Crise econômica

Na contracorrente do mercado global, bolsa brasileira acumula queda de 12% no ano

Entre julho e setembro o Ibovespa atingiu seu pior índice desde o auge da pandemia

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Denunciando o aumento da fome e uma política econômica que privilegia setores financeiros em detrimento da população, integrantes do MTST ocuparam, em 23 de setembro, a Bolsa de Valores de São Paulo - Foto: Divulgação MTST

O avanço da vacinação contra o coronavírus combinado com injeções de incentivos governamentais no mercado de ações globais tem fomentado uma alta nos índices das bolsas de valores no âmbito internacional. O Brasil, no entanto, destoa do resto do mundo.  

Considerando a variação do dólar, no período entre janeiro e setembro deste ano, o Ibovespa - índice de referência da Bolsa de Valores do Brasil – caiu 11,67%.  

Em contraposição, grande parte dos principais indicadores internacionais apontam ganhos. Na vizinha Argentina, o índice Merval mostrou alta de 28,7%. Nos Estados Unidos, Dow Jones, S&P 500 e Nasdaq subiram, respectivamente, 10,58%; 14,68% e 12,11%.  

O crescimento se repete em outros continentes e a explicação para a discrepância da bolsa brasileira em relação às demais passa por uma combinação de crises internas com rearranjos econômicos globais.  

A tempestade interna 

Especialista em investimentos da Invest, Juan Espinhel, declarou em entrevista ao Estadão que, em sua opinião, a volta do recesso parlamentar no início de agosto foi um divisor de águas.  

“O que está por trás disso é toda a discussão sobre o aumento do auxílio emergencial e como isso vai ser pago, dado que a principal agenda do governo hoje é o aumento de popularidade", afirmou. 

Visando a eleição presidencial de 2022 e com o índice de reprovação em 53%, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pressiona sua equipe econômica para viabilizar nova rodada do auxílio emergencial e um Bolsa Família repaginado, com novo nome (que muda constantemente e que, ao que tudo indica, se chamará Auxílio Brasil).  

Para isso, o ministério da Economia, capitaneado por Paulo Guedes, tenta emplacar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos Precatórios para adiar o pagamento de dívidas judiciais da União.  

Somada à crise hídrica que aumenta o custo de geração de energia, o cenário brasileiro para o próximo ano é de instabilidades fiscais. Diante do risco, muitos investidores buscam proteção no dólar e aumentam a pressão sobre o câmbio.  

:: Com alta acumulada de 39% no ano, gasolina puxa a inflação para a maior taxa desde o Plano Real ::

Em meio a alta dos combustíveis e de alimentos básicos, e uma inflação que atinge dois dígitos pela primeira vez desde 2016, Jair Bolsonaro afirmou na última sexta (8) - criticando o isolamento social mais uma vez - que a economia brasileira é das que menos sofreu na pandemia.  

Contexto internacional 

Diante da recessão imposta pela pandemia de covid-19, muitos países ricos adotaram políticas de investimento estatal na compra de ativos e redução de taxas de juros.  

Os Estados Unidos protagonizaram o mais significativo desses pacotes de estímulos, com seu Banco Central (o Federal Reserve) empenhando, até o momento, compras de ativos de US$120 bilhões ao mês.  

No Brics – bloco que reúne cinco grandes mercados emergentes do mundo e do qual o Brasil faz parte – os efeitos dessas políticas expansionistas foram variados. Enquanto as bolsas da Índia e da Rússia tiveram alta (23,98% e 11,68% respectivamente), a da África do Sul caiu 9,82%. 

A China também enfrentou queda, com recuo de 5,42% da bolsa de Xangai. A desaceleração do país asiático - destino da maior parte das commodities produzidas no Brasil - é parte importante das explicações da retração da bolsa brasileira.  

Com restrições à produção de aço, a China impôs uma queda nos preços do minério de ferro, afetando diretamente as ações da mineradora Vale.  

Expectativas 

Os fatores internacionais e nacionais que, sobrepostos, implicaram na queda da bolsa brasileira enquanto os pregões de Nova Iorque atingiram dois dígitos, não apresentam grandes expectativas de mudanças. 

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado para medir a inflação, já estourou a meta de 3,75% que havia sido estipulada pelo governo. Em agosto, acumulou alta de 5,67%. 

Enquanto isso, a intensificação do desemprego e da fome atingem números alarmantes. Já são 14,4 milhões de brasileiros sem trabalho.  

Em 23 de setembro a Bolsa de Valores em São Paulo foi ocupada pelo MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e pela Frente Povo Sem Medo. O ato denunciava as consequências da política econômica do governo Bolsonaro para a população brasileira. 

:: MTST e Frente Povo Sem Medo ocupam Bolsa de Valores em protesto contra a fome ::

Edição: José Eduardo Bernardes