Fissuras

O agro rachou? Agenda ambiental e ameaça golpista expõem divisão “antes e depois da porteira”

Divergências vêm à tona às vésperas dos atos de 7 de setembro, mas não se refletem no comportamento da bancada ruralista

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Analistas dizem que não há ruptura, mas um tensionamento crescente entre setores do agronegócio brasileiro - Carlos Fabal / AFP

Enquanto ruralistas liderados pela Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja) aderem à convocatória para os atos pró-Bolsonaro no Dia da Independência, sete entidades ligadas à agroindústria publicam um manifesto em defesa da democracia, afirmando que o Brasil “é maior e melhor que a imagem que temos projetado ao mundo.”

As duas notícias, que circulam paralelamente na imprensa brasileira, revelam divergências internas ao agronegócio.

O Brasil de Fato ouviu pesquisadores e analistas para entender até onde vão essas fissuras e como impactam o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) e a democracia.

Não se trata de uma cisão

Em linhas gerais, os entrevistados concordam ao apontar que existem interesses corporativos e econômicos diferentes “antes e depois da porteira”.

Em um primeiro grupo, estariam produtores de carne e grãos, especialmente soja e milho, que são o público-alvo da maioria dos discursos de Bolsonaro.

Essa parcela, onde se encontra a Aprosoja, defende com unhas e dentes pautas como a flexibilização da legislação fundiária e das normas ambientais, além de posse e porte de armas no campo.

Do outro lado da porteira, estariam transnacionais exportadoras de commodities, que adaptam o discurso às exigências ambientais impostas principalmente na Europa.

Para essas entidades, interessa a estabilidade democrática e a construção de uma imagem de respeito aos direitos humanos e ao meio ambiente – para tornar os produtos brasileiros mais valorizados no exterior e evitar qualquer tipo de sanção.

Esse olhar é representado principalmente pela Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) – que articulou o manifesto citado no início da matéria.

“A ABAG representa o capital internacional apátrida, que está preocupado com o mercado externo. E a gente sabe que o tema da sustentabilidade, capturado pelo capital, tem sido uma pauta cada vez mais importante lá fora”, ressalta Frederico Daia Firmiano, doutor em Ciências Sociais, professor da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e coordenador do Grupo de Estudos sobre Crise, Neodesenvolvimentismo e Direitos Sociais (GEIND).

“A Aprosoja, que reúne especialmente ruralistas da região Centro-Oeste, tende a um alinhamento ideológico a Bolsonaro em certas matérias que a ABAG vai evitar. Por exemplo, a pauta do armamento dos latifundiários.”

As tensões vieram a público a partir de abril de 2020, quando frigoríficos e empresas exportadoras passaram a pressionar pela saída do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles – que só deixaria o cargo 14 meses depois. Na época, o Brasil era notícia mundial devido aos recordes de desmatamento.

“A ABAG fez uma iniciativa de marketing e lançou junto à Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura seis ações para supostamente coibir de maneira eficaz o desmatamento na Amazônia”, lembra Luiz Felipe Cerqueira de Farias, doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). O contexto era de pressões por parte de empresas europeias, que ameaçavam desinvestir em produtores de soja e grãos e em títulos do governo brasileiro.

Em reação a esse movimento, a Aprosoja rompeu com a ABAG.  Segundo o então presidente da entidade, Bartolomeu Braz, as exigências ambientais impostas aos produtores extrapolavam o Código Florestal e visavam “difamar o agro” no Brasil.

“A ABAG está falando a língua principalmente dos setores mais vinculados ao mercado europeu, enquanto os produtores de soja têm como horizonte um mercado muito mais estratégico, que é a China”, interpreta Farias.

Enquanto o grupo da ABAG teria mais poder de barganha no “andar de cima”, quem faz mais barulho internamente são os produtores alinhados ao discurso da Aprosoja.

Essa retórica, que se confunde com o próprio bolsonarismo em seu afã populista e “antissistema”, tem penetração nas redes sociais e será colocada à prova em atos como os de 7 de setembro.

