PRIVATIZAÇÃO

Opinião | Cobrança de mensalidade em universidades públicas é agenda do Banco Mundial

Deputados da base de Bolsonaro tentaram aprovar na CCJ da Câmara PEC que institui cobrança de mensalidade

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
66,19% dos estudantes da rede federal de ensino superior vêm de família cuja renda mensal não ultrapassa 1,5 salário mínimo per capita - Foto: Divulgação

No último dia 24, os deputados reacionários da base do governo Bolsonaro tentaram aprovar na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) nº 206/19 que institui cobrança de mensalidade nas universidades públicas.

General Peternelli e Kim Kataguiri (União Brasil), respectivo proponente e relator, justificam tal medida como forma de reduzir a desigualdade, apontando que nessas instituições estão maioria de ricos e que poderiam pagar pelo ensino. Após pressão dos estudantes, o projeto saiu de pauta.

No governo Bolsonaro, as universidades são alvo da agenda neoliberal de cortes e desmonte

Desde o primeiro dia do governo militar de Bolsonaro, as universidades são alvo da agenda neoliberal de cortes e desmonte. Prova disso foi o projeto Future-se, vergonhosamente derrotado nas universidades de Norte a Sul do país, que também previa a cobrança de mensalidades.

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Não é novidade

Em 2017, o Banco Mundial - uma instituição do capital financeiro, instrumento dos principais países imperialistas, que concede empréstimo aos países dependentes em troca da aplicação de políticas neoliberais e de ajuste fiscal – recomendou o fim da gratuidade no ensino superior brasileiro.

O relatório “Um Ajuste Justo” foi encomendado pelo governo Temer. Imediatamente defendido pela mídia e pelos banqueiros, o documento aponta que a “Universidade Pública no Brasil é ineficiente e injusta”, por que o custo de um estudante da universidade pública é três vezes maior do que no ensino superior privado e que alguns dos estudantes das universidades públicas estão entre os mais ricos do país. 

Este relatório, que na época foi comprado a peso de ouro pelo governo Temer, no entanto, é mentiroso.

Se tivesse consultado gratuitamente uma pesquisa realizada em 2014 pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) e o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (FONAPRACE) o governo saberia que 66,19% dos estudantes da rede federal de ensino superior vêm de família cuja renda mensal não ultrapassa 1,5 salário mínimo per capita.  

66,19% dos estudantes da rede federal de ensino superior vêm de família cuja renda mensal não ultrapassa 1,5 salário mínimo per capita

A universidade pública não é mais exclusiva para as elites e filhos de famílias ricas e brancas. Hoje, se popularizou através da expansão das instituições e com as políticas de cotas sociais e raciais. Popularização essa ainda insuficiente, é verdade, uma vez que os jovens pobres lutam para permanecer nas universidades sem verbas para bolsas, moradia e restaurante universitário.

Além disso, o Banco Mundial faz uma comparação injusta de custos entre as instituições públicas e privadas. As faculdades privadas não investem em pesquisa e extensão, limitando-se a impor aos estudantes uma formação de baixa qualidade, superexplorar os professores e lucrar com mensalidades abusivas.

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Enquanto isso, as Universidades Públicas são patrimônios do povo, investem no desenvolvimento da ciência e tecnologia, buscando soluções para os problemas comuns da sociedade e contribuindo para a soberania nacional. A pandemia de covid-19 demonstrou seu alto nível de produção: em abril de 2021, a Federal do Paraná desenvolveu uma vacina que podia ser produzida 100% no país.

Em matéria de soberania e desenvolvimento social, o que o Brasil precisa é expandir as vagas nas universidades públicas, uma vez que a maior parte das matrículas de ensino superior ainda está nas instituições privadas (75,8%).

Qual a solução para a crise das universidades?

A Educação e a Universidade são a solução e não o problema do Brasil. Nenhum país do mundo se desenvolveu, aumentou e distribui justamente sua riqueza sem um alto nível de investimento em educação.

De fato, há uma crise nas universidades públicas fruto dos cortes: nos últimos 10 anos, a verba de investimento foi reduzido em 70%, saindo de R$ 2,78 bilhões para inacreditáveis R$ 760 milhões em 2020.

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Só é possível salvar as universidades revogando imediatamente a Emenda Constitucional nº 95 que institui o teto dos gastos sociais e investindo os 10% do PIB em educação, como manda o Plano Nacional de Educação (PNE).

Para aqueles que dizem que o Brasil não tem dinheiro, a Auditoria Cidadã da Dívida já apontou o contrário: R$ 1,96 trilhão (50,78% do orçamento federal) foi gasto em 2021 com juros e amortizações da dívida pública. Auditar essa dívida, conforme manda a Constituição, fará com que o país tenha mais recursos para investir em saúde, educação, moradia, etc.

Em tempo: para corrigir a desigualdade que tanto preocupa general Peternelli, Kim Kataguiri e Bolsonaro, deve-se mexer no sistema de tributação brasileiro e taxar as grandes fortunas, fazendo com que os ricos de fato paguem imposto.

Apesar de meticulosas, as mentiras que sustentam a PEC 206/19 não escondem sua real finalidade: ampliar a desigualdade no ensino superior, desresponsabilizar o Estado pela manutenção das universidades públicas e fazer a vontade do capital financeiro, abrindo alas para a privatização do ensino.

Os estudantes não aceitarão os desmandos de Bolsonaro: tomaremos as ruas no dia 9 de junho para defender a educação e derrubar esse governo de milicianos e corruptos, em um grande ato nacional contra a cobrança de mensalidades nas universidades públicas.

Nos próximos dias, a UNE organiza junto das entidades estudantis em cada universidade uma jornada de mobilizações com assembleias e panfletagens para construir um novo tsunami da educação.

* Secretária-geral da União Nacional dos Estudantes (UNE)

**Este é um texto de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Rebeca Cavalcante