Política

PSOL é acusado de racismo por ex-candidatos negros que anunciam suas desfiliações

Para Juliano Medeiros, ações recentes da legenda contradizem as acusações de Douglas Belchior e Wesley Teixeira

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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"Fomos procurar os melhores partidos para fazer essa disputa", explica Wesley Teixeira - Foto: Reprodução

O educador Wesley Teixeira, candidato a vereador pelo PSOL em 2020, no município de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, anunciou sua desfiliação do partido na última segunda-feira (27).

Nesta quinta-feira (30), foi a vez de Douglas Belchior, também educador, candidato a deputado federal em 2018, divulgar sua carta de saída da sigla. Em comum, ambos acusam a legenda de racismo.

O presidente do PSOL, Juliano Medeiros, afirmou ao Brasil de Fato que não comentará, isoladamente, a desfiliação de membros. Mas falou sobre as acusações de racismo.

“Foi o PSOL que entrou no STF para que fossem garantidos recursos para negros e negras em todos os partidos. Foi o PSOL, o primeiro partido a garantir mais recursos para negros e negras do que para brancos, decisão interna nossa; o PSOL tem 30% de negros e negras em todas as suas instâncias, por decisão congressual; o PSOL tem uma líder mulher negra (a deputada federal do RJ Talíria Petrone); o PSOL é o partido da Marielle Franco.”

Para Teixeira, essa crítica não pode ficar restrita ao PSOL. “Eu acho que o conjunto dos partidos são racistas. Hoje, não temos um partido negro no Brasil. Pelo contrário, os negros e negras se organizam através de seus movimentos, que é para justamente pressionar para que esses partidos melhorem. Essa declaração do Juliano é contraditória. Apesar dele dizer que o PSOL entrou no STF para cobrar 50% de candidaturas negras, o partido não aplicou isso na candidatura passada. Para fora, fazemos uma coisa. Para dentro, não aplicamos.”


Wesley Teixeira, candidato a vereador pelo PSOL em 2020 / Foto: Arquivo Pessoal

No Twitter, Medeiros disse que “ainda somos atravessados pelo racismo estrutural que marca a formação social brasileira e, obviamente, temos muito o que evoluir”. Em seguida, criticou o ‘financiamento da sociedade civil’ através de think tanks empresariais, alguns deles estrangeiros. Esse sistema não combate o racismo. Ele o aprofunda.”

Medeiros faz referência ao uso de recursos de organizações internacionais no financiamento de atividades do movimento negro. Para Teixeira, essa crítica está atrasada.

“Eu penso que o PSOL precisa fazer uma discussão profunda sobre isso. Sobre o que significa o terceiro setor e o mundo das ONGs. É uma contradição que o partido precisa lidar, pois o partido sempre recebeu esses recursos. Para eles, vale, para os negros, não? Isso é uma agenda da filantropia. Agora, o PSOL está se colocando contra o terceiro setor. Existe uma agenda internacional na luta de combate ao racismo e fazemos parte dessa agenda. O movimento negro luta nesse país há mais de 30 anos, para resumirem a gente em financiamento privado.”

"Meu partido é o movimento negro"

Em 2020, Teixeira foi criticado por receber doações, para a sua campanha, dos empresários Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, e dos irmãos Moreira e Walter Salles, herdeiros do Itaú. Na época, o partido pretendia expulsá-lo de seus quadros, por conta dos recursos dos banqueiros. Mas recuou, diante da pressão do movimento negro.

Para Teixeira, esse é um episódio central de sua saída do partido. “Outras figuras do partido também receberam esses recursos. Vão punir o Guilherme Boulos por isso? Vão punir a Luciana Genro por isso? Teve alguma punição ao Marcelo Freixo? Alguma punição foi feita ao Edmílson Rodrigues? Então, tem uma seletividade da punição aí. Isso precisa ser questionado.”

Em 2018, quando foi candidato a deputado federal, Douglas Belchior, que é fundador do partido em Poá (SP), fez críticas públicas a partilha de recursos feita pelo PSOL. Na carta que publicou nesta quarta-feira (30), o educador voltou a acusar o partido de racismo.

“É evidente que pesa também na decisão pela saída do partido, toda a violência política, a prática do boicote, do apagamento, do silenciamento, da desqualificação e do racismo institucional que sofri nesses anos de embate, sobretudo quando passei a questionar, a partir de 2016, em documentos e diálogos internos, até chegar à esfera pública em 2018, a conduta racista das direções de São Paulo, de correntes internas e da direção nacional do PSOL”, encerrou.

 


Uma das principais lideranças do movimento negro no Brasil, Douglas Belchior deixa PSOL / Foto: Arquivo Pessoal 

Próximo de se filiar ao PSB, Teixeira afirma que seu partido, e de Douglas Belchior, que deve se filiar ao PT, “sempre será o movimento negro”.

“Quem dera, tivesse no Brasil um partido antirracista. Enquanto não existe, esse partido antirracista, que eu adoraria construir com o Douglas, temos que tomar nossas decisões pautadas na conjuntura. Então, nós fomos procurar os melhores partidos para fazer essa disputa. Hoje, essa condição não está colocada no PSOL.”

O Brasil de Fato procurou a deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ), líder do partido, para que comentasse as acusações. A parlamentar não havia respondido até o fechamento da matéria.

Procurado, Douglas Belchior também não comentou. Caso respondam, o texto será atualizado.

Edição: Anelize Moreira