DESIGUALDADE

As crises econômica e social pesam mais no bolso das mulheres? Economista analisa

Isabela Mendes afirma que a alta no preço do gás, energia e alimentos impacta mais as brasileiras, sobretudo as negras

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
Alta dos preços de alimentos afeta especialmente as mulheres, que são maioria entre os brasileiros desempregados - Foto: Tânia Rêgo

O Brasil tem experimentado um significativo descompasso entre o custo de vida da população e o valor do salário mínimo. De um lado, as tarifas de água, gás e energia aumentaram drasticamente, além do preço dos alimentos, que vem batendo recordes. Do outro, o aumento do salário mínimo, em 2022, foi de 10,2%, o que, na avaliação de especialistas do setor, representa um reajuste insignificante diante da situação do país.

"Está tudo muito caro. A cada dia que a gente vai ao supermercado, é uma surpresa. Sacolão, outra surpresa. Carne, nem se fala”, espanta-se Luciene Aparecida Rodrigues, trabalhadora informal que mora em Belo Horizonte. Não é para menos. Na capital de Minas Gerais, de acordo com o Mercado Mineiro, os consumidores podem ter que desembolsar até R$ 9,90 para comprar um quilo de tomate e R$ 19,90 para comprar um quilo de jiló.

Como trabalha fazendo bolo por encomenda, Luciene compra, em média, dois botijões de gás por mês. E esse foi um dos grandes vilões do orçamento doméstico, com um reajuste anual de 36,99%. Mas o gás não está sozinho: a energia aumentou 21,1%; o transporte, 21,03%; e a gasolina quase dobrou de preço e aumentou 47,49%.

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Elas são maioria no mercado informal

As mulheres foram fortemente afetadas pela deterioração que o mercado de trabalho vem sofrendo desde 2020. “Eu não tinha ocupação nenhuma, porque eu era faxineira e, como fechou tudo, perdi minha renda. Então, comecei a fazer máscaras. E agora eu vendo cosméticos, conserto roupas e faço bolo por encomenda”, conta Luciene.

Desde o início da pandemia de covid-19 no Brasil, em março de 2020, uma parte expressiva das brasileiras perdeu sua ocupação e "muitas nem buscaram uma nova inserção". É o que aponta os dados da Pesquisa Nacional de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) de 2020, realizada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). 

De acordo com a entidade, entre o terceiro trimestre de 2019 e 2020, 8,6 milhões de brasileiras deixaram o mercado de trabalho.

O índice de desemprego no país atingiu 11,1%. As mulheres são a maioria entre os brasileiros desempregados, em empregos informais, precarizados ou sem proteção social.

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“Além disso, os rendimentos das mulheres são em torno de 75% daquilo que ganha um homem não negro. Já as mulheres negras chegam a receber 47% da remuneração paga para um homem branco”, explica a economista Isabela Mendes.

Isabela ressalta que a instabilidade econômica somada à ausência de políticas sociais também coloca as mulheres em vulnerabilidade social, com maior chance de vivenciar situações de violência doméstica.

“A implementação do Bolsa Família, por exemplo, que tinha como prioridade a titularidade das mulheres, teve um grande impacto no número de divórcios no Brasil e, consequentemente, no índice de violência doméstica”, diz.

“Ao contrário do Bolsa Família, o Auxílio Brasil não é permanente, acaba em dezembro de 2022 e depois o cenário é de completa instabilidade", lamenta a especialista.

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Sem apoio do governo

“O auxílio do governo não está sendo suficiente para suprir as necessidades. Tudo aumentou muito. Não está sendo nada fácil sobreviver nesta pandemia. Estou passando por dificuldades para manter minhas filhas”, relata Taciane Cristina. Ela, que é mãe de cinco filhas, critica a falta de apoio do governo para a população mais pobre do país.

Moradora da Pedreira Prado Lopes, um dos maiores aglomerados de Belo Horizonte, cotidianamente presencia o sofrimento que as mulheres da periferia têm enfrentado. “Que as próximas pessoas eleitas cumpram as promessas e de fato olhem para o povo", anseia a dona de casa.

Na avaliação de Isabela Mendes, no curto prazo, as perspectivas não são animadoras. “2022 deve seguir neste mesmo cenário, porque o conjunto de fatores que nos trouxe até aqui se mantém. É reflexo de um governo que abandonou completamente o compromisso com a vida dos brasileiros, sobretudo das mulheres”, considera.

Para a economista, a receita para reverter o atual cenário das brasileiras “obrigatoriamente” tem que ter como ingredientes políticas de geração de empregos de qualidade, soluções coletivas para os cuidados, como o aumento no número de creches, hospitais e escolas, políticas de assistência social e de combate à violência.

Fonte: BdF Minas Gerais

Edição: Larissa Costa