Coluna

Uma caricatura de Justiça

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Judiciário brasileiro deixa a Justiça de lado e abraça os seus privilégios - Pixabay
Caso da juíza de Santa Catarina, Joana Zimmer, expõe as entranhas do Poder Judiciário

O poder judiciário não clama por justiça. Isso mesmo, a categoria de justiça usada aqui é a do senso comum ou como costumam dizer, do "cidadão médio". Até esse indivíduo distante da crítica especializada percebeu o buraco moral que o Judiciário brasileiro se enfiou. 

Hoje, não há um órgão externo de controle do Judiciário, como se tem em qualquer lugar da sociedade, exercido, por vezes, pelo próprio Judiciário. Assim, prospera o corporativismo e a impunidade. As Corregedorias dos Tribunais demonstram ser insuficientes para uma apuração de fatos rigorosa com efeitos práticos relevantes para a mudança institucional.

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Depois dos arroubos autoritários inconstitucionais e todo descrédito proporcionado pela Operação Lava Jato, o caso da Juíza de Santa Catarina, Joana Zimmer, que inqueriu e impediu o aborto legal decorrente de estupro de uma criança de 11 anos, expõe as entranhas deste Poder, quem diria, da República! Diferentemente do que bradam juristas de diversas vertentes, o Judiciário brasileiro deixa a Justiça de lado e abraça os seus privilégios. Privilégios que afastam os magistrados da realidade social do seu próprio país, recheado de desigualdades. A bolha social luxuosa em que vivem compromete a própria atuação jurisdicional, incapaz de repelir barbaridades em nome da reprodução do seu micropoder e da moral social de seus membros. No caso em destaque, a ferida institucional é tão evidente que os danos causados pela decisão da juíza sequer a responsabiliza, ao contrário, apressou uma promoção desavergonhada de carreira, que alegaram já ser de direito. Direito esse que foi negado à criança.

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Caso ingressasse com uma ação de responsabilização, uma vez reconhecidos os danos causados pelo próprio Judiciário a essa menina, o processo levaria alguns anos, talvez uns 10 para finalizar. Reconhecida a responsabilização do Estado, aquela criança, na época dos fatos, teria que entrar numa fila de precatório para receber uma indenização, não tão relevante, o que levaria mais uns 10 anos. Um Judiciário moroso e burocrático com os mais pobres e vulneráveis, e complacente com os poderosos e os seus próprios membros pode fazer tudo, menos Justiça.

Para a eleição de 2022, não esqueça de observar quais candidatos falam de uma reforma, que não foi feita na Constituinte de 1988 e pouco se fala, pois interessa àqueles que tem muito. A Reforma do Sistema de Justiça!

*Gladstone Leonel Júnior é Professor Adjunto da Faculdade de Direito e do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense. Doutor e Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Brasília. Realizou o estágio doutoral na Facultat de Dret, Universitat de Valencia, Espanha. Membro da Secretaria Nacional do IPDMS – Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais. Leia outros textos.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Glauco Faria