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No 7 de setembro e todos os dias, as mulheres não arredam o pé da rua e exigem: Fora, Bolsonaro

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A presença das mulheres organizadas nos atos e mobilizações é marcante, mas precisa ser ainda maior e com mais destaque - Alice Vergueiro
As mulheres seguem na luta e nos esforços diários de mobilização contra o projeto de morte

O Grito dos Excluídos e Excluídas é uma manifestação convocada pelos movimentos sociais e populares desde 1995. No dia 7 de setembro, Dia da Independência, o Grito expõe as contradições da república brasileira estruturada pela desigualdade, pelo racismo, pelo patriarcado, pelos resquícios do colonialismo no capitalismo que vivemos.

Faz o contraponto a uma ideia de nação em que a ordem é pautada pelo controle repressivo, e o progresso, pela destruição em nome de um pretenso "desenvolvimento".

Para os movimentos que o constroem, o Grito dos Excluídos e Excluídas é um momento de ocupar as ruas por saúde, comida, moradia, trabalho e renda, defendendo a centralidade da vida, dos serviços públicos, do combate à fome, à pobreza, ao machismo e ao racismo.

Recuperar essa história de lutas é importante porque o ato convocado pelas direitas bolsonaristas é tão autoritário que se coloca como a principal manifestação dessa data, alegando que o ato dos movimentos populares de oposição seria apenas uma “resposta” para rivalizar com a convocação direitista.

Nossos movimentos não se organizaram em resposta ao ato do Bolsonaro, e sim por seguir seu próprio calendário de lutas e manter a resistência frente a uma conjuntura pautada por um projeto de morte.

É verdade, porém, que quando a direita fascista se impôs com sua manifestação em defesa da morte e da violência, nós tínhamos ainda mais motivos para estar nas ruas nesse dia.

Enquanto a base de apoio do atual governo clamava por intervenção militar, repressão e violência, nós estávamos nas ruas por comida no prato, emprego e democracia, pautas que se concretizam na palavra de ordem “Fora, Bolsonaro”, ou seja, no pedido de impeachment do presidente.

Como anuncia o lema do Grito de 2021, colocamos a vida em primeiro lugar. E colocar a vida no centro é um dos eixos de nosso feminismo, que propõe uma reorganização social sistêmica, capaz de valorizar e redistribuir todo o trabalho feito pelas mulheres, especialmente pelas mulheres negras, para sustentar a vida e a economia.

É a partir da luta popular, feminista e antirracista organizada que devemos combater sua política conservadora e ultraneoliberal e propor ações para desmontar o poder desse setor.

Nós, as organizações que fazem parte das frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, da campanha nacional Fora Bolsonaro e da organização do Grito, acertamos em não arredar o pé da rua.

Desorganizar-nos pelo medo, pelo perigo, era parte da tarefa deles, mas não vacilamos: foram pelo menos 300 mil pessoas em mais de 200 manifestações pelo país, tanto nas capitais quanto nos pequenos municípios. Além das manifestações, também houve panfletagens, ações de solidariedade com distribuição de alimentos, batucadas e colagem de cartazes por todo o país.

A manifestação bolsonarista em Brasília, porém, foi muito aquém da expectativa de participação deles, considerando o alto investimento de seus apoiadores. Em São Paulo, diferentemente do ato bolsonarista na Avenida Paulista (que, segundo estimativa dos Jornalistas Livres, teve a participação de cerca de 90% de pessoas brancas), o ato das esquerdas no Anhangabaú teve intensa presença popular e periférica.

Houve um esforço dos movimentos de mobilização e panfletagem para garantir a participação de militantes dos bairros mais distantes.

Enquanto na Avenida Paulista as vias de acesso estavam abertas, o tom agressivo e ameaçador dos bolsonaristas nos colocou na difícil posição de necessitar de cercamento policial e físico no Anhanbagaú, como forma de impedir confrontos da direita.

