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BdF-PR 256

Editorial | Racismo e perseguição contra Renato Freitas

A moral burguesa está encardida de preconceitos, nas instituições, na estrutura da sociedade brasileira

Curitiba (PR) |
Vereador é acusado de quebra de decoro parlamentar após ter participado de ato antirracista em fevereiro - Foto: Giorgia Prates

Na sexta-feira, 13, completam-se 134 anos da promulgação da Lei Áurea, que tinha por justificativa o aparente fim a escravidão no Brasil. Coincidentemente, nesta semana avançou e pode ser sacramentada a cassação do mandato do vereador Renato Freitas (PT), na Câmara Municipal de Curitiba. O que ainda deve ser tema de mobilizações, polêmicas e protestos nos próximos dias.

Lembremos que antes do fim da escravidão (1888), outras leis pavimentaram e garantiram uma transição para o mercado capitalista bem ao estilo das elites nacionais: “lenta, segura e gradual.” Ou, como descreveu o sociólogo Florestan Fernandes: uma “transição transada”, na qual a elite conservou seu patrimonialismo, racismo e riquezas do período escravocrata.

Em 1885, a Lei Eusébio de Queiros determinava o fim do tráfico negreiro no Brasil. Em 1871, foi aprovada a Lei do Ventre Livre, que tornava livre os filhos de mulheres escravizadas. Já em 1885, foi aprovada a Lei dos Sexagenários, que alforriava os escravos com mais de 60 anos, desde que pagassem três anos de indenização aos senhores e não mudassem de cidade.

No fundo, as lutas por liberdade, igualdade e justiça, organizada pela população negra durante séculos, foi o que determinou o fim da escravidão e seguem mais vivas e gritantes do que nunca. O povo negro, a população periférica, luta cotidianamente pela efetivação de direitos que constam nas leis, mas que concretamente não se materializam.

A moral burguesa está encardida de preconceitos, nas instituições, na estrutura da sociedade brasileira, na consciência e na ação dos chamados “representantes”.

Renato Freitas, advogado negro e militante periférico, logrou o direito de eleger-se, mas isso não lhe garantiu o direito de exercer um mandato livre. Ele já estava, na verdade, cassado em 29 de novembro de 2020 – dia em que recebeu 5.097 votos do povo de Curitiba.

A ação na igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos foi só um pretexto para justificar sua perseguição. Até porque Freitas nunca se adaptou à institucionalidade, sempre denunciada por ele. Uma vez no Parlamento, o jovem vereador negro, ao lado de Carol Dartora (PT), denunciou o elitismo e o racismo presentes nesse espaço.

Denunciam também a falta de acesso e o completo descolamento dos poderes legislativo, municipal, estadual e nacional, com as demandas e dores reais do povo brasileiro. O mandato de Freitas é mobilizador, referência para a juventude negra, e enraizado nos movimentos populares. Por isso Freitas sofre perseguição do Estado, via PM e Guarda Municipal, nos episódios onde foi descriminado, preso e agredido.

O tímido aumento de vereadores negros e negras nas eleições municipais de 2020, nas capitais brasileiras, apenas revelou uma elite reacionária e que não aceita ceder em um milímetro seu poder. Tudo isso é inaceitável para uma Câmara onde a maioria quer apenas manter os privilégios da forma que estão.

Até agora, tudo leva a crer que a maioria dos vereadores de Curitiba decretará sua cassação, em votação no plenário. A Câmara, predominantemente escravagista, retrógrada e racista, não admitirá o exercício soberano do mandato de um militante negro e periférico. E é simbólico e sintomático que isso ocorra às voltas do dia 13 de maio.

Edição: Pedro Carrano