Corrupção

Vereadores barram investigação sobre rachadinha na Câmara de Foz do Iguaçu (PR)

Pedido de cassação teve 6 votos favoráveis e 8 contrários; desvios seriam comuns "dentro de muitos gabinetes”

Brasil de Fato | Foz do Iguaçu (PR) |
Gravação de ex-assessor acusa vereador de "rachadinha". - Hérika Quinaglia _Diretoria de Comunicação da Câmara de Vereadores de Foz

A depender da maioria dos vereadores da Câmara Municipal de Foz do Iguaçu, no oeste do Paraná, a acusação de que a prática de “rachadinha” seria “comum em muitos gabinetes” do Legislativo local não será investigada na própria Casa. Com placar de seis votos favoráveis e oito contrários, a maioria dos parlamentares decidiu arquivar o pedido de abertura de uma comissão processante para apurar o caso.

Tornada pública por meio de um áudio vazado em 20 de março, a gravação entre o jornalista Luciano Alves e Felipe Menger, ex-assessor do vereador Galhardo (Republicanos), culminou na instauração de um inquérito policial tocado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), órgão vinculado ao Ministério Público do Paraná (MPPR).

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No áudio de 6 minutos e 24 segundos, Felipe afirma para Luciano que a prática de "rachadinha", caracterizada pela transferência do salário de assessores para agentes públicos, seria “comum em muitos gabinetes” da Câmara de Foz do Iguaçu. Para justificar sua acusação, Felipe narra sua experiência durante o período em que atuou no legislativo iguaçuense.

“Minha experiência dentro da Câmara foi curta, no curto período tudo que tem de errado pra se fazer era feito dentro de muitos gabinetes… Não é algo de exclusividade de vereador A ou B… Mas, claro, que por se tratar de um mandato do qual eu estava envolvido, ficou mais escancarado na minha percepção”, afirma Felipe ao destacar sua atuação junto ao vereador Galhardo.

Corporativismo

Se, por um lado, tão logo o áudio vazado resultou na abertura de um inquérito por parte do Gaeco, a primeira reação institucional da Câmara sobre o caso ocorreu em 4 de abril, após o Observatório Social de Foz do Iguaçu (OSFI) requerer à Comissão de Ética que investigasse a situação.

Até o momento, a Comissão de Ética do Legislativo não formalizou a oitiva do vereador denunciado, tampouco informou qual providência irá adotar.

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Blindagem

Diante da aparente morosidade dos vereadores, coube ao advogado Maiksuell Lima da Silva requerer investigação formal junto à Casa por meio do pedido de abertura de uma comissão processante. A iniciativa, formalizada na terça-feira (12), terminou por ser arquivada durante a sessão legislativa na semana passada.

No documento de 38 páginas, Maiksuell pontuou, além da suspeita de rachadinha, outras nove acusações contra o vereador Galhardo. Dentre elas, indícios de autoria de atos de corrupção, improbidade administrativa, comportamento incompatível com a dignidade da Câmara Municipal e falta de decoro. Ao saber do resultado da votação, o advogado lamentou por meio de suas redes sociais.

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“Diante de 10 fatos apresentados por indícios de corrupção, improbidade administrativa e quebra de decoro parlamentar, a Câmara Municipal, por maioria, decidiu sequer receber a denúncia apresentada. O sentimento de injustiça é o que paira neste momento”, desabafou.

Único vereador entre os que votaram contra a abertura de investigação parlamentar a justificar sua posição, Adnan Sayed (PSD) disse que a denúncia formalizada pelo advogado não contemplou os requisitos necessários para sua admissibilidade.

“Das 10 acusações, havia uma grave que era a questão da ‘rachadinha’. No entanto, analisamos cuidadosamente todas as páginas da denúncia e seus anexos e não foi encontrado prova, parecer do Ministério Público, inquérito policial e nem sequer arrolaram testemunhas. O que torna a acusação, neste momento, apesar de gravíssima, muito frágil para se perpetrar uma comissão para cassação de mandato", opinou.

Dias antes de ser submetido ao julgamento de seus pares, o vereador denunciado atacou a imprensa, o prefeito Chico Brasileiro (PSD) e o presidente da Câmara, Ney Patrício (PSD). De acordo com Galhardo, que nega as acusações, tudo seria resultado de armação política para prejudicá-lo.

“Olhe as palavras fortes que eu vou utilizar aqui, (...) eu vou citar quatro palavrinhas aqui, (...) milícia, intimidação de vereadores, porão da maldade, chicana. O que é chicana? Processo artificioso, querela de má-fé, enredo, é do que se trata este áudio”, acusou o vereador suspeito ao incriminar o prefeito Chico Brasileiro e o presidente da Casa, Ney Patrício, como possíveis responsáveis pelo vazamento do áudio.

Relembre o caso

O que o vereador Galhardo ainda não respondeu, seja à Comissão de Ética ou à sociedade iguaçuense, diz respeito à sua relação com Felipe Menger. De acordo com apuração feita pela reportagem do Brasil de Fato Paraná, Felipe chegou à Câmara Municipal em agosto de 2020, após Galhardo indicá-lo para assumir sua vaga na assessoria do então vereador Elizeu Liberato (PL).

O próprio Elizeu confirmou que sabia da relação próxima entre Felipe e Galhardo e que, inclusive, tinha conhecimento sobre a atuação de Felipe pela eleição de Galhardo naquele pleito. Ou seja, Felipe foi indicado por Galhardo em período pré eleitoral para trabalhar no gabinete de Elizeu, com salário mensal de R$ 8.902,76, enquanto, em paralelo, atuava como coordenador de marketing digital da campanha de Galhardo.

Ao final da eleição de 2020, Elizeu Liberato não foi reeleito. Já Admilson Galhardo conquistou uma das 15 cadeiras do Legislativo. Após o início da nova legislatura, Galhardo manteve a nomeação de Felipe, que continuou no cargo até junho de 2021.

Levantamento revela que, entre agosto de 2020 e junho de 2021, Felipe recebeu R$ 83.091,66 dos cofres públicos, sendo R$ 39.172,14 pagos por meio do gabinete de Elizeu, e outros R$ R$ 43.919,52 já por intermédio do recém-eleito Galhardo.

Em outro trecho do áudio, Felipe diz que, após deixar a assessoria parlamentar, Galhardo convidou sua companheira para exercer o mesmo cargo. A afirmação de que a esposa de Felipe teria sido nomeada por Galhardo e permanecido pelo período de um mês também foi confirmada pela reportagem. Juntos, o casal recebeu, em dez meses, R$ 95.555,47 como assessores parlamentares por intermédio de Galhardo.

Fonte: BdF Paraná

Edição: Frédi Vasconcelos e Lia Bianchini