Levantamento

Pesquisa mapeia 400 grupos extremistas de direita na Europa

Mapa antifascista faz levantamento de pessoas, partidos, organizações e até eventos da extrema direita europeia

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Partido neonazista Aurora Dourada foi declarado como 'organização criminosa' pela Justiça da Grécia - Wikimedia Commons

Mais de 70 anos após a derrota do nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial, um espectro da ultradireita segue a operar em diversas regiões da Europa, carregado por grupos, partidos e personalidades de tendências fascistas. Para localizar, analisar e combater tais iniciativas, uma ferramenta online, projetada pela Fundação Rosa Luxemburgo, busca "monitorar" o desenvolvimento de tais organizações da extrema direita.

Desde partidos legalizados, que operam dentro de Parlamentos, até organizações terroristas e abertamente neonazistas, a plataforma Antifascist Europe encontrou mais de 400 organizações europeias com ideologias reacionárias. A Fundação Rosa Luxemburgo defende que a exploração desses dados tem como objetivo "documentar e visualizar" as atividades dessas entidades, criando a possibilidade de analisar as ligações internacionais entre os movimentos. 

Ao site espanhol El Salto, Amelia Martínez-Lobo, da Fundação, disse que há grupos que vão à Ucrânia, por exemplo, para receber treinamento militar ou para "lutar” contra combatentes pró-Rússia. "Partilham financiadores ou organizam eventos. Estas são as ligações internacionais que queremos acompanhar", disse. 


Plataforma Antifascist Europe mapeou mais de 400 organizações fascistas na Europa / Reprodução

Mas como funciona a ferramenta? Seguindo as instruções da plataforma (que está disponível somente no idioma inglês), os usuários podem ter acesso aos diversos grupos a partir de funções de filtragem (Filter), utilizando como base palavras-chave (Search Terms), ou também selecionando um país específico (Countries). A partir da busca, os resultados podem permitir que sejam encontradas as organizações, tendo também informações detalhadas sobre cada um dos movimentos. 

O mapa elaborado por pesquisadores, jornalistas e ativistas da Europa foi pensado para ser uma ferramenta interativa, onde o usuário pode explorar, a partir do que pretende procurar, o histórico de cada país, quais são os grupos fascistas mais proeminentes de cada região e ainda se há partidos em ascensão. 

Para isso, há quatro categorias que podem ser filtradas na busca: Pessoas (People), Grupos (Groups), Partidos (Parties) e Eventos (Events). O primeiro indica quais personalidades políticas, ou mesmo líderes das entidades, estão em cada país. Já o filtro "grupos" contabiliza as organizações. “Partidos e eventos” mostram as legendas partidárias e as conferências e cúpulas convocadas pelos extremistas. 

Também há a opção de ir direto a um país específico. A plataforma disponibiliza para seleção, até o momento, 22 territórios que focos fascistas foram encontrados no continente europeu, como Espanha, Croácia, Irlanda, Suécia e outros. 

É na aba "Data explorer" do Antifascist Europe que apresenta tais ferramentas, agrupando também todos os resultados encontrados, podendo o usuário conhecer, seja as personalidades, os grupos, partidos ou eventos, ao clicar na opção. Ao selecionar por essa forma, o mapa atualiza mostrando o país, histórico e, em alguns casos, um link da mídia social que remete ao resultado selecionado.

Além dos mapas e dos resultados da busca, a plataforma também oferece outros detalhes com relação ao que for encontrado, como uma "visão geral" (Overview) do país, a "situação atual" (Current situation) e ainda "notícias e análises" (News & analysis). O acesso à sessão da situação permite, por exemplo, que o usuário possa compreender o contexto social e político que existe na nação. 

Neonazistas ucranianos

Um dos resultados que é possível encontrar é sobre a Ucrânia. De acordo com a plataforma Antifascist Europe, no território ucraniano há um total de 16 focos neonazistas. A ferramenta indica: um evento; 10 grupos; duas personalidades; e três partidos políticos. Para a Fundação, tal cenário no país se dá pelas "mudanças" sociais, políticas e econômicas, levando a uma "ascensão do radicalismo".

A ferramenta aponta que o "maior grupo" ucraniano de extrema direita é o Movimento Azo, que inclui o partido Corpo Nacional como sua "ala política", o Regimento da Guarda Nacional Azov como "ala militar" e a organização Centuria (chamada Vigilantes Nacionais até 2020) como "paramilitares de rua". 


