Pernambuco

CPI da Covid

“Completamente delirante”, diz Humberto sobre assessoramento de Bolsonaro na pandemia

Senador petista na CPI da Covid também tratou da MP da privatização da Eletrobras e da eleição de 2022 em Pernambuco

Brasil de Fato | Recife (PE) |
O senador Humberto Costa é o representante do PT na CPI da Covid; ele foi ministro da Saúde durante o governo Lula - Leopoldo Silva/Agência Senado

Ao longo do mês de maio a principal pauta da política nacional tem sido a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instalada no Senado para investigar a atuação do Governo Federal no combate à pandemia da covid-19, doença causada pelo vírus Sars-CoV-2 e suas variantes. Onze senadores integram a CPI, mas todos os demais podem em maior ou menor medida participar das sessões da comissão.

A CPI já colheu depoimentos de Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, ambos ex-ministros da Saúde do governo Bolsonaro; Marcelo Queiroga, atual titular da Saúde; Antônio Barras Torres, diretor da Anvisa; Fábio Wajgarten, ex-secretário de comunicação da Presidência da República; Carlos Murillo, executivo da farmacêutica Pfizer no Brasil; Ernesto Araújo, ex-ministro de Relações Exteriores; e Eduardo Pazuello, também ex-ministro da Saúde, sendo este o que esteve por mais tempo no cargo durante a pandemia.

Dois senadores pernambucanos são presença frequente na “CPI da Covid”: Humberto Costa (PT), titular da comissão e ex-ministro da Saúde (2003-2005); e Fernando Bezerra Coelho (MDB), que não é titular, mas tem presença frequente por ser líder do governo no Senado. Nesta segunda-feira (24) o Brasil de Fato Pernambuco entrevistou Humberto, representante do Partido dos Trabalhadores na comissão. Na conversa ele tratou de temas relativos à CPI, da MP que autoriza a privatização do sistema elétrico brasileiro e sobre as articulações em Pernambuco visando as eleições de 2022, quando ele pode ser candidato ao Governo do Estado.

Brasil de Fato Pernambuco: Os depoimentos colhidos até agora reafirmam aquilo que já estava evidente nas falas públicas do presidente Bolsonaro: institucionalmente o Governo Federal adotou ou deixou de adotar medidas sempre tendo em vista o rápido espalhamento do vírus e subsequente “imunidade de rebanho”, mas ao custo de muitas vidas perdidas. Que consequências isso pode trazer na prática para o presidente da República?

Humberto Costa: Todos os depoimento dados até agora confirmam que o governo decidiu adotar uma estratégia de enfrentamento à pandemia da covid-19 que se baseava numa tese profundamente equivocada, que se houvesse a disseminação da doença em mais de 70% da população, nós teríamos a possibilidade de produzir a “imunidade de rebanho”, a imunidade coletiva, e com isso o vírus deixaria de circular. O custo dessa teoria é muito alto.

Nós estamos vendo que a covid-19 não é uma doença qualquer, não é uma “gripezinha” como o presidente tentou vender. E como consequência temos mais de 450 mil brasileiros mortos pela covid-19 até o momento. Soma-se a isso todas as omissões e ações criminosas do presidente frente a essa pandemia, o presidente pode ser enquadrado em crimes de responsabilidade, crime contra a vida humana e crime de genocídio – especialmente no que diz respeito às comunidades indígenas do país.

BdF-PE: Em alguns depoimentos, como o do ex-secretário de comunicação Fábio Wajgarten e o do ex-ministro da saúde Eduardo Pazuello, percebemos que a tática da Presidência da República é jogar a culpa sobre Pazuello e blindar Bolsonaro, ainda que precisem contar muitas mentiras para isso. Para você, o que Pazuello espera ganhar assumindo a culpa sozinho? E que medidas podem ser adotadas para coibir as mentiras por parte de outros depoentes?

HC: Pazuello está se confiando no poder e na interferência de Bolsonaro nos órgãos públicos. Bolsonaro tem tentado influenciar na Polícia Federal, no Supremo Tribunal Federal (STF), no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), nos diversos Tribunais Regionais Federais (TRFs) e até no Ministério Público (MPF). Ele deve ter prometido a Pazuello que vai conseguir livrá-lo de todos os inquéritos, todos os processos que está respondendo e que devem lhe dar dor de cabeça para o resto da vida. Esse deve ter sido o compromisso de Bolsonaro.

