Na mira do Senado

Atuação de Helcio Almeida reforça acesso apadrinhado de “picaretas” ao Ministério da Saúde

Coronel foi o responsável, ao lado do reverendo Amilton, por levar Luiz Paulo Dominguetti a uma reunião com Elcio Franco

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Nas redes sociais, Almeida já criticou veementemente a CPI da Pandemia e chegou a chamar os senadores da comissão de “picaretas” - Jefferson Rudy/Agência Senado

Para os senadores da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, o depoimento realizado nesta terça-feira (10) do tenente-coronel da reserva Helcio Bruno de Almeida, presidente do Instituto Força Brasil, reforça uma das linhas de investigação que aponta para a tentativa de transformar o Ministério da Saúde em um balcão de negócios, enquanto vacinas do Instituto Butantan e da Pfizer foram negadas. 

Almeida foi o responsável por levar, no dia 12 de março deste ano, o reverendo Amilton Gomes de Paula, presidente da Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), Luiz Paulo Dominguetti e Cristiano Carvalho, ambos representantes da Davati Medical Supply, até o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, o coronel Elcio Franco, para tratar da negociação de 400 milhões de doses que não existiam da vacina do laboratório britânico AstraZeneca. 

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A reunião havia sido solicitada formalmente no dia 3 de março pelo Instituto Força Brasil para tratar da aquisição de vacinas por parte do setor privado. Pouco depois, no dia 9 de março, ao ser contatado pelo reverendo, Helcio decidiu incluir os representantes da Davati Medical Supply, bem como Amilton de Paula, em sua agenda. 

“Nesse sentido, imbuído de boa-fé e acreditando na seriedade da Davati a partir do pedido da Senah, aceitou-se compartilhar a agenda do IFB no Ministério da Saúde com a referida empresa. E foi somente nessa ocasião que vim a conhecer o senhor Cristiano Carvalho e o senhor Luiz Paulo Dominguetti”, afirmou Almeida. O tenente-coronel ainda afirmou que realizou uma pesquisa acerca da empresa e dos representantes, mas não encontrou nenhum problema.

Esse foi o terceiro encontro de Dominguetti com representantes do Ministério da Saúde. O primeiro se deu no dia 22 de fevereiro. Apenas seis dias depois de conhecer Dominguetti, o reverendo solicitou, por meio de um e-mail, uma reunião no Ministério da Saúde, para apresentar a proposta de 400 milhões de doses. A reunião foi solicitada no dia 22 de fevereiro, às 12h50.

Cerca de três horas depois, mesmo sem resposta ao e-mail, Amilton de Paula e Dominguetti se deslocaram até o Ministério, onde foram recebidos por Laurício Monteiro Cruz, diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, que faz parte da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS).

No segundo encontro, no dia 25 de fevereiro, Marcelo Blanco, ex-assessor da pasta, levou Dominguetti até Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de Logística, no restaurante Vasto, no Brasília Shopping. Na ocasião, Dias teria feito um pedido de propina de US$ 1 por dose de vacina ao representante da Davati Medical Supply. No dia seguinte, 26 de fevereiro, Dias ainda teria recebido Dominguetti em agenda oficial no Ministério da Saúde.

Nunca viu, nem ouviu, só escuta falar 

Apesar de ter confirmado a presença dos representantes da Davati, Helcio fez como o reverendo Amilton de Paula e Marcelo Blanco: buscou se afastar e se eximir do apadrinhamento de Dominguetti para acessar a Saúde, embora as tentativas dos senadores em descobrir se houve algum tráfico de influência e beneficiamento.

Enquanto falava à CPI, Cristiano Carvalho afirmou ao jornal O GLOBO que o Instituto Força Brasil pediu uma comissão de US$ 0,10 por dose para viabilizar a reunião com Elcio Franco. “Segundo Herman Cardenas [presidente da Davati nos Estados Unidos], a comissão total seria US$ 0,20 por dose de vacina, sendo que 50% seria da Davati e o que eventualmente sobrasse do US$ 0,20 seria dividido entre os intermediários como o Força Brasil e Senah, pagos pela Davati”, disse Carvalho ao GLOBO.

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Mercado privado de vacinas

A reunião do dia 12 de março, segundo Helcio Almeida, foi realizada para tratar da aquisição de vacinas pelo setor privado, como, inclusive, consta na agenda do Ministério da Saúde. O Projeto de Lei, no entanto, que propôs a regulamentação da compra de imunizantes por empresas particulares só foi apresentado na Câmara dos Deputados no dia seguinte. 

Segundo Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, a votação da proposta se deu em tempo recorde. Nesse sentido, os senadores investigam se, paralelamente à negociação da vacina da AstraZeneca, houve algum tipo de pressão para a viabilização deste projeto, na mesma reunião.

Antes, no dia 10 de março, foi sancionada a Lei nº 14.125, que dispõe sobre a aquisição e distribuição de vacinas por empresas privadas. A legislação deixa claro que as empresas só poderão comprar imunizantes após “o término da imunização dos grupos prioritários”, com a condição de que pelo menos metade das doses sejam doadas ao SUS. 

Quem é Helcio Bruno de Almeida?

Helcio Bruno de Almeida e Jair Bolsonaro são contemporâneos da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). Bolsonaro se formou em 1977, Almeida, em 1978. Em 2019, Helcio reencontrou Bolsonaro, após fazer campanha para o capitão reformado durante as eleições presidenciais de 2018. 

Nas redes sociais, Almeida já criticou veementemente a CPI da Pandemia e chegou a chamar os senadores da comissão de “picaretas”, além de defender atos antidemocráticos e ir contra medidas de combate à Pandemia.

O Instituto Força Brasil, inclusive, faz propaganda de dois sites dentro de sua plataforma, Awake Giants Brasil e Verdade dos Fatos, que também fazem campanha contra medidas de combate à pandemia de covid-19. O próprio site do Instituto traz informações falsas sobre a pandemia, como um artigo publicado com o título “A maioria das pessoas são imunes ao vírus da covid”.

Edição: Vinícius Segalla