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EUA: demora em apuração das eleições pode gerar "violência política", diz ativista

Nesta terça (3) os Estados Unidos chegaram à data oficial da eleição com quase cem mil votos antecipados

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Quase cem milhões de pessoas votaram antecipadamente nos Estados Unidos - Foto: Bryan R. Smith/AFP

Representantes de organizações populares que integram a Aliança Bolivariana Para os Povos de Nossa América (Alba Movimentos) participam de transmissão ao vivo nesta terça-feira (3), às 15h, para discutir as eleições presidenciais nos Estados Unidos.

O encontro, realizado em parceria com o Brasil de Fato, abordou a luta popular nas Américas a partir do contexto norte-americano extremamente polarizado, assim como as consequências da reeleição de Donald Trump ou da chegada de Joe Biden à Casa Branca.

A disputa chega ao fim neste 3 de novembro, data oficial do pleito, em meio à ameaças ao processo eleitoral por parte do republicano, que desde o início da campanha combateu a modalidade de voto pelos correios e ameaça contestar o resultado das urnas na Justiça.

De acordo com Stephanie Brito, militante do Popular Education Project, dos Estados Unidos, que participa do debate, há uma grande preocupação em torno do resultado do pleito.

"Trump tem usado a ameaça de uma possível vitória democrata para mobilizar milícias armadas de extrema direita. Caso não tenha um ganhador que possa ser declarado logo após a eleição, haverá um clima de violência política sem precedentes", alerta a ativista.

Brito destacou ainda que a compra de armas no país aumentou de forma substancial e que, apenas este ano, 17 milhões de armas foram compradas pelos americanos. 

"Isso tem a ver com a expectativa que vai estourar uma crise política, uma crise constituciocional e possívelmente uma guerra civil no país. Embora seja difícil analisar esse cenário, o que é claro é que podemos esperar um clima de muita violência política nas próximas semanas. A expectativa é que demore duas semanas para o resultado das eleições", acrescenta.

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Para ela, o fato de Trump questionar o resultado das urnas faz com que os Estados Unidos "perca a moral que busca exercer diante do mundo como a democracia mais antiga e saudável, com o direito de julgar as democracias do resto do mundo". 

Segundo o Elections Project, da Universidade da Califórnia, quase 100 milhões de eleitores votaram antecipadamente neste pleito, um marco histórico em um país onde o voto não é obrigatório.

O comparecimento antes do dia das eleições representa 72,3% dos votos das eleições presenciais de 2016. A expectativa é que a participação total seja recorde e alcance os 150 milhões de votos.

América Latina

Carlos Ron, presidente do Instituto Simón Bolívar para a Paz e Solidariedade entre os Povos, da Venezuela, também participa da live. Ele afirma que, no que tange o olhar para América Latina e principalmente para a Venezuela, tanto Trump quanto Biden já tomaram posições negativas. Ambos reconheceram, por exemplo, o governo interino de Juán Guaidó e o receberam em Washington. 

Segundo ele, a política estadunidense para as relações com os países latino-americanos tem sido ditadas por um grupo de extrema direita do sul da Florida, que vivem como se ainda estivesse na Guerra Fria, de forma muito ofensiva.

"Isso poderia mudar com o Biden se ele retornar às políticas que tinha implementado no governo Obama com maior proximidade, pelo menos o que tem a ver com Cuba. Mas não podemos confundir uma coisa: o objetivo deles é voltar a ter controle, influência absoluta sobre a região. As formas mudam um pouco porque talvez Biden não teria essa agressividade, esse desespero de Trump, mas, o objetivo ainda continua ser tirar os governos populares do meio", explica Ron.

O presidente do Instituto Simón Bolívar avalia que seja com o republicano ou com o democrata, a oposição a China continuará sendo uma das principais bandeiras da Casa Branca, visando também, amenizar a influência do país asiático na América Latina.

Para ele, apesar de Biden ter um "melhor conhecimento" da América Latina em comparação a Trump, caso seja eleito, haverá um conflito uma tensão com governos que são próximos ao republicano, como o brasileiro e o colombiano.

"Eles têm uma afinidade muito maior com Trump, principalmente Bolsonaro, haverá um distanciamento. Inclusive porque Bolsonaro defende posições muito parecidas com o Trump sobre mudanças climáticas e outros pensamentos na lógica supremacista e racista". 

Independente das diferenças na forma de atuação e de construir as relações, Ron reforça que a política imperialisma será a mesma.

"Não podemos deixar de lembrar que os Estados Unidos não agem para o interesse da América Latina e sim para o interesse dos Estados Unidos, sempre. Nunca vão apoiar um governo independente com uma abertura mais independente. A história de América Latina está cheia de ditaduras de direita, violentas, que eles apoiaram. Não importavam aos republicanos ou aos democratas."

Questões estruturais

Stephanie Brito relembra que o pleito eleitoral ocorre em meio a uma profunda crise socioeconomica, altos índices de desemprego e intensa polarização, além da contínua articulação do movimento negro contra a violência policial.
 
Ainda que Biden de fato vença Trump, conforme sinalizam as pesquisas, há limitações inerentes à atuação democrata.

“O que esses protestos ressaltaram foi um descontentamento que é de muito tempo atrás com a violência contra a comunidade negras, com a desigualdade do racismo estrutural, que tem sido alimentada, de certa forma, com o discurso de Trump. Acho que um governo de Biden pode ter um maior reconhecimento sobre a necessidade de enfrentar o racismo, mas isso não significa que haveria uma mudança estrutural”, diz ela.

Segundo a integrante do Popular Education Project, as eleições deste ano mostraram o desgaste das estruturas democráticas dos Estados Unidos, que ocorre há anos. Ela elenca a supressão de votos populares como o principal exemplo desse processo.

Estados republicanos, majoritariamente, aprovaram leis com o objetivo de afastar eleitores pobres, negros, hispanos e mulheres das urnas, que geralmente apoiam os democratas.

Edição: Leandro Melito