TRANSPORTE PÚBLICO

Rodoviários da Carris seguem mobilizados contra privatização da companhia no RS

De Porto Alegre (RS), a Carris é a única empresa pública de transporte presente em uma capital brasileira

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Trabalhadores saíram às ruas da capital gaúcha contra privatização da empresa pública de transporte - Divulgação

Desde que o prefeito Sebastião Melo (MDB) tornou pública sua intenção de privatizar a Carris, única empresa pública de transporte presente em uma capital brasileira, os trabalhadores da empresa seguem mobilizados. Na manhã desta segunda-feira (6), realizaram uma caminhada pelo Centro de Porto Alegre, culminando em concentração em frente à prefeitura, onde permaneceram durante à tarde. O objetivo das manifestações é alertar a população sobre o impacto da privatização da empresa. 

Ainda durante a manifestação, os trabalhadores recordaram do fim da função de cobrador. De autoria do Executivo municipal, o projeto foi aprovada na semana passada pela Câmara de Vereadores

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“Só quem anda de ônibus sabe da importância do cobrador. Não estamos ali para arrecadar o valor da passagem, auxiliar o motorista, pelo contrário. Ele tem um papel fundamental dentro do ônibus, social. Muitas vezes estamos ali guardando os filhos de outras pessoas que botam eles para irem para escola, idosos que andam sozinhos, cadeirantes”, aponta a cobradora Catiucia Souza dos Santos, que trabalha há quase 22 anos na Carris.

Para exemplificar a importância do cobrador, Catiucia cita um episódio em que um cobrador, anos atrás, salvou a vida dos passageiros. “O cobrador percebeu que o motorista passou mal, conseguiu pular a roleta e trancar o ônibus para evitar uma tragédia maior que poderia ter acontecido”, expõe, ressaltando que Porto Alegre, no momento, não está preparada para ficar sem cobrador. 

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Sobre o intento de privatizar a Carris, a cobradora enfatiza que a Carris não é somente uma empresa de transporte público. “Ela já teve uma importância social, de caridade, ajudar vilas, escolas. Por exemplo, tivemos um tempo atrás o ônibus afro que ajudava a cultura do negro na cidade. O ônibus bicho amigo. Arrecadação de agasalhos, comida. Tem um papel social importante para essa cidade”, destaca. “É muito orgulho estar aqui representando a empresa, e não deixar que isso ocorra. Esse governo nefasto que simplesmente quer privatizar tudo, por orgulho ferido”, conclui. 

Segundo dados da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), a Carris opera 22 linhas das 224 em circulação na capital. Desde o começo da pandemia, a empresa tem feito as linhas deixadas de lado pelas outras concessionárias da cidade, como no caso das linhas M10 (Restinga Nova Via Velha Noturna), M68 (Noturna Belém Novo) e M70, que passam pela Vila Cruzeiro, pelo Hospital Divina Providência e pelo Lami.


Rodoviários permaneceram durante à tarde em frente à prefeitura / Divulgação

Trabalhadores entregam proposta ao prefeito 

Durante à tarde, os funcionários entregaram ao secretário de Mobilidade Urbana, Luiz Fernando Záchia, um documento contendo uma proposta da Frente Ampla em Defesa da Carris e do Transporte de Qualidade. O conteúdo traz estratégias para o Transporte Público de Porto Alegre para o período entre 2022 e 2030. 

Entre as propostas está que a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) assuma a reestruturação das linhas, itinerários, tabelas horárias e frota de cada consórcio e da Cia. Carris de forma a otimizar os custos e oferecer um serviço confiável, em diálogo com as regionais do Orçamento Participativo. Também a manutenção das isenções de idosos, estudantes e PCDs com fontes de receitas extra tarifária, em especial com recursos do Fundo Municipal de Transportes.

Carta Pública ao prefeito Sebastião Melo 

Os vereadores da oposição divulgaram uma carta pública, nesta segunda-feira, ao prefeito da Capital sobre a importância da cidade manter uma empresa pública de transporte. Nela, os parlamentares ressaltam a importância dela não só para os seus funcionários, como também toda à população. 

“A cidade de Porto Alegre precisa de um sistema de transporte público que funcione bem e com passagens baratas. Não só para os que dependem dos ônibus para se deslocarem pela cidade, mas para toda a cidade que precisa daqueles que utilizam os ônibus. São trabalhadores que fazem a economia da cidade funcionar, no comercio, nos serviços, autônomos, estudantes, idosos, moradores distantes do centro e dos locais de trabalho, de moradia e de estudo, 600 mil usuários por dia. Cidades grandes como a nossa necessitam de um transporte coletivo por questões econômicas, sociais e ambientais”, afirma.

Abaixo a carta na íntegra 

CARTA PÚBLICA AO PREFEITO SEBASTIÃO MELO

"Porto Alegre precisa de ônibus que funcionem bem e com passagens baratas”

A cidade de Porto Alegre precisa de um sistema de transporte público que funcione
bem e com passagens baratas. Não só para os que dependem dos ônibus para se deslocarem pela cidade, mas para toda a cidade que precisa daqueles que utilizam os ônibus. São trabalhadores que fazem a economia da cidade funcionar, no comercio, nos serviços, autônomos, estudantes, idosos, moradores distantes do centro e dos locais de trabalho, de moradia e de estudo, 600 mil usuários por dia. Cidades grandes como a nossa necessitam de um transporte coletivo por questões econômicas, sociais e ambientais.

