Enquanto a vacinação contra covid-19 avança em Pernambuco, os municípios, responsáveis pela distribuição das doses, se esforçam para atender à alta demanda da população. A procura é tão grande que por vezes os sistemas das prefeituras não têm conseguido dar conta. O resultado são dificuldades de acesso e atrasos no agendamento.
Em Petrolina, no Sertão do Estado, o cadastramento para receber a vacina é feito exclusivamente pela internet. O músico Maércio José dos Santos, de 42 anos, está tentando se registrar na plataforma do município desde o dia 2 de julho, quando o sistema abriu para o público geral com mais de 40 anos, mas até agora não teve sucesso.
“No dia 17, eu tinha conseguido fazer o agendamento, mas não chegou para mim nenhuma confirmação. No dia, eu fui ao local, porque poderia ter sido algum erro de comunicação, mas meu nome não estava na lista. O atendente falou que era um problema no sistema e eu voltei para casa. Na minha casa está todo mundo vacinado, menos eu”, relata ele.
Na quarta-feira (04), a prefeitura anunciou a mudança do site de agendamento para um que possa comportar um maior número de acessos simultâneos e que seja mais veloz no repasse em tempo real de dados para o Ministério da Saúde.
A esperança de Maércio é conseguir se inscrever quando houver uma nova chamada – isso porque o sistema de Petrolina só abre para agendamento quando chegam novas doses à cidade. O músico critica o método adotado pela prefeitura, o qual compara com uma “gincana”.
“Acho que é um equívoco. A prefeitura deveria abrir a plataforma, todo mundo se inscrever, e eles irem convocando conforme a idade. Estão abaixando a faixa etária sem concluir a anterior. Não tem quantidade de vacina suficiente para essa quantidade toda de pessoas. Se eu não tivesse consciência, já tinha abandonado a ideia de me vacinar, sinceramente.”
A Prefeitura de Petrolina respondeu que só avança na vacinação quando há cerca de 50 a 70% de pessoas vacinadas para faixa etária anterior. “Então, de acordo com o número de doses recebidas, a equipe técnica analisa a possibilidade de avanço ou não”, afirmou em nota.
Na cidade, o agendamento é dispensado para pessoas acima de 55 anos. Todas as demais precisam se cadastrar previamente. Segundo o município, quem não tiver acesso à internet, pode contar com o auxílio das equipes das unidades básicas de saúde.
O sistema da capital de Pernambuco também passou por instabilidades nesta semana. Na terça-feira (03), a Prefeitura do Recife abriu o agendamento para pessoas acima de 23 anos às 19h, mas o portal Conecta Recife saiu do ar e só teve o funcionamento normalizado no fim da noite.
Em vídeo publicado no Instagram na madrugada da quarta, o prefeito João Campos explicou que o motivo da queda foi o número recorde de acessos na plataforma. "Para se ter ideia, o maior número registrado anteriormente de acessos foi de 200 acessos por segundo. Hoje, esse número passou para 700 acessos por segundo, com isso o sistema ficou fora do ar", falou João Campos, garantindo que todo o público alvo terá o direito de se vacinar.
O grupo liberado para o agendamento corresponde a mais de 130 mil recifenses. A microempreendedora Emanuela Andrade, 25 anos, começou a tentar fazer a marcação assim que o sistema abriu. Quem conseguiu registrá-la foi o seu irmão, só depois da meia noite.
“Foi uma experiência terrível. Eu imaginei que fosse ser difícil conseguir um agendamento, mas não imaginei que seria impossível. Se a prefeitura sabia a quantidade de pessoas nessa faixa etária, como ela não preparou o serviço para isso?”, disse.
Emanuela estava sem computador e acessando o sistema apenas pelo celular. “Eu não teria conseguido marcar se não fossem as pessoas tentando por mim, porque pelo aplicativo e pelo site no celular não estava funcionando. Quem conseguiu marcar conseguiu pelo computador, o que é um tanto absurdo”, opinou.
Quem enfrentar dificuldades para realizar o agendamento – ou não tiver internet em casa – pode ir em um dos centros de vacinação, em uma unidade de saúde da rede municipal ou no SESC Casa Amarela e Santo Amaro, onde há profissionais auxiliando no processo.
Distribuição socioeconômica e étnico-racial da vacina
A capacidade dos sistemas de agendamento não é o único gargalo da vacinação na capital, de acordo com um levantamento realizado pelo mandato do vereador Ivan Moraes Filho (PSOL). O documento divulgado nessa terça-feira aponta que a população que mora em regiões com menor renda domiciliar e maior taxa de letalidade não é a mais vacinada com o esquema completo de duas doses.
O estudo levou em conta os dados da Sesau de 19 de janeiro, data de início do plano operacional de vacinação da cidade, a 24 de junho de 2021 para analisar a equidade no acesso às vacinas.
A pesquisa coloca que os dez bairros com maior taxa de letalidade por coronavírus, por ordem, são: Linha do Tiro, Fundão, Rosarinho, Dois Unidos, Porto da Madeira, Mustardinha, Peixinhos, Cidade Universitaria, San Martin e Sancho. Desses, sete têm rendimento mensal médio domiciliar de até R$ 2 mil. A Linha do Tiro possui rendimento de até R$ 1.028,96; Dois Unidos, de até R$ 937,92; e Peixinhos, de até R$ 760, 62. Só dois bairros têm rendimentos mensal médio por domicílio acima de R$ 2,5 mil: o Rosarinho (R$ 6.547,75) e a Encruzilhada (R$ 5.692,93).
Entre os achados da pesquisa, consta que os dez bairros mais vacinados são Boa Viagem, Várzea, Cohab, Iputinga, Imbiribeira, Cordeiro, Casa Amarela, Madalena, Graças e Ibura. Procurada, a Secretaria de Saúde do Recife (Sesau) não quis se pronunciar até a publicação da reportagem.
