre os resultados, está que 92% dos docentes são contra a volta presencial de aulas sem que exista vacina contra a covid-19. Destaca ainda a falta de estrutura física para um retorno seguro, bem como os problemas que existem com a atual alternativa de aulas online.

Deputados exigem diálogo com Legislativo

A Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa decidiu, nesta terça-feira, convocar o secretário da Educação, Faisal Karam, caso ele continue, até dia 8 de setembro, omisso ao chamado do órgão técnico do parlamento gaúcho. A decisão foi tomada após três semanas de adiamento da presença do secretário nas reuniões da Comissão.

Presidenta da Comissão, a deputada Sofia Cavedon (PT) considerou a inexistência de debate do titular da pasta da Educação com a Assembleia um desrespeito. Ela também reclamou que a Comissão não foi convidada pelo governo para o debate sobre o tema da volta às aulas. A mesma crítica veio por parte de diversas siglas partidárias, como os deputados Gabriel Souza (MDB), Issur Koch (PP), Sergio Peres, Any Ortiz (Cidadania), Luciana Genro (Psol) e Luiz Marenco (PDT).

Municípios se antecipam por segurança

No município de Pontão (RS), onde localizam-se escolas situadas em assentamentos da Reforma Agrária, as aulas presenciais não vão retornar até o final do ano letivo de 2020. A decisão do prefeito Nelson José Grasselli (PT) entrou em vigor por meio do Decreto 1.540, publicado na segunda-feira (31). A decisão prevendo que as atividades seguem ocorrendo de forma remota.

Entre as justificativas apontadas pelo prefeito estão a realização de consulta à comunidade escolar e o fato de inúmeros professores residirem em municípios com grande número de casos de covid-19, como Passo Fundo, Carazinho e Ronda Alta. A decisão também resgata a recomendação 26/2020 do Conselho Estadual de Direitos Humanos sobre a não retomada das aulas presenciais em escolas situadas em assentamentos da reforma agrária.

O Conselho Estadual de Direitos Humanos também recomendou ao governador a não retomada das aulas na rede pública estadual. A recomendação 28/2020 destaca que, até a presente data, o estado não atende a requisitos mínimos para o controle da pandemia, reconhecidos internacionalmente, como redução acentuada das curvas de mortalidade e contágio, baixa taxa de contágio comunitário, capacidade de realizar testes em massa, rastrear contatos e isolar casos suspeitos com agilidade.

O município de Bagé também cancelou as aulas municipais até o final de 2020. A decisão do prefeito Divaldo Lara (PTB) foi publicada na sexta-feira (28), visando manter os índices positivos de combate ao novo coronavírus. Segundo ele, uma pesquisa realizada com os pais de alunos dos nonos anos demonstrou que 93% são contrários ao retorno das aulas presenciais.

OMS pede cautela com aulas presenciais

Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), o retorno de aulas presenciais onde a pandemia está fora de controle pode agravar a transmissão. Como alertou o diretor de emergências da OMS, Michael Ryan, a retomada só deve ocorrer após a implementação de uma política de rastreamento e isolamento de infectados pela covid-19.

O Brasil antecipa-se, não realiza busca ativa de casos de covid-19 e segue registrando cerca de mil mortes diárias pela doença. No RS a situação é semelhante. Até a tarde desta terça-feira, o estado soma mais de 127,7 mil infectados e 3,5 mil óbitos.

Edição: Katia Marko