Partido neonazista Aurora Dourada foi declarado como 'organização criminosa' pela Justiça da Grécia / Wikimedia Commons

De acordo com o relatório da plataforma, a maioria dos grupos fascistas da Ucrânia não entram em "conflito aberto" entre si, mas "se observam". A Antifascist Europe também afirma que a região foi um "local de emigração" de neonazistas russos que "assumiram uma posição pró-ucrânia" no conflito entre os dois países. 

França e a eleição presidencial

Do lado da Europa Ocidental, a plataforma identificou 97 alas de ultradireita na França. São 35 grupos; 47 personalidades; e 15 partidos. Para os pesquisadores da Fundação Rosa Luxemburgo, a atual situação dessa ascensão conservadora é, possivelmente, por conta da eleição presidencial em abril deste ano.

Pesquisas eleitorais apontam que cerca de 32% dos franceses votariam em candidatos da extrema direita, como Marine Le Pen e Eric Zemmour. Além dos candidatos, há também, segundo o relatório da plataforma, uma "expansão preocupante" de temas fascistas dentro do debate público.  

Diferente da Ucrânia, na França há uma "paisagem parlamentar", ou seja, a extrema direita francesa está presente e atua no Parlamento do país por meio de partidos e políticos que concorrem às eleições regionais, nacionais e europeias. "Em 2021, o Parlamento francês contou com nove membros de extrema direita. [...] No Senado, dois membros representam a extrema direita. No Parlamento da União Europeia (UE), a extrema direita francesa ocupa 23 assentos de 79 dedicados ao país", aponta a plataforma. 


Mapeamento da França indica que há 35 grupos da extrema direita no país / Reprodução

No entanto, fora do âmbito parlamentar, grupos fascistas crescem no território francês. De acordo com o site, encontra-se uma "variedade" de institutos conversadores e think tanks que "visam” difundir o “conhecimento” para uma formação intelectual na França. Para isso, utilizam meios de comunicação para "disseminar e normalizar" seus discursos e atividades. 

Aurora Dourada na Grécia

A Grécia também é um dos focos de organizações fascistas que a plataforma mapeou. Governada por um partido de direita, o Nova Democracia, há 18 focos conservadores no país: três eventos; quatro grupos, oito personalidades; e quatro partidos. 

Conforme o Antifascist Europe, o principal partido de extrema direita grego é o Greek Solution, que conta com 10 assentos no Parlamento. A Aurora Dourada se mantém como liderança neonazista no país, mas nas eleições de 2019 não conseguiu eleger nenhum deputado.

O partido fascista ganhou força após a crise financeira de 2008 e chegou a ser o terceiro mais votado nas eleições legislativas de 2015. No entanto, em 2020, um tribunal de Atenas, capital da Grécia, determinou que o Aurora Dourada é uma "organização criminosa".

Segundo a plataforma, os incidentes racistas continuam presentes no território grego, mesmo após o "declínio" da Aurora Dourada. Diversos ataques de grupos fascistas ainda são recorrentes, principalmente contra a esquerda, refugiados e migrantes. Assim como atos de vandalismo.

Movimentos antifascistas

Para além de identificar os grupos, movimentos e partidos direitistas, os pesquisadores da Fundação também registram as organizações antifascistas que resistem na Europa. 

Na Itália, por exemplo, o Antifascist Europe mapeou 17 focos ultradireitistas. Do contrário, no país, há uma "variedade" de grupos que atuam, principalmente em nível regional, contra a ascensão fascista. Tais movimentos realizam campanhas engajadas na luta antirracista, pelos direitos humanos e em questões sociais. No entanto, o foco de alguns grupos é denunciar a ligação entre entidades da extrema direita e partidos políticos italianos. 

Já na Espanha, o site contabilizou entre grupos, pessoas e partidos, 32 expressões conservadores, tendo como principal o partido Vox. De acordo com a Fundação, a atuação dessa ala são ataques contra a esquerda e sedes políticas. 

Como resistência, movimentos antifascistas espanhóis se preocupam em evitar a ascensão, visualização e ampliação do discurso da extrema direita no país, que, segundo a Fundação, era “reduzida” e agora é reproduzida no Parlamento, com repercussão na mídia.