“O documento produzido pelas entidades da agroindústria em defesa da democracia foi uma manifestação explícita de que essa ruptura institucional, sinalizada o tempo todo por Bolsonaro, tem um limite”, analisa Pedro Cassiano de Oliveira, doutor em História Social e pesquisador da questão agrária no Brasil.

“É interessante ver quem assinou esse documento: são produtores ligados, sobretudo, ao capital financeiro – indústria de óleo vegetal, de tecnologia em nutrição vegetal, de celulose, de produtores de óleo de palma. São, de fato, mais ligados ao mercado externo, e que por isso mesmo estão preocupados com esse tensionamento institucional.”

Mudança de eixo

A ABAG assumiu a liderança da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura em 2015. Desde então, vem liderando os esforços para colar a imagem do agro à sustentabilidade.

Por exemplo, o 20º Congresso da Associação, em agosto, teve como tema “Nosso carbono é verde” e demarcou a posição da entidade contra flexibilizações no Código Florestal – demandadas várias vezes este ano por parlamentares da bancada ruralista.

“Os anais do evento mostram que a ABAG aposta nesse ‘verniz verde’, na linha de que é possível garantir o aumento da produtividade e o avanço do agronegócio com sustentabilidade. Eles defendem a entrada do Brasil no mercado de carbono, a manutenção de algumas reservas florestais, e um mínimo consenso com relação às queimadas”, ressalta Oliveira.


Setores do agronegócio financiam os atos de 7 de setembro, enquanto outros lançam nota em defesa da democracia / Reprodução / Twitter

A vitória eleitoral de Donald Trump nos EUA, em 2016, representou a ascensão de um discurso de questionamento às metas climáticas e de negacionismo aos efeitos da ação humana no aquecimento global. Bolsonaro, dois anos depois, foi eleito na mesma onda.

O aumento do conservadorismo se refletiu na direção das entidades, especialmente da Aprosoja, com a eleição dos bolsonaristas Bartolomeu Braz, em 2018, e do atual presidente Antonio Galvan, em 2021.

“Bolsonaro reacendeu o conteúdo mais sombrio dessa turma [agronegócio], que vinha sendo mais ou menos ofuscado. Por isso, eles estão com toda essa desenvoltura, financiando os atos de 7 de setembro, e por aí vai”, analisa Gerson Teixeira, diretor da Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA) e integrante do núcleo agrário do PT na Câmara dos Deputados.

“Esse pessoal não tem limite e despreza a democracia. É uma retomada da UDR [União Democrática Ruralista] em seus tempos mais ‘gloriosos’, entre aspas, claro.”

A UDR, a que Teixeira se refere, surgiu nos anos 1960 como reação organizada e violenta dos grandes proprietários de terras aos movimentos populares do campo que defendiam a reforma agrária.

Conforme relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Terra, a organização liderada pelo pecuarista Nabhan Garcia foi responsável pela formação de milícias armadas contra camponeses.

“Desde, pelo menos, o governo Lula, ABAG e CNA [Confederação Nacional da Agricultura] têm um lugar muito importante no governo. Roberto Rodrigues, pela ABAG, foi ministro [da Agricultura] do Lula; Katia Abreu, pela CNA, foi ministra da Dilma”, lembra Frederico Daia Firmiano.

“A vitória de Bolsonaro provocou uma cisão, deslocando o centro da política agrária para uma entidade retrógrada como a UDR. Prova disso é o local que ocupa o Nabhan Garcia nesse governo [secretário especial de assuntos fundiários].”

A CNA, citada pelo pesquisador, disputa o posto de porta-voz do agronegócio com a ABAG, mas propõe adaptar a agenda ambiental à “realidade prática” dos produtores.

Por exemplo, na pauta da devastação da Amazônia e do Cerrado: a CNA reconhece a necessidade de frear o desmatamento ilegal – com destaque para esse adjetivo –, mas não propõe aumentar o investimento em fiscalização.

