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Uber, 99, Rappi e Lalamove devem registrar motoristas em carteira imediatamente, diz MPT

Procuradores afirmam que as quatro empresas de transporte e entrega por aplicativo cometem fraudes trabalhistas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Além da precarização, os procuradores ressaltam que o país deixa de arrecadar impostos por conta da manobra adotada pelas empresas – que se referem aos trabalhadores como “parceiros”, e não como empregados - Marcelo Camargo / Agência Brasil

O Ministério Público do Trabalho em São Paulo (MPT-SP) ajuizou quatro ações civis públicas na última segunda-feira (8) contra empresas de aplicativo de transporte, acusadas de fraude trabalhista.

As multinacionais Uber (EUA), 99 (China), Rappi (Colômbia) e Lalamove (Hong Kong) são alvos das ações, baseadas em investigações que constataram a existência de vínculo de emprego com motoristas e entregadores em todo o Brasil [clique no nome das empresas para ler cada ação, na íntegra]. 

O MPT requer que as empresas registrem imediatamente seus motoristas na carteira de trabalho, sob pena de multa de R$ 10 mil por trabalhador em situação irregular.

Leia também: Como a Uber manipula jurisprudência para evitar reconhecimento de vínculo de emprego

Os procuradores Eliane Lucina, Tatiana Simonetti, Rodrigo de Castilho e Renan Kalil, em articulação com a Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (CONAFRET), pedem ainda que as empresas paguem indenização por dano moral coletivo, equivalente a 1% do faturamento bruto de cada empresa.

Os procuradores afirmam, com base em dados fornecidos pela empresa 99, que 99% dos motoristas cadastrados no aplicativo trabalharam ao menos quatro dias por semana entre 2018 e 2019. Ou seja, não se trata de um trabalho eventual, mas de um emprego.

As demais empresas não forneceram os dados requeridos.

Veja também:

Além da precarização e do impacto sobre a renda das famílias dos motoristas e entregadores, os procuradores ressaltam que o país deixa de arrecadar impostos por conta da manobra adotada pelas empresas – que se referem aos trabalhadores como “parceiros”.

Com os processos protocolados nesta segunda-feira (8), o MPT chega a 12 ações civis públicas para que plataformas reconheçam vínculos empregatícios.

As ações contra Uber, 99, Lalamove e Rappi foram distribuídas, respectivamente, para a 4ª, 72ª, 84ª e 55ª Vara do Trabalho de São Paulo, onde serão julgadas.

Outro lado

A reportagem procurou as empresas citadas.

A estadunidense Uber respondeu por meio de nota:

"A Uber esclarece que não teve acesso à ação mencionada e que não recebeu nenhuma notificação do Poder Judiciário antes de ser procurada pela imprensa. Assim que a Uber for notificada da instauração do processo judicial, apresentará todos os elementos necessários para demonstrar que as alegações e pedidos do Ministério Público do Trabalho são baseados em entendimento equivocado sobre o modelo de funcionamento da empresa e da atividade dos motoristas parceiros.

Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima.

Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça do Trabalho vêm construindo sólida jurisprudência confirmando o fato de não haver relação de emprego entre a Uber e os motoristas parceiros, apontando a inexistência de onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação, requisitos que configurariam o vínculo empregatício. Em todo o país, já são mais de 1.450 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho neste sentido, sendo que não há nenhuma decisão consolidada que determine o registro de motorista parceiro como empregado da Uber.

Em relação à atuação da Uber nos tribunais, a afirmação do MPT de que existe ‘manipulação da jurisprudência’ não se sustenta quando confrontada com a realidade. Do total de ações contra a Uber finalizadas até 2020, cerca de 10% resultaram em acordos, índice que representa menos da metade da média em toda a Justiça do Trabalho no mesmo ano – 23% – segundo o relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça.

O Tribunal Superior do Trabalho, mais alta corte trabalhista do país, já reconheceu, em quatro julgamentos, que não existe vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros. No mais recente, a 5ª Turma afastou a hipótese de subordinação na relação do motorista com a empresa uma vez que ele pode ‘ligar e desligar o aplicativo na hora que bem quisesse’ e ‘se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos de viagem desejasse’.

Em março, a 4ª Turma decidiu de forma unânime que o uso do aplicativo não configura vínculo pois existe ‘autonomia ampla do motorista para escolher dia, horário e forma de trabalhar, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber’.

Entendimento semelhante já foi adotado em outros dois julgamentos do TST em 2020, em fevereiro e em setembro, e também pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamentos desde 2019 - o mais recente foi publicado em setembro."

A 99 informou que a empresa está representada no seguinte posicionamento da Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec):

“As empresas associadas à Amobitec são responsáveis pela intermediação entre consumidores, estabelecimentos comerciais e profissionais parceiros, motoristas e entregadores que atuam de forma independente e sem subordinação trabalhista às plataformas.

Na contramão da ação proposta pelo MPT, a grande maioria desses profissionais têm repetido que não deseja ter vínculo com uma plataforma. Segundo pesquisa do Instituto Locomotiva, dois em cada três entregadores preferem o modelo de trabalho autônomo e flexível ao registro em carteira, resultado semelhante ao identificado em estudo do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) com motoristas.

A atividade dos parceiros por intermédio das plataformas é baseada na flexibilidade e autonomia, possibilitando total liberdade na escolha dos dias, horários e formas de trabalho, sem imposição de turnos ou carga horária mínima, garantindo sua livre entrada e saída a qualquer momento, assim como a atuação em diferentes aplicativos.

É importante destacar decisões já proferidas tanto pelo Tribunal Superior do Trabalho, como pelo Superior Tribunal de Justiça, que ao analisar o assunto, em diferentes processos, já afirmaram que parceiros de aplicativos são profissionais autônomos, sem vínculo de emprego com as plataformas. No julgamento mais recente, de maio de 2021, foi reconhecida pelo TST ‘a ausência de elementos caracterizadores da relação de emprego’, já que próprio parceiro revelou ‘que poderia ligar e desligar o aplicativo na hora que bem quisesse’, bem como ‘poderia se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos desejasse’.”

A Lalamove também disse que não foi formalmente notificada pelo MPT-SP e que tomou ciência da ação por meio da imprensa.

"A Lalamove reitera seu compromisso com a verdade, as autoridades locais e com seus motoristas parceiros, e permanece à disposição para compartilhar toda e qualquer informação solicitada", diz nota enviada pela assessoria de comunicação da empresa.

Brasil de Fato não conseguiu contato com a Rappi, que informou a outros veículos de imprensa que não pretende se manifestar sobre o caso.

Edição: Vivian Virissimo