Sobre as mentiras durante os depoimentos, seja de Pazuello ou de outros, nós já encaminhamos ao Ministério Público o depoimento de Wajgarten, que também mentiu descaradamente. Pedimos ao Ministério Público que apurasse a ocorrência de perjúrio, de falso testemunho por parte dele no dia em que foi interrogado no Congresso Nacional. Isso também vai valer para Pazuello numa eventual segunda oitiva dele na CPI. No fim essas pessoas certamente serão indiciadas pelo crime de falso testemunho, além de tantos outros crimes. Pazuello era ministro de direito – apesar de o ministro de fato ter sido Bolsonaro – e como ministro de direito, todos os crimes cometidos têm ele como principal responsável.

BdF-PE: Na semana que se inicia a CPI terá o depoimento de Mayra Pinheiro, a “Capitã Cloroquina”, secretária do Ministério da Saúde. Também teremos a votação das próximas convocações. Estão em pauta nomes como o do empresário Carlos Wizard, do vereador do Rio, Carlos Bolsonaro; e de Arthur Weintraub; além de uma possível volta de Pazuello. Que nomes devem ser prioridade nessa convocação?

HC: Além desses nomes, o do Élcio Franco, secretário-executivo de Pazuello; essa senhora que passou só uma semana como secretária do comitê de enfrentamento a covid-19; a médica Ludmilla que chegou a ser cogitada como ministra da Saúde, mas não aceitou e queremos saber por quê. Todas essas pessoas que, ao que tudo indica, fazem parte desse assessoramento paralelo que o presidente da República tem para o enfrentamento à pandemia. Um grupo de pessoas completamente delirantes em relação ao que fazer nesse enfrentamento.

Também é importante ouvir o presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), que foi o grande fiador para a prescrição de medicamento sem efeito contra a covid-19. E acho que devemos começar a ouvir integrantes da comunidade científica, para que eles passem sua visão sobre a condução que o presidente Bolsonaro deu até agora no enfrentamento pandemia. Eles são a voz da ciência e com certeza darão testemunho do que enfrentamos de maneira inadequada.


O petista acusa o PSB de deslealdade na disputa pelo Recife, mas garante sintonia com o projeto nacional do PT / Ricardo Stuckert

BdF-PE: Saindo da pauta CPI: na última semana a Câmara Federal aprovou a MP que permite a venda do sistema Eletrobras, que agora segue para o Senado. Você acredita que a tramitação tende a ser breve? O que as lideranças têm debatido sobre essa MP?

HC:  Sem dúvida vamos opor uma resistência total contra essa tentativa de privatização da Eletrobras, especialmente porque essa proposta final traz coisas absurdas. Eles dizem que a privatização vai diminuir a conta de energia, mas exigem que antes de sair das mãos do governo a Eletrobras já garanta a aquisição de gás para as usinas termoelétricas, o que tem custo elevadíssimo e tende a incidir no valor da conta de energia elétrica.

Então vamos fazer toda a força para impedir essa privatização. Ela não produz qualquer benefício para a população brasileira e vai ser vendida a preço de banana para algum grupo internacional que vai apenas buscar lucros e vai jogar para a população uma conta extremamente amarga. Hoje quando vemos o que pesa para a população mais pobre, o que pesa é o pagamento de aluguel, a aquisição de alimentos, a compra do botijão de gás e a conta de energia elétrica. É isso que preocupa a população. Então esse projeto é perverso, prejudica a população. E no Senado vamos tentar garantir sua derrubada.

BdF-PE: Agora pergunto das articulações visando as eleições de 2022. O ex-presidente Lula (PT) e o PSB mostram interesse numa aliança nacional e estadual. Mas também há a possibilidade de você ou a deputada Marília Arraes serem candidatos ao Governo do Estado. Como você tem recebido as especulações em torno de seu nome e como avalia o cenário no campo da centro-esquerda em Pernambuco?

HC: Nós aqui em Pernambuco vamos atuar completamente sintonizados com o PT Nacional. O que o PT Nacional decidir, nós vamos encampar e trabalhar. Se a decisão for por uma aliança com o PSB – apesar do episódio muito traumático que tivemos na eleição municipal do Recife e achamos que não fomos tratados com a devida lealdade política que o caso merecia – mas em nome da eleição de Lula nós podemos sim apoiar um nome do PSB. Mas se isso não se viabilizar nacionalmente, o PT tanto pode apresentar um nome ao conjunto da Frente Popular, como pode lançar um nome para o cargo de governador.

Meu nome tem sido lembrado e fico lisonjeado com isso. É um sinal de que as pessoas têm um respeito pelo meu nome. Mas vamos avaliar mais para frente. Não há necessidade de fazer essa discussão agora. No momento o mais importante é enfrentar Bolsonaro, encarar a possibilidade inclusive de derrota-lo antes das eleições de 2022, através de um impeachment. Creio que todo nosso esforço tem que ser nessa direção.

Edição: Vanessa Gonzaga