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Mais uma vez, restringiam nossas vozes e nossa livre circulação. Temos nitidez de que o posicionamento do governador João Dória foi antidemocrático, como é do costume de suas políticas, pois tentou a todo custo impedir que nossa manifestação ocorresse - seja autorizando a ocupação da Avenida Paulista pelos bolsonaristas e desautorizando nosso ato, seja inflando manifestações de setores da direita antibolsonaristas, com os quais não nos aliamos porque seu projeto de sociedade é também, antipovo e antifeminismo.

A presença das mulheres organizadas nos atos e mobilizações é marcante, mas precisa ser ainda maior e com mais destaque.

Após estas últimas manifestações dos fascistas fica ainda mais nítido o desespero de Bolsonaro para se manter no poder diante do fracasso de seu governo. Vivemos uma crise generalizada no Brasil, aprofundada pela pandemia, mas que a extrapola.

São mais de 14 milhões de pessoas desempregadas. O preço da gasolina está maior do que nunca, o que impacta no preço dos alimentos. A carestia é uma realidade diária enfrentada pelas mulheres que sustentam suas famílias e comunidades.

Enquanto isso, Bolsonaro mobilizou todo um gasto público para comparecer e convocar sua base de apoio sem fazer qualquer menção sobre tais assuntos.

Sua preocupação é livrar sua família de possíveis investigações judiciais por seu envolvimento com as milícias e pela corrupção desenfreada, inclusive na compra de vacinas, o que nos custou e ainda custa muitas mortes que poderiam ter sido evitadas.

Bolsonaro e os bolsonaristas, com o apoio de setores militares, empresariais e religiosos, fazem uso de um discurso e de práticas autoritárias, que não permitem a diversidade e a democracia e que impedem nosso bem viver.

É a partir da luta popular, feminista e antirracista organizada que devemos combater sua política conservadora e ultraneoliberal e propor ações para desmontar o poder desse setor - tanto o poder institucional, derrubando-o do governo, quanto o poder de violência que exibem nas ruas e em sua agenda política de forma mais ampla.

As mulheres seguem na luta e nos esforços diários de mobilização contra o projeto de morte desse governo. A Marcha Mundial das Mulheres marcou presença nos atos em cidades como Caruaru, Recife (PE); João Pessoa (PB); Natal e Mossoró (RN); Fortaleza (CE); Araguaína e Palmas (TO); Distrito Federal; São Paulo, Registro, Eldorado, Cananeia, Campinas (SP); Santa Catarina e Nova Prata (RS). A presença das mulheres organizadas nos atos e mobilizações é marcante, mas precisa ser ainda maior e com mais destaque.

As mobilizações contra Bolsonaro e tudo o que ele representa não começaram e nem terminam nesse 7 de setembro. É necessário destacar as mobilizações que os povos e as mulheres indígenas realizam agora, há mais de uma semana, em Brasília, em um acampamento de resistência contra o julgamento do Marco Temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que pode definir o futuro das demarcações de terras indígenas no Brasil.

Como parte dessa agenda de lutas, mais de 4 mil mulheres valentes enfrentam o bolsonarismo em Brasília e se preparam para a 2ª Marcha Nacional das Mulheres Indígenas. Enfrentaram, inclusive, ameaças graves de bolsonaristas que foram ao acampamento exibindo armas.

A luta dos povos originários, das mulheres e das pessoas trabalhadoras do campo e da cidade em defesa da terra e de uma vida livre de exploração e violência é central para o feminismo, para os movimentos de esquerda, e para a construção de um Brasil livre de fascismo, colonialismo, violência e desigualdade.

*A Coluna Sempreviva é publicada quinzenalmente às terças-feiras. Escrita pela equipe da SOF Sempreviva Organização Feminista, ela aborda temas do feminismo, da economia e da política no Brasil, na América Latina e no mundo. Leia outras colunas.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Leandro Melito