opinião

Leonardo Sakamoto | Forças Armadas vão apertar Bolsonaro com mesmo afinco que questionam o TSE?

Em meio à alta no preço dos alimentos e dos combustíveis, o presidente voltou a criticar a urna eletrônica

|
"Bolsonaro sabe que não conseguirá colocar uma mão peluda na cumbuca no TSE, mas usa toda essa energia para corroer a credibilidade da corte e do Supremo Tribunal Federal" - Agência Brasil

As Forças Armadas – que não têm mandato para ser poder moderador, nem babá da República – enviaram 88 questionamentos ao Tribunal Superior Eleitoral sobre o que acreditam ser riscos do processo de votação. Deveriam aproveitar e responder o que fariam se, em caso de derrota de Jair Bolsonaro, o presidente não reconhecer o resultado que sair das urnas e incitar uma revolta.

Elas se colocarão ao lado da legalidade e, a pedido do Supremo Tribunal Federal ou do Congresso Nacional, agirão contra militares e policiais revoltosos que, desrespeitando as ordens de seus comandantes, forem às ruas, armados, apoiar o presidente? Ou farão a egípcia e deixarão o pau comer atendendo apenas ao chamado de Bolsonaro?

A contagem foi feita pelo jornal O Estado de S.Paulo, que avaliou que a maioria das perguntas dos militares está alinhada às críticas sem fundamento do presidente quanto às urnas eletrônicas. Saudoso do início da década de 1990, Bolsonaro não apenas trouxe índices de inflação comparáveis àquele momento como quer que o Brasil volte a usar papel nas votações.

Em meio à alta no preço dos alimentos e dos combustíveis, o presidente voltou a criticar a urna eletrônica – sua cortina de fumaça preferida. Nunca houve um problema no sistema de contagem de votos, mas ele criou um fantasma e, agora, sistematicamente chama a atenção para ele. Quer que as Forças Armadas façam uma contagem paralela, o que acabaria com o sigilo do voto. Elas não se manifestam diante da tentativa de instrumentalização por parte do presidente, apenas das críticas feitas por quem aponta que isso está, de fato, acontecendo.

Enquanto isso, há aliados do governo, no Congresso Nacional e nas redes sociais, defendendo que os militares interfiram diretamente no processo eleitoral, corrigindo o que acham que sejam falhas. Leia-se no lugar de "falhas" as garantias de que o presidente não conseguirá manipular os resultados caso eles o desagradem.

No final das contas, Bolsonaro sabe que não conseguirá colocar uma mão peluda na cumbuca no TSE. Mas usa toda essa energia para corroer a credibilidade da corte e do Supremo Tribunal Federal a fim de questionar as decisões deles daqui até o final do ano.

E, diante de seu vácuo de propostas para a reeleição, quer convencer que o importante não é que o seu governo dificultou a vida dos trabalhadores e foi, no mínimo, conivente com a mortes de 663 mil pessoas pela covid-19, mas que ele se colocou como um baluarte da luta contra um comunismo que só é hegemônico nas mentiras que ele mesmo conta.

É triste, mas o remédio de Jair para a perda de cabelo do povo diante do preço do tomate, do óleo de soja e do botijão de gás são pílulas de cascata sobre a urna eletrônica.