Coluna

Honestidade seletiva

Imagem de perfil do Colunistaesd

Ouça o áudio:

O humorista Barão de Itararé implicava muito com Jânio Quadros, que tinha uma vassoura como símbolo de campanha - Unsplash
Varre varre vassourinha, varre varre a roubalheira

Vocês já repararam que muitos políticos que se dizem diferentes dos outros, que são mais honestos, fazem suas campanhas eleitorais jurando que vão acabar com a ladroagem, pôr corruptos na cadeia, coisas por aí, mas depois que tomam posse revelam-se iguais ou piores?

Não só não acabam com a corrupção como às vezes até aumentam. Já vimos por aí presidente impedindo que a polícia investigue mutretas de familiares, né?

O humorista Barão de Itararé implicava muito com Jânio Quadros, que tinha uma vassoura como símbolo de campanha, desde quando foi candidato a governador de São Paulo. Dizia que ia varrer a roubalheira. Seu jingle de campanha era assim:

“Varre varre vassourinha

Varre varre a roubalheira

Que o povo já está cansado

De sofrer dessa maneira”.

O Barão de Itararé, gozando, alterou a letra dessa musiquinha, que ficou assim na versão dele:

“Varre varre vassourinha

Varre varre a bandalheira

Varre a dos outros

Mas varre também a minha”.

Segundo uma crônica do Barão, os primeiros meses da administração de Jânio Quadros como governador foram no sentido de dar ao povo a ideia delirante de que ele estava moralizando tudo, acabando com tudo o que estava errado.

Assim, tornaram-se cotidianos despachos ditatoriais, ordens inflexíveis com uma linguagem rebuscada, prisões arbitrárias, espancamentos e demissões em massa de funcionários humildes.

Ainda segundo o Barão, pessoas geralmente bem informadas e frequentadoras dos corredores do Palácio do Governo contavam, em surdina, que certa vez o general Honorato Pradel, ex-secretário de Segurança, conversando com um amigo íntimo e fraternal a respeito da situação do país, depois de deixar o amigo à vontade perguntou:

- Diga-me com toda franqueza, o que pensa a respeito do governador Jânio Quadros?

O velho amigo pensou um pouco, passou a mão no queixo, coçou a cabeça e respondeu cautelosamente:

- O meu pensamento a respeito de tudo isso é o mesmo que o seu...

- Neste caso, meu amigo - respondeu com energia o general -, lamento muito, mas tenho o dever indeclinável de dar-lhe voz de prisão imediatamente. Sobre o governador não pode pairar a menor suspeita e muito menos um juízo tão desabonador como está revelando.

E levou o amigo para o xadrez.

 

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Douglas Matos