Assista no Youtube: Debate "Agronegócio: um negócio global”, promovido pela ABRA em parceria com a Friedrich-Ebert-Stiftung Brasil (FES Brasil)

“A direção da ABAG é muito ligada ao capital financeiro, às pautas que estão ‘depois da porteira’, que envolvem JBS, Bayer. Ela sai na frente por ter uma projeção midiática mais eficaz, enquanto a CNA leva vantagem na capilaridade. Ela é o sindicato patronal oficial dos produtores rurais, tem tributos sindicais e toda uma estrutura institucional de longa duração [desde 1951]”, explica Oliveira.

O fator Biden e a pressão externa

Após surfar na onda de Trump, Bolsonaro levou um caldo em 2020, com a vitória do democrata Joe Biden. A eleição dos EUA devolveu a hegemonia do discurso às entidades alinhadas ao Acordo de Paris e deixou o presidente brasileiro ainda mais isolado.

Biden chegou a afirmar na campanha que a continuidade das relações com o Brasil dependeria de mudanças na gestão ambiental para impedir a devastação da Amazônia. Em uma cúpula de líderes convocada por ele em abril, Bolsonaro moderou seu discurso e assumiu compromissos ambientais que, até então, rechaçava.

“A derrota de Trump foi uma mudança fundamental na geopolítica e modificou os termos da concorrência política intranacional. Isso não significa que, no nosso lugar na divisão internacional do trabalho, haja qualquer modificação”, pondera Firmiano.

Na visão dele, a demissão do ministro Ricardo Salles está ligada a essa modulação do discurso do governo.

O diretor da ABRA, Gerson Teixeira minimiza o impacto das pressões externas para adequação do Brasil a parâmetros de sustentabilidade.

“A pressão vem principalmente da Europa e tem dois tipos. Uma, impregnada pelo protecionismo, e outra, que está preocupada mesmo com a origem dos produtos, porque sofre pressão dos consumidores”, observa.

“Porém, o crescimento dos produtos brasileiros no mercado europeu é apenas residual. O que interessa é o mercado asiático, e lá não tem governo nem sociedade civil pressionando sobre a origem do produto que sai do Brasil. Estão preocupados com a segurança alimentar deles.”

Das 48,3 milhões de toneladas de soja comercializadas pelo Brasil, de janeiro a maio de 2021, 70,4% foram para a China. O país asiático teve ainda participação de 56% nas receitas de exportação de carne bovina no primeiro semestre.

Quem hegemoniza a bancada ruralista

O Brasil tem 47% de terras públicas, sob controle do Estado. Cerca de 10% não estão protegidas por demarcações indígenas, unidades de conservação ou assentamentos da reforma agrária.

“Existe um interesse generalizado da cadeia do agronegócio pela apropriação privada dessas terras públicas”, interpreta Luiz Felipe Cerqueira de Farias. Não à toa, são frequentes as tentativas, via Legislativo, de regularização das ocupações ilegais na Amazônia.

“Com base nesse interesse, mobiliza-se todo tipo de violência característico da formação brasileira: fraude na titulação das terras, violência contra povos originários, trabalho análogo à escravidão”, lembra.

“Por mais que surjam notas divergentes, que são fundamentalmente jogos para a plateia, para limpar a imagem do agronegócio brasileiro perante as empresas europeias, no fundo esse setor está vinculado a uma unidade de interesses comuns, que o bolsonarismo atende muito bem.”

Toda semana, Gerson Teixeira acompanha os debates da Comissão de Agricultura da Câmara. Na percepção dele, a narrativa montada pela ABAG para o mercado externo tem pouca penetração entre os deputados da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).

“Não se observam essas divisões aqui no Congresso. Considerando o agronegócio como um todo, tem a turma de dentro e de pós-porteira. Esse pessoal da base primária, no geral, reproduz a conduta da economia colonial. Tem uma minoria mais ‘moderna’, mas que não está disposta a meter a cara para um compromisso mais efetivo pela democracia, pela soberania”, analisa.

