Eleições 2020

Marina Helou quer conselhos com poder de decisão em subprefeituras de São Paulo

Objetivo da proposta é dar poder deliberativo aos conselhos participativos das 32 subprefeituras da capital paulista

Ouça o áudio:

"A gente precisa dar um passo além e melhorar a nossa forma de fazer política." - Divulgação/Iury Carvalho
A gente só vai melhorar a política quando a gente entender cada um de nós como agentes políticos

Marina Helou, do partido Rede Sustentabilidade, é a entrevistada desta quinta-feira (8), da série Brasil de Fato Entrevista - Especial Eleições, de entrevistas com os candidatos à Prefeitura de São Paulo. 

Como principal proposta para o município, a candidata defende a descentralização do orçamento da prefeitura dando poder deliberativo aos conselhos participativos das 32 subprefeituras da capital paulista por meio de planos locais. 


 

"O que Sapopemba precisa não é a mesma coisa que Parelheiros precisa, que não é a mesma coisa que a Mooca precisa, que não é a mesma coisa que Guaianazes precisa. Cada uma dessas localidades tem uma necessidade e quem é a melhor pessoa para saber o que acontece lá são as pessoas que vivem nestes locais", defende. 

Atualmente deputada estadual na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), se eleita para a Prefeitura de São Paulo, Helou diz que irá retomar e aprofundar políticas de gestões anteriores, "reconhecendo o que foi bom das gestões passadas, reconhecendo que dá pra a gente melhorar e a partir daí fazer uma diferença".

Entre os projetos de gestões anteriores que ela pretende retomar está o programa De Braços Abertos, de redução de danos do uso de drogas na cracolândia, criado por Fernando Haddad (PT) e descontinuado na gestão de João Doria e seu sucessor Bruno Covas, ambos do PSDB. Por outro lado, Helou pretende manter o modelo das Organizações Sociais (OS) na área da saúde, marca das gestões tucanas na capital.

“A gente precisa pensar nas pessoas, na política pública. As pessoas ao votarem em mim podem ter certeza que o foco não vai ser construir políticas com o meu nome, o foco não vai ser me promover, mas sim construir soluções concretas para a vida delas”, afirma.

A parlamentar, que também é formada em administração pública pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (EAESP-FGV), também afirma que nunca recebeu nenhuma instrução do RenovaBR, de formação de lideranças políticas, de como votar na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).

“O eleitor pode saber que votando em mim ele está endossando um projeto de sociedade, pensando em um novo modelo de desenvolvimento, que seja um modelo de desenvolvimento sustentável, que é o grande pilar da Rede.”

Confira a entrevista na íntegra:

Brasil de Fato: Candidata, as gestões começam e terminam, mas a questão da cracolândia segue sem solução. Aquilo que deveria ser tratado também como como uma questão de saúde pública, é tratado, na maioria das vezes, apenas como uma questão de segurança pública. Caso eleita, na sua gestão, o que terá maior peso: saúde ou segurança pública? E quais são as suas propostas concretas para a região?

Marina Helou: O uso abusivo de drogas não é um problema só na região central, como muitas vezes a gente é levado a entender, mas é uma questão concreta que vêm se espalhando na cidade. É muito importante que a gente tenha soluções perenes e que partam de um profundo acordo entre prefeitura, estado, sociedade civil, igrejas, famílias, organizações do terceiro setor, para que os programas tenham perenidade.

Acredito que é fundamental a gente olhar isso sobre a perspectiva do indivíduo. Como a gente oferece soluções para que o indivíduo possa sair desse ciclo do uso abusivo de drogas e retomar o controle da sua vida? Não é uma questão de segurança pública, mas é uma questão de políticas públicas adequadas para essa situação bastante peculiar. 

Existem, sim, grandes traficantes, interesses econômicos importantes que estão por trás, permitindo e se beneficiando deste ciclo bastante ruim para essas pessoas

As melhores soluções baseadas em dados e evidências. A Suíça, nos anos 1980, passou por uma grave crise de uso abusivo de heroína, em que eles tinham situações muito próximas do que a gente têm hoje.

E aí eles fizeram uma proposta muito consistente para conseguir acabar com esse problema que pode ser implementada no Brasil utilizando o programa De Braços Abertos, que tinha uma política importante de redução de danos, fundamental em um processo de olhar para o indivíduo e de tirar ele desse ciclo vicioso  do uso abusivo das drogas. 

Mas ao mesmo tempo a gente também precisa ter um olhar mais alinhado em relação à segurança pública. Existem, sim, grandes traficantes, interesses econômicos importantes que estão por trás, permitindo e se beneficiando deste ciclo bastante ruim para essas pessoas. Na Suíça também foram bastante duros com os grandes traficantes. Pararam de correr atrás do pequeno traficante e começaram a fazer uma investigação séria

Com esse olhar, com perenidade na continuação dos programas, com um olhar focado no indivíduo, com várias políticas públicas de habitação, vínculo de trabalho, alimentação, saúde, é possível sim resolver esse problema na cidade de São Paulo, é possível avançar muito.

