25 DE NOVEMBRO

"Impunidade incentiva a manutenção da violência contra a mulher", diz pesquisadora

Para Betânia Ávila, o cenário de impunidade e silenciamento incentiva a manutenção da violência contra a mulher

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Para Betânia, o Governo Federal tem, por um lado, desarticulado os mecanismos de proteção, e por outro, tem um discurso público que favorece a violência - Reprodução/FECESC

Esta quarta-feira, 25 de novembro, é marcada pelo Dia Internacional de Combate à Violência Contra as Mulheres. O Brasil de Fato Pernambuco entrevistou a pesquisadora do SOS Corpo - Instituto Feminista para a Democracia, Betânia Ávila, que em outubro deste ano representou o Brasil no segundo Tribunal Ético de Justiça e Direitos das Mulheres Pan-Amazônicas e Andinas.

O tribunal é um espaço internacional em que casos emblemáticos de ataques contra mulheres de vários países da Pan-Amazônia são apresentados pela defesa que fazem de seus territórios e povos. Esta edição aconteceu de maneira virtual e foi promovido por diversas organizações de mulheres da América Latina. Confira a entrevista:

Brasil de Fato Pernambuco: O que foi a experiência do Tribunal de Mulheres Pan-amazônicas e Andinas?

Betânia Ávila: A experiência é muito profunda, onde as próprias mulheres das regiões amazônicas dos países (neste ano Brasil, Colômbia e Peru) trazem suas análises e suas denúncias para apresentar frente a um corpo de juradas, juízas, onde se analisa e se promulga esta sentença.

É um tribunal no qual toda a questão panamazônica, da violência, do extrativismo, do desapossamento, todas essas barbaridades que tem acontecido contra a Amazônia e os povos que nela habitam, têm um assento, uma focalização.

No caso do Brasil trabalhamos a ação desse governo sobre a floresta amazônica e especificamente no que diz respeito às mulheres, também com um crescimento profundo de violência; da questão das queimadas e como afeta aos povos em geral e as mulheres em particular.

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Qual o veredito do Tribunal diante dos casos apresentados? 

De maneira muito sintética é uma condenação absoluta ao governo desses países, que são, em primeiro lugar, diretamente responsáveis pelo que está acontecendo. Seja por uma ação direta, por omissão, seja por permitirem tanto a entrada de grandes empresas. Há em primeiro lugar uma condenação a esses governos, no casos desses três países.

E também aos outros setores: empresas, agronegócio, grileiros, madeireiros, todos os setores, sejam eles do ponto de vista do sistema “legais” ou “ilegais”, porque todos eles estão articulados na reprodução do sistema em um processo de desapossamento, invasão, confisco e violência. Existem condenações, mas também a demanda por respeito à acordos e leis já feitos e promulgados, à políticas públicas e também novas leis de proteção e garantia de direitos.

Qual sua avaliação quanto à importância política para os movimentos feministas da construção do Tribunal?

Fortalece o movimento feminista no sentido de que ele se torna parte dessa luta concreta das mulheres panamazônicas. São mulheres formadas de uma pluralidade de estruturas e relações sociais e de vida muito grande, há mulheres indígenas, quilombolas, ribeirinhas e camponesas da Amazônia, então é uma luta importantíssima na perspectiva antissistêmica do feminismo.

::Mulheres da Assembleia Internacional dos Povos ratificam sua luta contra a violência ::

Uma coisa muito importante que tem se fortalecido nessas duas ultimas décadas é essa perspectiva antissistêmica, antipatriarcal, antirracista e anticapitalista. E uma luta em defesa dos povos e da floresta amazônica é uma luta que está no coração dessa perspectiva do feminismo. Só fortalece o feminismo na sua capacidade de organização, de análise do mundo e de luta.

Neste dia 25 de novembro, temos o Dia Internacional de Combate à Violência Contra as Mulheres. No início da pandemia, os números demonstraram aumento desses casos. Como se deu isso neste período que estamos vivendo? 

Estamos vivendo um momento de uma certa liberação por parte do discurso hegemônico a esses tipos de violência

A gente está em um momento de confinamento, de muita tensão, e as mulheres trabalhadoras têm que enfrentar ainda de uma maneira muito menos protegida essa violência sexual e doméstica. A gente sabe que nesses últimos tempos o Governo Federal tem, por um lado desarticulado os mecanismos de proteção, por outro lado tem todo um discurso público hoje que favorece a violência racista, sexista, contra trabalhadoras, camponesas, indígenas. Estamos vivendo um momento de uma certa liberação por parte do discurso hegemônico a esses tipos de violência que vão formando um caldo de cultura onde aqueles que perpetuam essa violência contra as mulheres, se sentem muito mais autorizados e impunes para fazer isso. 

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Quais são os caminhos possíveis para o enfrentamento e eliminação da violência contra as mulheres?

Os caminhos são os que os movimentos feministas já traçaram, que se reestruturam a cada etapa histórica. Nós que somos partes desses movimentos temos que acumular força com a nossa organização. Fortalecer a organização e aumentar a capacidade de análise crítica da realidade social, uma coisa absurdamente fundamental no Brasil. Sermos cada vez mais plurais enquanto sujeitos coletivos do movimento feminista, fazer muita analise crítica e muita formação política.  

 

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vanessa Gonzaga