“FPA, CNA, estão todos ligadíssimos ao Bolsonaro, e essa turma é majoritária e hegemoniza. Nunca tem voto conflitante entre eles. Pode ser a pauta mais absurda: eles votam em bloco, como uma seita, uma religião. No Congresso, eles são um monólito.”

Entre os pontos de convergência entre todos esses grupos, estão a defesa de isenções fiscais e subsídios, da liberação de agrotóxicos, da tese do “marco temporal” para demarcação de terras indígenas e da paralisação da reforma agrária.

“Não vejo, no geral, uma divisão entre o agronegócio, ainda que tenha essas nuances, por conta da sensibilidade externa de alguns temas, como Amazônia. Mas, qual a reação que esses setores ditos ‘mais avançados’ tiveram em relação à aprovação do PL da Grilagem, por exemplo? Nenhuma”, enfatiza o diretor da ABRA.

“No máximo, tem umas entidades internacionais que mandam carta ao presidente da Câmara, dizendo que isso os desagrada, mas é só isso.”

Esses limites vieram à tona na entrevista do presidente da ABAG Marcello Brito ao programa Roda Viva, da TV Cultura, no último dia 30 de agosto. Questionado sobre o projeto da senadora Kátia Abreu (PP-TO) para antecipar as metas de redução de desmatamento ilegal de 2030 para 2025, o dirigente disse que “a ideia é ótima, mas não vai acontecer.”


Deputada federal licenciada, Tereza Cristina é nome de peso na FPA e fiadora do governo Bolsonaro / Marcelo Camargo/Agência Brasil

Frederico Daia Firmiano lembra que nem todos os debates entre ruralistas ocorrem em espaços abertos a espectadores. “A gente não assiste às divergências públicas da FPA. Ela é o espaço de interlocução entre as entidades, e o que aparece ao público é o consenso.”

O pesquisador Pedro Cassiano de Oliveira define a FPA como “coluna vertebral” de veiculação das pautas do agronegócio.

“Ela não só tem um braço de estudo, do IPA [Instituto Pensar Agropecuária], que tem técnicos e dinheiro para formular políticas e pensar os projetos encaminhados ao Congresso, como também tem debaixo de sua asa a bancada ruralista. Seu capital político é muito grande, e ela está alinhada, sem dúvidas ao Bolsonaro – muito em função da presença da Tereza Cristina no governo.”

Retórica golpista e eleições de 2022

A ministra da Agricultura é oriunda da bancada ruralista e vista como fiadora do atual governo.

“A permanência da Tereza Cristina representa a manutenção do apoio da FPA. Se ela desembarcar do governo, significará que se rompeu, de fato, o laço entre setores importantes do agronegócio com Bolsonaro. Se isso não acontecer, esses setores seguem com ele, apesar das críticas, até 2022”, prevê Oliveira.

Conforme revelado pelo portal The Intercept Brasil em 21 de agosto, ruralistas estão entre os financiadores dos atos pró-Bolsonaro no Dia da Independência.

Os organizadores querem reunir até 2 milhões de pessoas em Brasília nos dias próximos ao feriado, com a intenção de que 10 mil permaneçam acampadas por até um mês na capital federal.

A reportagem deixa claro que a “generosidade” é recíproca.

“Bolsonaro mandou mais de R$ 121 milhões para associações, sindicatos rurais e cooperativas ligadas ao agronegócio, segundo levantamento que fizemos no Portal da Transparência. Sem licitação, patrocinou mais de uma dúzia de feiras e eventos do setor, como a Agrotec Show Feira Agrotecnológica de Negócios, no Mato Grosso, e a 51ª Exposição e Feira Agropecuária de Castanhal, no Pará”, diz o texto.

Entre as beneficiárias, está a filial da Aprosoja no Mato Grosso.

O capitão dá sinais de que aposta todas as suas fichas nos atos do dia 7. Durante uma das convocatórias, disse que só enxerga três possibilidades para seu futuro: ser preso, morto ou a vitória.