Deputada, a senhora participou do Programa do Renova Brasil. Porém, há problemas em relação à fidelidade partidária e à ideologia dos partidos. Acaba sendo conflitante, muitas vezes. O caso recente da Tabata Amaral, que votou a favor da Reforma da Previdência, contrariando os interesses do partido dela, é um exemplo. Como o eleitor ou a eleitora da senhora saberá que está votando em uma candidata que segue a cartilha da Rede ou do Renova Brasil? 

Acho importante esclarecer que o voto da Tabata em relação à Reforma da Previdência nada têm a ver com o Renova BR. O Renova é um espaço de formação que não orienta nosso voto em momento nenhum, nem dá sugestão de como a gente tem que votar. Eu hoje aqui como deputada estadual afirmo que nunca, em nenhum momento recebi nenhuma mensagem no Whatsapp e nem no meu e-mail sobre como eu deveria me posicionar vindo do Renova BR. 

Acho que o voto da Tabata tem muito mais consistência por conta do Acredito, o movimento que ela fundou, que ela construiu uma agenda e que ela conseguiu, junto com o PDT, uma carta de compromisso de liberdade a partir do Acredito, que é um outro movimento que não tem a ver com o Renova. 

O eleitor pode saber que votando em mim ele está endossando um projeto de sociedade, pensando em um novo modelo de desenvolvimento, que seja um modelo de desenvolvimento sustentável, que é o grande pilar da Rede.

A senhora fundou ou participou também do movimento Acredito, certo?

É, eu estava no início do movimento Acredito, mas antes de crescer eu acabei saindo. Nas eleições de 2018 eu não estava junto com o movimento Acredito, mas nessas eleições a gente retomou uma proximidade e devo estar junto com eles agora nas eleições também.

Deputada, os conselhos participativos municipais, as 32 subprefeituras são espaços consultivos e de representação da sociedade que tem como objetivo levar as pautas da sociedade para o executivo municipal. No entanto, frequentemente a gente vê relatos de que esses conselhos não funcionam. Ou seja, o executivo não concretiza essas pautas que vêm destes espaços. O que a senhora têm de proposta para mudar esse cenário e ampliar a expressividade e a concretude dessas pautas?

Um dos pilares importantes que a nossa Constituição de 1988 trouxe foi a participação da sociedade na formulação de políticas públicas, e os conselhos foram a melhor forma que a gente encontrou de fazer isso.

Mas a gente errou em não tornar os conselhos deliberativos, em não dar nenhum poder deliberativo de verdade para os conselhos. Exigiam bastante trabalho das pessoas que estão lá, mas não são levados em consideração na tomada de decisão. E, ao longo do tempo, foram sendo esvaziados. 

Acredito profundamente que a gente só vai melhorar a política quando a gente entender cada um de nós como agentes políticos, e os conselhos de participação são fundamentais dentro de uma lógica em que quem sabe realmente os problemas de cada região, de cada local, são as pessoas que vivem lá, são as pessoas que são especialistas e são envolvidas no tema. 

A gente tem um projeto de construir planos locais em cada um dos distritos de São Paulo, porque o que Sapopemba precisa não é a mesma coisa que Parelheiros precisa, que não é a mesma coisa que a Mooca precisa, que não é a mesma coisa que Guaianazes precisa. Cada uma dessas localidades tem uma necessidade e quem é a melhor pessoa para saber o que acontece lá são as pessoas que vivem nestes locais. 

O que a gente quer fazer é construir os planos locais: cada um dos distritos, levando em consideração as orientações de todos estes temas, mas priorizando o que aquela região precisa. E a partir daí a gente vai poder utilizar o orçamento, de forma descentralizada e com um foco muito claro no combate às desigualdades.

Mas como a senhora pretende barrar ou diminuir e minimizar os impactos do lobby das empresas nesse conselho participativo?

A gente participar de uma forma bastante honesta já na campanha permite que a gente possa fazer uma gestão bastante republicana e transparente. Sou profunda entusiasta da transparência. No meu mandato a gente ganhou um prêmio de ser o mandato mais transparente da Alesp.

A Rede Nossa São Paulo publicou em novembro de 2019 uma pesquisa que mostra que 56% dos paulistanos avaliam a saúde pública como ruim ou péssima. Só que boa parte deste serviço não é feito pela prefeitura, mas por empresas terceirizadas, as chamadas Organizações Sociais (OS). Seis em cada 10 unidades de saúde são geridas por essas organizações na capital paulista. O que a senhora pensa desse modelo de gestão da saúde pública e, se eleita, pretende manter esses convênios?

O poder público tem dois grandes desafios na oferta de políticas públicas: qualidade e capilaridade. A gente precisa oferecer serviços que atendam às necessidades das pessoas com qualidade, mas precisa oferecer para todo mundo. As OS foram uma solução de administração pública encontrada em um momento em que a gente não conseguia fazer com que o Estado ampliasse a sua capilaridade.