Se o debate sobre mobilidade urbana é cada vez mais atual e necessário, em Porto
Alegre também é importante discutir-se alguns dos fatores estruturais que explicam a atual situação:

1- A falta de controle do sistema de parte da Prefeitura. Há uma década, é a ATP, a associação das empresas privadas que controla o caixa do sistema, a Bilhetagem eletrônica e a Câmara de Compensação Tarifária (CCT), cabendo a ela distribuir os recursos arrecadados para as empresas. Isto levou a falta de transparência sobre a fluxo dos pagamentos e a distribuição dos recursos do sistema, pela falta do controle público.

2- A alta do custo do diesel e demais combustíveis, acima da inflação, decorrente de uma política de preços nefasta, implantada pelo governo federal, em especial a partir de 2019,  privilegiando os interesses de fundos privados internacionais que hoje controlam a Petrobrás. É preciso desenvolver esforços nacionais pela mudança desta política e recuperar a Petrobras para o povo brasileiro.

3- O empobrecimento da população de Porto Alegre e o aumento brutal do trabalho informal, sem carteira assinada e sem o vale transporte.

4- A Entrada no mercado dos aplicativos, os quais em grande medida, se apropriaram das viagens de curta distância, situação agravada durante a pandemia. 

5- Em Porto Alegre, aproximadamente, 80% do sistema de transporte por ônibus é privado. Diante deste quadro a proposta de liquidação ou venda da Carris não faz sentido. A cidade não ganha nada, só perde o melhor serviço de ônibus de Porto Alegre.

Diante deste quadro e da necessidade de viabilizar um sistema de ônibus que atenda os reais interesses da cidade, propomos:

1- Retomada imediata controle pela prefeitura/EPTC da Bilhetagem Eletrônica e da Câmara de Compensação Tarifária (CCT), inclusive, para atender decisões emanadas pelo Tribunal de Contas do RS e pelo Ministério Público que, por várias vezes, já  deliberam que a prefeitura cumprisse o que a lei determina. É inadmissível e inaceitável este descumprimento, é um caso claro de prevaricação e de improbidade administrativa.
2- Auditoria externa rigorosa dos últimos 5 anos da gestão do sistema de Bilhetagem e da Câmara de Compensação, para verificação da correta aplicação dos fluxos de entrada e saída das receitas do sistema aqui de Porto Alegre.

3- Criação do Fundo Municipal de Transportes para subsidiar a passagem. É impossível que todo o custo do sistema de ônibus disponível para a cidade seja pago só pela tarifa, a passagem. O Fundo seria composto por recursos como saldo da Câmara de Compensação Tarifaria, área azul, parcela do IPVA, e taxa de transporte.

4- Implementação de uma taxa de mobilidade urbana capaz de financiar o transporte e garantir uma brusca redução no preço da passagem. Entende-se que o transporte público é um serviço compulsório e de interesse público primário, sua prestação é absolutamente essencial para o bem de toda a comunidade. Sendo um serviço compulsório deve ser pago através de uma taxa que seja cobrada das empresas de acordo com o número de funcionários cadastrados, conforme os dados oficiais, garantindo assim, o passe livre para estes trabalhadores e uma passagem com valor muito mais acessível.

5- Como em outras cidades, definição no orçamento de recursos extraordinários para o financiamento do sistema, ainda em 2021.

6- Criação de Comissão Municipal para, em quatro meses, atualizar estratégias do sistema de ônibus de Porto Alegre para o ano de 2022.

A Carris é um patrimônio da cidade, premiada como a melhor empresa de transporte público do Brasil por vários anos. Foi a primeira a instalar ar-condicionado na sua frota e acesso a cadeirantes. Uma empresa inovadora e preocupada com a qualidade para os passageiros, com profissionais altamente qualificados. A Carris deve permanecer pública, prestando bons serviços à população. A Carris não é problema, é solução.

O que deve mudar é a forma coma a CARRIS tem sido administrada, no último
período. Sempre superavitária, a CARRIS passou a acumular déficits crescentes a partir de 2011. O problema não é a Companhia, mas aqueles que a administraram, em boa parte do período. Isto deve ser mudado, para tanto, propomos:

1.Uma gestão qualificada, dedicada e transparente para a Carris, com um Conselho de Administração novo e um contrato de gestão com metas claras de qualidade operacional e de desempenho financeiro.

2.Que a Carris não seja desfavorecida em relação às empresas privadas em termos financeiros e de subsídios (diretos e indiretos), e que seja remunerada de forma justa e apropriada, sempre que for chamada a operar linhas desassistidas pelas empresas privadas, como ocorre recentemente, por mais de uma vez.
3.
3. Quanto a possibilidade de extinção da função de “Cobrador”, aprovada recentemente, que seja revista a posição do governo e que se suspenda qualquer ação de retirada dos memos, até que as outas ações aqui propostas sejam avaliadas e implementadas.
Acreditamos que com estas medidas poderemos reorganizar o sistema de transporte coletivo da cidade, assegurando seu funcionamento regular e qualificado, respondendo aos anseios da população e exige por seu direito constitucional. Temos a certeza, que assim criaremos as condições para oferecermos com qualidade e passagem barata.

Para tanto, defendemos que sejam retirados os Pedidos de Urgência na tramitação dos Projetos, em especial o projeto que atinge a CARRIS e o das isenções tarifárias, para que
possamos construir uma solução coletiva.

A carta é assinada por:

Pedro Ruas (líder da oposição)
Aldacir Oliboni (líder do PT)
Bruna Rodrigues (líder do PCdoB)
Roberto Robaina (líder do PSOL)
Daiana Santos (PCdoB)
Jonas Reis (PT)
Karen Santos (PSOL)
Laura Sito (PT)
Leonel Radde (PT)
Matheus Gomes (PSOL)

 

 

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Marcelo Ferreira