Enquanto o presidente estica a corda e vai para o tudo ou nada, a nota das entidades lideradas pela ABAG em defesa da democracia adota um tom moderado.

“Essa nota não teve nada de mais, é uma coisa óbvia. Ao mesmo tempo, a gente teve a liderança do governo encaminhando, na reunião de líderes da Câmara, a aprovação do PL do Veneno, em função da pressão da FPA”, observa Gerson Teixeira.

“A ABAG quer realmente ter um verniz mais avançado, em função da imagem internacional, mas há uma relação de simbiose com a base do agronegócio que impõe um limite. Eles não vão fazer nada que implique em ruptura. Só marcam posição, nada mais que isso.”

Para Frederico Daia Firmiano, o que une as entidades do agro é mais importante do que aquilo que as separa, conjunturalmente.

“A gente vem assistindo a um tensionamento nessa direção. Isso significa um racha no setor? Certamente, não. Porque, no fundamental, eles se aliam, que é uma política econômica dedicada à intensificação dos setores do agronegócio”, diz.

“A questão para 2022 é saber quais candidaturas serão viáveis do ponto de vista do agronegócio. Se a candidatura Bolsonaro for viável, teremos na divergência um realinhamento.”

Doutor em História Social, Pedro Cassiano de Oliveira chama atenção para outro elemento da equação eleitoral.

“Vai depender muito de qual vai ser o movimento, a sinalização que Lula fará para esses setores do agronegócio. É mais um fator importante nesse xadrez”, lembra.

O petista é favorito em todas as pesquisas de intenção de voto, com chance de vitória até em primeiro turno.

Firmiano não acredita que divergências pontuais façam com que o agronegócio chegue “dividido” às eleições de 2022, e conclui lembrando que as entidades do agronegócio não irão “disputar” os candidatos.

“Qualquer candidatura que se coloque com alguma viabilidade depende desses setores. Então, quem vai exercer o jogo de trazer ou afastar essas entidades são as candidaturas, e não o contrário. Essas entidades têm total consciência de seu lugar na economia”, completa.

Reprimarização da economia e ameaças de ruptura

O aumento no tom de voz de Bolsonaro, sempre que acuado, pode levar a uma ruptura institucional – diferente daquela de 1964. Essa é a interpretação de Luiz Felipe Cerqueira de Farias, doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP).

Para o pesquisador, naquela época os golpistas tinham um centro de poder estruturado em torno das Forças Armadas e do capital industrial, que gerava uma acumulação de capital no centro-sul do país e servia como “locomotiva” para todas as frações da burguesia brasileira.

“Hoje, vivemos a desindustrialização e um protagonismo crescente das commodities minerais e agrícolas, que apontam para um golpismo policêntrico, uma ameaça difusa”, analisa, lembrando o alinhamento das polícias militares e das milícias ao atual governo.

“Temos uma proliferação de centros de poder que provocaram uma erosão das instituições da Nova República, que apontam possivelmente para uma ruptura da ordem, mas com um caráter difuso.”

O pesquisador cita como exemplo a cidade de Sorriso (MT), maior produtora de soja do país, que com apenas 100 mil habitantes “consegue falar grosso, em termos de PIB e de exportação.”

O dilema central desse novo golpismo, na visão de Farias, é como fortalecer esses novos centros, do ponto de vista econômico e político, para organizar todo o bloco no poder.

“Hoje a gente vê, nitidamente, uma dificuldade de organizar um centro de poder que consiga galvanizar um golpe de extrema direita no Brasil. São ensaios golpistas reais, mas com baixa capacidade de se consolidar”, analisa Farias.

“O que o agronegócio enfrenta é uma crise de hegemonia permanente, que não consegue dar respostas eficazes para a ingovernabilidade crônica nem fundir as frações do bloco no poder em torno de um grupo coeso, como consequência da própria reprimarização da economia”, finaliza.

Edição: Anelize Moreira