TERRAS INDÍGENAS

Deputado que pediu urgência a PL pró-mineração tem crédito de R$ 80 mil com chefe de mineradora

Líder do PSDB tem relação com executivo que atua com mineração na Bahia; projeto libera exploração em áreas indígenas

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Adolfo Viana (PSDB-BA) está no primeiro mandato na Câmara dos Deputados; antes disso, foi eleito deputado estadual por duas vezes em seu estado natal - Agência Câmara

O deputado federal Adolfo Viana (PSDB-BA) declarou à Justiça Eleitoral que tem um crédito de R$ 80 mil com o diretor de um dos principais grupos de mineração da Bahia. O congressista é um dos autores do requerimento de urgência ao PL 191/2020, que libera a mineração em terras indígenas, aprovado pela Câmara dos Deputados, na noite de quarta-feira (9).

De acordo com a prestação de contas de Viana nas eleições de 2018, registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ele emprestou a verba a Luis Henrique de Araújo Almeida, atual diretor de Novos Negócios do Grupo NovaVia, que atua nos mercados de pedra britada e solos.

Um dos itens da declaração de bens do deputado chama a atenção por ter exatamente do mesmo valor que emprestou ao executivo. Ele afirma que, à época, possuía R$ 80 mil em espécie. Procurado, o deputado não respondeu se a dívida já foi quitada e a razão de ter sido contraída.


Dois dos diversos itens declarados pelo deputado Adolfo Viana (PSDB-BA) à Justiça Eleitoral; prestação de contas foi aprovada / Reprodução/DivulgaCandConstas - TSE

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O Grupo NovaVia é formado pelas empresas Pedreiras Parafuso e Paisartt Construtora, da qual Almeida consta como administrador no sistema de consulta do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) da Receita Federal. Leia a íntegra do documento extraído do site.

O grupo exibe um amplo portfólio de clientes em seu site oficial. Entre eles, estão empresas e órgãos públicos, como Infraero Aeroportos, Petrobras e Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).

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A NovaVia também diz atender as principais empreiteiras brasileiras, como a OAS Empreendimentos, Andrade Gutierrez, Odebrecht, Gafisa, Cirella e Queiroz Galvão. A sede do grupo fica em Simões Filho, no interior da Bahia.

Líder do PSDB

Desde o início de 2022, o deputado Adolfo Viana lidera a bancada do PSDB na Câmara dos Deputados. Ele está em seu primeiro mandato na Casa. Antes disso, foi deputado estadual na Assembleia Legislativa da Bahia (Aleba) por dois mandatos seguidos.

Viana é um dos signatários do pedido de urgência ao lado dos seguintes deputados: Ricardo Barros (PP-PR), Altineu Côrtes (PL-RJ), André Fufuca (PP-MA), Elmar Nascimento (União Brasil-BA), Vinicius Carvalho (Republicanos-SP), Marcelo Moraes (PTB-RS), Luis Miranda (União Brasil-DF), Sebastião Oliveira (Avante-PE) e Euclydes Pettersen (PSC-MG).


Relação de deputados que assinaram o pedido de urgência, segundo consta no Requerimento de Urgência no site da Câmara dos Deputados / Reprodução/Câmara dos Deputados

Outro lado: sem resposta

O Brasil de Fato procurou a assessoria e o próprio deputado para verificar os motivos do empréstimo a um dos executivos da mineradora, e questionou se os valores devidos já foram pagos. Por volta das 10h45 desta quinta-feira (10), a equipe de Viana alegou que ele estaria em um vôo e disse que responderia ao contato mais tarde.

Às 14h, a reportagem voltou a procurar a equipe do deputado, que afirmou estar "aguardando a resposta dele". Até o momento, no entanto, não houve retorno ao questionamento. Caso o deputado se manifeste sobre o caso, o texto será atualizado e a nota disponibilizada na íntegra.

Requerimento aprovado

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na noite de quarta-feira (9), o requerimento de urgência para tramitação da proposta que libera a exploração mineral em terras indígenas. Foram 279 votos favoráveis à ideia e 180 contrários, em um placar precedido por uma série de protestos puxados pelo cantor Caetano Veloso, entre outros atores sociais que, durante o dia, pediram a rejeição da pauta. Três parlamentares se abstiveram.

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A medida tramita como projeto de lei (PL) 191/2020 e teve o requerimento de urgência apoiado líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros. Também nesta quarta-feira (9), mais cedo, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), disse que o texto será avaliado por um grupo de trabalho (GT) e que deve entrar em pauta na segunda semana de abril.

O PL 191/2020 foi um dos alvos de um grande ato popular que reuniu artistas e uma série de lideranças populares nesta quarta-feira no Congresso Nacional. O segmento havia demandado a rejeição da proposta, que tem apoio de Lira e outros aliados de Bolsonaro no Legislativo.

“Este projeto é desnecessário, inconstitucional e se baseia em fatos falsos, inexistentes, na necessidade de exploração de terras e jazidas indígenas e numa tramitação que ainda viola o regimento interno da Casa”, queixou-se o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), durante a votação.

“O PL deveria ter ido pra uma comissão especial e foi designado pra um GT, que é uma figura inexistente no regimento da Casa, e ainda querem trazer o PL a plenário sem sequer ele passar por alguma comissão”, bradou o pessebista, um dos opositores que foram a Brasília pra tentar frear o avanço da pauta.

Edição: Rebeca Cavalcante