Na mira do Senado

Investigação sobre banco fiador da Precisa Medicamentos leva Ricardo Barros de volta à CPI

Empresa seria propriedade de Marcos Tolentino, amigo do líder do governo na Câmara dos Deputados

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Roberto Pereira Ramos Júnior, diretor-presidente do FIB Bank - Pedro França/Agência Senado

O depoimento de Roberto Pereira Ramos Júnior, diretor-presidente do FIB Bank, trouxe o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), novamente para o centro da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, nesta quarta-feira (25)

A FIB Bank tem duas outras empresas como sócias. Uma delas é a MB Guassu, cujo verdadeiro dono parece ser, efetivamente, Marcos Tolentino, advogado e amigo de Ricardo Barros (PP-PR). O endereço da MB Guassu, bem como o telefone de contato, são os mesmos do escritório de advocacia de Tolentino, Benetti & Associados - Gestão Tributária e Empresarial. A outra empresa, a Pico do Juazeiro, que tem 4% do capital social, tem o mesmo endereço da Rede Brasil de Televisão, emissora de Tolentino.

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Segundo Roberto Júnior, o escritório presta serviços para a FIB Bank, mas não soube explicar a convergência dos endereços. Mais: Roberto Pereira Ramos Júnior não soube dizer os motivos que levam Tolentino a se apresentar em diversos contratos como único procurador e representante legal do FIB Bank. 

De acordo com uma reportagem da revista piauí, em 28 de maio de 2020, Marcos Tolentino se reuniu em seu apartamento em São Paulo com o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello, Ricardo Barros, Wagner Potenza, ex-diretor comercial do FIB Bank, e Francisco Emerson Maximiano, dono da Precisa Medicamentos. O jantar serviu para apresentar os personagens à possibilidade de contratar vacinas da Precisa.

Carta fiança 

O Ministério da Saúde fechou o contrato com a Precisa Medicamentos no dia 25 de fevereiro. No entanto, a carta de fiança foi concretizada pelo FIB Bank apenas no dia 17 de março. A garantia financeira de 5% sobre o valor total de R$ 1,61 bilhão era parte necessária para a assinatura do contrato. Segundo o diretor-presidente do FIB Bank, a Precisa Medicamentos pagou R$ 500 mil pela carta de fiança. 

A carta de fiança, que fazia parte do processo de aquisição do imunizante, foi assinada por Roberto Ferreira Dias, ex-diretor do Departamento de Logística da pasta, que foi acusado de ter pressionado funcionários da pasta para liberarem a vacina Covaxin. À CPI, Dias negou as acusações. Ele é considerado um dos apadrinhados de Ricardo Barros dentro do Ministério da Saúde, apesar de também negar a relação.

A garantia é do tipo fidejussória e não está prevista no contrato assinado entre a Precisa Medicamentos, o Ministério da Saúde e o laboratório indiano Bharat Biotech, responsável pela produção do imunizante Covaxin. O documento previa, na verdade, uma garantia do tipo bancária, seguro-garantia ou caução em dinheiro ou títulos da dívida pública. Conforme informou o jornal Folha de S. Paulo, ainda assim, a pasta incluiu a garantia fidejussória como seguro-garantia.

As suspeitas são de que, por meio de Ricardo Barros, Marcos Tolentino teve influência dentro do Ministério da Saúde para trazer a FIB Bank para dentro dos trâmites, ainda que a companhia apresente características que testem sua idoneidade. 

“Lorota Bank” 

O capital social do FIB Bank é de R$ 7,5 bilhões, valor considerado para uma empresa de grande porte, ainda que Roberto Júnior afirme que a empresa tenha uma estrutura pequena. O valor se refere a quatro grandes terrenos. Três deles sequer existem, conforme informações do Ministério Público do Paraná. O outro está situado em São Paulo. Desse valor, R$ 7,2 bilhões teriam sido integralizados pela MB Guassu. 

Atualmente, Sebastião Fernandes de Lima e Francisco Valderi Fernandes de Lima, que aparecem como donos da MB Guassu, faleceram. Sebastião morreu em 21 de agosto de 2017 e Francisco, em 10 de agosto de 2020.

Questionado sobre um documento da MB Guassu junto ao FIB Bank, datado de 3 de agosto de 2021, depois da morte daqueles que aparecem como donos, Ramos Júnior usou o direito de ficar em silêncio, concedido pela ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), em perguntas que incorressem em autoincriminação.

No inventário de um dos sócios, aliás, não tinha a declaração de bens, conforme informou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). “Outra coisa é que no inventário de um desses sócios fundadores da MB Guassu não tinha bens. E estes… Um desses sócios foi fundador da empresa que integralizou o capital de uma empresa”, disse o senador.

Antes de as empresas MB Guassu e Pico do Juazeiro constarem como donas da companhia, a FIB Bank tinha como sócios Alexandra Pereira de Melo e Geraldo Rodrigues Machado. Para a surpresa dos senadores, ambos ajuizaram ações na Justiça informando que jamais participaram da empresa.

Geraldo Rodrigues Machado, inclusive, um vendedor que mora em Alagoas, nunca sequer pisou em São Paulo, onde está localizada a FIB Bank. Ao contrário, Machado só tomou conhecimento de que seu nome havia sido utilizado de forma indevida durante uma consulta na Receita Federal ao tentar sacar o seguro-desemprego, quando registrou queixa em delegacia de polícia.

Outro ponto de estranhamento entre os senadores é que a empresa não tem autorização do Banco Central para funcionar como instituição financeira e sequer para oferecer esse tipo de apólice. A operação também viola acórdãos do Tribunal de Contas da União (TCU), que determinam que somente instituições financeiras reguladas pelo Banco Central podem emitir apólices bancárias. “É irregular a prestação de garantia contratual na modalidade fiança bancária prevista no art. 56, § 1, inciso III, da lei 8.666/1993, emitida por empresa que não seja instituição financeira autorizada pelo Banco Central”, diz o enunciado de um dos acórdãos.

A empresa também aparece como fiadora da Precisa Medicamentos em um outro contrato firmado com o Ministério da Saúde, para a aquisição de 10 mil preservativos femininos por R$ 31,5 milhões. Enquanto Ramos Júnior falava à CPI, o Ministério da Saúde enviou um ofício à Precisa Medicamentos solicitando a substituição da carta de fiança da FIB Bank no contrato dos preservativos, conforme informou o Poder360.

Ao fim do depoimento, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) solicitou a votação de um requerimento à Casa Civil e aos ministérios para pedir a suspensão imediata de todas as cartas de fiança do FIB Bank

Edição: Anelize Moreira