Não tinha dinheiro para investimento e a gente precisava fazer uma expansão muito rápida. E as OS fizeram um papel importante de ampliação e capilaridade, realmente levando o serviço público e a política pública para quem precisa na ponta. 

Mas foi feito de uma forma que tem muito a melhorar. É bem pouco transparente, é bastante confuso, que inclusive impacta na qualidade do serviço público que chega nas pessoas. Então, o meu ponto é menos o modelo e mais a forma.

Acredito em um Estado que seja o principal ponto de serviço ao cidadão e quanto mais administração direta, mais controle a gente consegue ter e é melhor. Se essa é uma solução que permite, dentro do orçamento possível ampliar a oferta de saúde para as pessoas, faz sentido para mim. Mas tem que ser feito de um jeito muito melhor, com mais transparência, com acordos mais claros, com regras melhores, com critérios de qualidade. 

Mas aí, deputada, nós temos um problema constante em São Paulo que são as terceirizações. Porque nessas empresas os trabalhadores acabam atuando de forma terceirizada nas unidades de saúde. A senhora é a favor da terceirização, então?

Não necessariamente. A gente até está acompanhando aqui na Alesp a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da quarteirização das OS, porque eu acho que essa é uma falha do modelo, por exemplo. É um modelo que não prevê nas organizações sociais como fica esse vínculo de trabalho que impacta diretamente na qualidade do serviço público e na relação com este servidor. Eu acho que nisso a gente precisa avançar, com certeza. 

Deputada, dados da Prefeitura de São Paulo de janeiro deste ano mostram que temos um déficit de 10 mil vagas nas creches de São Paulo. Pais e mães que moram nas periferias têm um problema de deslocamento até o local de trabalho e a fila das regiões centrais pode demorar até 3 anos. Então são duas missões aí: diminuir ou zerar a fila das creches e descentralizar. É possível se comprometer com isso?

Hoje em São Paulo se a gente olha as vagas disponíveis a gente têm zero déficit. Só que o problema é que as vagas não estão onde as pessoas precisam. A gente pode fazer isso com mais inteligência: olhar realmente onde está a necessidade da vaga na creche e conseguir melhorar este fluxo. 

Já que você trouxe esse ponto, que pra mim é fundamental, que trabalha com a primeira infância e com a maternidade, é [preciso] falar de qualidade na creche. Vaga na creche é a primeira necessidade que a família tem. A idade da creche, dos zero aos 3 anos como a primeiríssima infância, é a época mais importante no desenvolvimento do ser humano. É quando a gente desenvolve o nosso sistema cognitivo, o nosso sistema emocional e a ter os estímulos corretos.
 
Ter uma adesão maior dessas creches a um plano básico, à nossa política municipal da primeira infância, ao maior acompanhamento, à nutrição de qualidade e a um estímulo adequado vai ser fundamental. 

Deputada, a senhora teceu elogios às gestões anteriores. Onde o eleitor vai encontrar uma diferença de uma gestão da senhora e do Bruno Covas? 

Quem fez a redução nas creches não foi o Bruno Covas. Quem fez o programa De Braços Abertos não foi o Bruno Covas. O que eu acho é que a gente precisa dar um passo além e melhorar a nossa forma de fazer política, que é reconhecer os bons programas, melhorar eles e buscar novas soluções.

Não é nova política, não é pensar diferente, não é inovar, querer construir tudo do zero a todas as eleições. Não é avançar em novas ideias, colocar propostas do zero a cada uma das soluções. 

A gente precisa pensar nas pessoas, na política pública, reconhecendo o que foi bom das gestões passadas, reconhecendo que dá pra a gente melhorar e a partir daí fazer uma diferença. As pessoas ao votarem em mim podem ter certeza que o foco não vai ser construir políticas com o meu nome, o foco não vai ser me promover, mas sim construir soluções concretas para a vida delas. 

No município de São Paulo, os paulistanos têm 16 opções de candidatos para escolher nos dias 15 e 29 de novembro, quando serão realizados o primeiro e segundo turno, respectivamente, das eleições municipais em todo o país. São eles Andrea Matarazzo (PSD), Arthur Do Val (Patriota), Antônio Carlos Silva (PCO), Bruno Covas (PSDB), Celso Russomanno (Republicanos), Felipe Sabará (NOVO), Guilherme Boulos (PSOL), Jilmar Tatto (PT), Joice Hasselmann (PSL), Levi Fidelix (PRTB), Márcio França (PSB), Marcos da Costa (PTB), Marina Helou (Rede Sustentabilidade), Orlando Silva (PCdoB), Vera Lúcia (PSTU) e Vivian Mendes (UP).

O Brasil de Fato entrou em contato com as assessorias de todos candidatos e todas candidatas.

Edição: Leandro Melito