Entrevista

Ex-conselheiro da Otan analisa guerra na Ucrânia: "Putin não é louco"

Militar suíço comenta as origens do conflito e as estratégias do Ocidente

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Líderes da Otan em reunião na sede da organização, em Bruxelas, na Bélgica
Líderes da Otan em reunião na sede da organização, em Bruxelas, na Bélgica - Wiki Commons

A revista Zeitgeschehen im Fokus entrevistou Jacques Baud, coronel do exército suíço, especialista em inteligência militar e ex-conselheiro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e da Organização das Nações Unidas (ONU):

Pergunta: Senhor Baud, o senhor conhece a região onde agora há guerra. Que conclusões tira do que está acontecendo na Ucrânia?

Jacques Baud: Conheço bem a região. Eu estava com o FDFA [Ministério das Relações Exteriores da Suíça] e em seu nome fui destacado para a OTAN por cinco anos. Meu trabalho era combater a proliferação de armas letais, nessa qualidade contribuí para o programa na Ucrânia após 2014. Além disso, conheço muito bem a Rússia, a Otan e a Ucrânia devido ao meu trabalho anterior em inteligência estratégica. Falo russo e tenho acesso a documentos que poucas pessoas no Ocidente leem.

O senhor é um especialista na situação na Ucrânia. Sua atividade profissional o levou à atual região de crise. Como percebe o que está acontecendo?

É uma loucura, podemos até dizer que há uma verdadeira histeria. O que me surpreende, e realmente me incomoda, é que ninguém está perguntando por que os russos lançaram esta operação. Ninguém quer defender a guerra, e eu certamente também não. Mas como ex-chefe de “Política e Doutrina” do Departamento de Operações de Manutenção da Paz da ONU em Nova York por dois anos, sempre me pergunto: como chegamos ao ponto de começar uma guerra?

Qual era a sua tarefa na ONU?

A ONU precisava entender como as guerras acontecem, quais fatores levam à paz e o que pode ser feito para evitar baixas ou como prevenir a guerra. Se você não entende como a guerra acontece, então você não pode encontrar uma solução. Estamos exatamente nesta situação. Cada país está impondo suas próprias sanções contra a Rússia, e sabemos muito bem que isso não vai a lugar algum. O que me chocou particularmente foi a declaração do ministro da Economia francês de que eles querem destruir a economia russa com o objetivo de fazer o povo russo sofrer. Tal afirmação é ultrajante.

Como avalia a ofensiva russa?

Atacar outro estado vai contra os princípios do direito internacional. Mas os antecedentes de tal decisão também devem ser considerados. Antes de mais nada, é preciso deixar claro que Putin não é louco nem desconectado da realidade. Ele é uma pessoa metódica e sistemática, ou seja, muito russa. Acho que ele estava ciente das consequências de sua operação na Ucrânia. Ele avaliou, obviamente com razão, que se realizasse uma "pequena" operação para proteger a população de Donbass ou uma operação "massiva" em favor da população de Donbass e dos interesses nacionais da Rússia, as consequências seriam as mesmas. Então, ele foi para a solução final.

Por que o Ocidente age assim?

A abordagem ocidental, é necessário analisá-la do ponto de vista de sua doutrina operacional, baseia-se na ideia de que se você destruir a infraestrutura, a população se rebelará contra o "ditador" e você poderá se livrar dele. Essa também foi a estratégia durante a Segunda Guerra Mundial, em cidades alemãs como Colônia, Berlim, Hamburgo, Dresden, etc. Elas foram bombardeados até a destruição. Eles atacaram diretamente a população civil para que houvesse uma revolta. O governo perde seu poder devido a uma revolta e você vence a guerra sem colocar em risco suas próprias tropas. Essa é a teoria, a prática é muito diferente.

Confira a íntegra da entrevista no Resumen Latinoamericano.