Cosme e Damião

Artigo | Começa festa nas tradições de religiões afro-brasileiras e do catolicismo

27 de setembro é dia de São Cosme e São Damião; nas religiões de matriz africana, dia dos Ibejís

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Nos terreiros de Umbanda e no Candomblé a festa de Cosme e Damião é celebrada com muita fartura, alegria, enfeites coloridos, doces, bolos e frutas - Cáritas Regional Nordeste

A devoção aos santos Cosme e Damião no Brasil tem sua principal expressão na festa do dia 26 de setembro. Em alguns terreiros, a celebração tem duração de um mês, iniciando em 27 de setembro (Cosme e Damião) e terminando em 25 de outubro (Crispim e Crispiniano).

Nessa data, é ofertado às crianças nas ruas e bairros de algumas cidades no Brasil, de forma mais presente nos estados da Bahia e Rio de Janeiro, os saquinhos de doces e brinquedos distribuídos em homenagem aos santos gêmeos.

No entanto, essa tradição não é mantida somente nas religiões afro-brasileiras. Os adeptos do catolicismo também fazem homenagens e têm devoção a estes santos. É comum, por exemplo, ter nas casas da zona rural altares com imagens de Cosme e Damião, considerados protetores das crianças.

Essas Entidades são seres espirituais mestres nos conceitos do Bem e do Puro e que muito ajudam para a evolução dos médiuns*, ensinando que a única forma de se levar vantagem na vida é sendo puro, assim como as crianças.

Também não admitem a mentira, nem a maldade, trazendo sempre renovações e esperança, reforçando a natureza pura e ingênua dos seres humanos. É a linha que mais cativa as pessoas pelo ar inocente que traz na face do médium. É brincando e rindo que efetuam maravilhosos trabalhos.

Nos terreiros de Umbanda e no Candomblé, a festa de Cosme e Damião é celebrada com muita fartura, alegria, enfeites coloridos, doces, bolos e frutas, tudo organizado com muito axé e seguindo o rito da espiritualidade.

Nesta celebração, não pode faltar o Caruru de Cosme e Damião, principalmente na região Nordeste. É dia de casa cheia, as crianças fazem a festa, sendo elas as principais convidadas. Na Umbanda, aprendemos que o primeiro alimento deve ser servido para sete crianças, isso significa alimentar os sete irmãos de Cosme e Damião.

As crianças se fartam de doces. Alguns lugares têm a tradição de organizar grupos constituídos por pessoas devotas, aquelas que pediram alguma prece e esta foi atendida, na sua maioria quando é referente a saúde.

Os grupos transitam por ruas, praças, casas, vilas, igrejas católicas, terreiros de Umbanda e Candomblé, entre outros espaços nos quais a data é festejada. Nesse deslocamento, as crianças percorrem áreas da cidade que não frequentam rotineiramente.

Porém, é muito forte o preconceito que se tem com esta celebração, hoje muito mais pela intolerância religiosa. Associam o ato de oferta a um rito de maldição, impedindo até mesmo das crianças irem às festas nos terreiros, ou simplesmente não receberem os doces neste período.

O caráter festivo do Dia de Cosme e Damião instaura outra temporalidade e altera a dinâmica das relações sociais nas comunidades, levando a uma circulação extraordinária de coisas e pessoas cujo caráter é tanto lúdico quanto religioso, focando as dimensões da reciprocidade, das relações inter-religiosas e dos fluxos urbanos, principalmente nas áreas periféricas onde está a população mais empobrecida.

Sincretismo religioso

Considerando o intenso trânsito religioso desses santos, faz-se necessário ressaltar que, conforme a tradição católica, os gêmeos Cosme e Damião teriam sido médicos anárgiros, que realizavam curas milagrosas de forma voluntária, praticando a caridade.

Somavam a sabedoria da medicina à cura pela espiritualidade. Nas religiões afro-brasileiras, os pedidos feitos aos Erês sempre são atendidos, mas em recompensa, a pessoa precisa fazer algo de doação para alguém, e se não cumprir a graça pode não ser alcançada.

No contexto da Diáspora Africana nas Américas, o culto aos santos gêmeos foi associado ao culto africano à gemelaridade, destacando-se, em terras brasileiras a hibridização entre Cosme e Damião e os orixás Ibejís, protetores dos gêmeos na tradição Iorubá. Nesse processo de articulação, tanto a função quanto a imagem de Cosme e Damião foram redefinidas.

Os santos passam a estar ligados à infância, considerados protetores não só dos gêmeos, mas das crianças de maneira geral. Em suas estátuas, Cosme e Damião adquiriram formas infantis e um novo personagem foi acrescido à sua imagem, como uma miniatura dos gêmeos, posicionada entre eles. Sendo três os irmãos: Cosme, Damião e Doum, este uma versão popularizada do termo iorubá Idowú, nome que se dá ao irmão nascido após os gêmeos Ibejís.

Associados aos orixás e infantilizados, os santos passaram a integrar panteões religiosos diversos, ultrapassando os limites do catolicismo, tornando-se presentes em religiões de matriz africana (Candomblé, Umbanda, Batuque, etc.).

É uma prática lúdica e religiosa tradicional no Brasil, que pertence à cultura popular brasileira, São Cosme e São Damião são os padroeiros das crianças. Como desde sempre tivemos que esconder nossa espiritualidade, nossos orixás africanos, como no caso dos Ibejís, tiveram que tomar novas formas e assim também é com Cosme e Damião, divindades gêmeas, que contrapõe às normas, a seriedade e autoridade.

Aproveite o dia de Cosme e Damião, a energia, a vibração e todo o entusiasmo dessas maravilhosas Entidades, dê uma pausa para pensar, desabafar e entender, embora de forma simples e pura, as profundas e sábias mensagens desses verdadeiros sábios, entidades de pureza cósmica.

Viva Cosme e Damião!
Salve todos os erês!
Salve Oni Beijada!

*Os médiuns na Umbanda são filhas e filhos da Casa que incorporam as entidades. A mediunidade está ligada ao trabalho de cura onde fazem os trabalhos de descarrego e repassam alguma mensagem espiritual.

**Josineide Costa, Assistente Social, pós-graduada em saúde da família, militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), filha de Santo da Mãe Bethe de Iansã, no Terreiro de Umbanda Sol do Oriente, em Águas Linda de Goiás.

Fonte: BdF Distrito Federal

Edição: Flávia Quirino