Entrevista

Lula explica por que negou vacina para ex-presidentes: "Vou tomar no posto de saúde"

Em entrevista ao portal “UOL”, o ex-presidente lamenta falta de condições até agora para impeachment de Bolsonaro

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Lula lembra que os principais meios de comunicação ajudaram a construir a narrativa que questionava sua honestidade e enaltecia o juiz federal. 'Moro é um ídolo de barro que a Globo criou' - REPRODUÇÃO/UOL

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a criticar os diálogos entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da Operação Lava Jato, revelados também pela Operação Spoofing da Polícia Federal.

Em entrevista ao jornalista Kennedy Alencar do UOL, nesta quinta-feira (18), Lula afirmou que o conluio entre a acusação e o juiz para incriminá-lo injustamente na Lava Jato, com ajuda da mídia tradicional, fez mentiras serem transformadas em verdades.

Desde o final de janeiro, diversas mensagens trocadas entre Moro e procuradores da Lava Jato foram divulgadas, depois de o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski retirar o sigilo de parte dos arquivos. As conversas vêm sendo consideradas por especialistas um “escândalo judicial”.

Após a publicidade do material, cresceram as chances de o processo envolvendo Lula ser anulado, por suspeição do ex-juiz Moro.

“Não sei qual será a decisão do STF, mas sou refém da maior mentira contada neste país, inventada pelo Sergio Moro e a quadrilha de procuradores de Curitiba, para evitar que eu me candidatasse à Presidência da República”, disse Lula a Kennedy Alencar.

Ele também lembra que os principais meios de comunicação ajudaram a fomentar a narrativa construída pela Lava Jato, a qual questionava sua honestidade e enaltecia Sergio Moro.

“Moro é um ídolo de barro que a Globo criou. Como ela (Globo), Estadão, Folha, Veja e tantos outros jornais vão rever a sua posição, após ficarem quatro anos endossando mentiras?”, perguntou.

“Eles abusaram da boa fé do povo brasileiro e tentaram transformar as mentiras em verdade. Eu sei o que o povo acreditou, por isso estou brigando para mostrar que os verdadeiros ladrões eram aqueles que me acusavam de ladrão”, reforçou Lula.

Bolsonaro é genocida

Durante a entrevista, Lula criticou a falta de ações do governo de Jair Bolsonaro no combate à pandemia de covid-19. Enquanto a curva de contágio e mortes pelo vírus segue em alta, com 242 mil óbitos, cidades como Rio de Janeiro, Cuiabá e Salvador suspenderam a vacinação da população.

Ontem (17), o Ministério da Saúde anunciou a chegada de 230 milhões de doses, sem especificar como serão adquiridas. “Bolsonaro continua negando a pandemia e o ministro da Saúde (Eduardo Pazuello) não tem um protocolo para vacinação. Eles passaram o tempo todo vendendo um remédio que não ajuda em nada”, lamentou.

Para o ex-presidente, é correto afirmar que Bolsonaro promove um genocídio, pois promove a morte. “Ele não se importa com a morte de 250 mil pessoas. É um presidente que não tem respeito com a população mais pobre, mais vulnerável. É um genocida, porque ele não se importa com a vida. Ao invés de cuidar da saúde do povo, ao invés de garantir empregos e a economia da população, ele está preocupado com a utilização de mais armas, como se tudo se resolvesse na bala.”

Em janeiro, Lula foi diagnosticado com covid-19 enquanto estava em viagem a Cuba, para participar das gravações de um documentário sobre a América Latina, dirigido pelo cineasta norte-americano Oliver Stone. Ele diz que está bem e quer tomar a vacina.

Ao ser perguntado sobre não ter participado da vacinação promovida por Doria com ex-presidentes do Brasil, Lula classificou a ação como uma “encenação política”. “Na hora que chegar meu momento, quando tiver vacina para as pessoas com 75 anos, vou procurar um posto de saúde e tomar minha vacina, como qualquer pessoa.”

Lula e as eleições de 2022

Um dos principais assuntos em pauta no final de 2020 e início deste ano foi a possibilidade de Rodrigo Maia (DEM-RJ), agora ex-presidente da Câmara dos Deputados, abrir o processo de impeachment de Jair Bolsonaro. Agora, com a eleição de Arthur Lira (PP-AL), Lula não acredita no afastamento do presidente da República.

“Eu não quero o impeachment de Bolsonaro porque sou seu opositor, mas porque ele tomou várias medidas estúpidas que merecem o impeachment. Ele é um insano que não respeita a medicina”, disse. “Se não abrimos o processo com o Maia, não vamos conseguir com o Lira. Eu não acredito mais que haja tempo”, lamentou.

Lula não garantiu que não será candidato à Presidência em 2022, caso recupere seus direitos políticos, mas apontou o nome de Fernando Haddad (PT) como “extraordinário”. Enalteceu os 47 milhões de votos de Haddad nas eleições de 2018 e disse que irá apoiá-lo. “Não tem um nome melhor que o dele.”

Perguntado sobre a frente ampla progressista, Luiz Inácio Lula da Silva defende que cada partido lance seu candidato no primeiro turno e crie uma aliança no segundo.

“Como a gente vai escolher o candidato de uma frente ampla? A melhor maneira de medir forças é no primeiro turno, assumindo um compromisso de união no segundo turno. Só não pode inventar de ir a Paris depois. Tem que fazer como o (Leonel) Brizola fez comigo, em 1989, quando me apoiou.”

O ex-presidente não acredita no argumento, de parte do setor progressista, sobre a ‘candidatura do PT eleger Bolsonaro’. Para Lula, essa leitura política é “uma ingenuidade”. “O Bolsonaro tem a aprovação de 25% a 30%, ou seja, tem 70% que podem não votar nele. Se a gente vai ao segundo turno, vamos procurar outras forças políticas e criar uma grande aliança“, afirmou.

Forças Armadas

No último dia 10, o general Eduardo Villas Bôas revelou que as postagens polêmicas que fez em seu perfil no Twitter, às vésperas de um julgamento de habeas corpus do ex-presidente Lula pelo STF, em 2018, foram articuladas e escritas com participação do Alto Comando do Exército.

Lula também comentou esse caso e se disse “triste”. Entretanto, reiterou que o Exército não tem direito de opinar sobre ações do Judiciário. “Eu tinha um profundo respeito pelas Forças Armadas. Pode perguntar para qualquer comandante se algum presidente tratou eles melhor do que eu. Porém, não é de direito constitucional o Alto Comando do Exército se reunir para dar um pito na Suprema Corte”, alertou.

“As Forças Armadas existem para cuidar da soberania nacional e não para decidir se alguém será candidato a presidente. Se um general quer disputar eleição, saia do quartel e dispute a eleição. O governo Bolsonaro tem centenas de militares no governo federal e eles não foram feitos para isso”, finalizou.