Sem ordem judicial

PMs atiram contra indígenas no Mato Grosso do Sul, diz entidade, que teme novo massacre

Ação armada de PMs e pistoleiros teria sido encomendada por fazendeiros em resposta à retomada de território ancestral

Brasil de Fato | Lábrea (AM) |
"Todos os dias vivenciamos o genocídio indígena", declarou Eloy Terena - Ricardo Oliveira/AFP-CP

O cerco permanente contra indígenas promovido pelo agronegócio no Mato Grosso do Sul resultou em mais um episódio de violência, segundo a Aty Guasu, principal entidade representativa dos Guarani Kaiowá.

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Ela afirma que policiais militares e pistoleiros contratados por fazendeiros expulsaram indígenas que haviam acabado de promover uma retomada no território Guapoy, no município de Amambaí (MS).

Segundo relatos de indígenas, a ação ocorreu na madrugada desta sexta (24). Policiais dispararam balas de borracha e teriam deixado pelo menos seis indígenas feridos. Dois deles precisaram ser levados a um hospital em Campo Grande (MS), por causa da gravidade dos ferimentos. A Aty Guasu divulgou fotos de vítimas desacordadas e sangrando. Houve relatos de dois mortos, mas a informação não foi confirmada. Três policiais teriam ficado feridos, de acordo com a imprensa local. 

Pelas redes sociais, a Aty Guasu escreveu que os policiais não apresentaram ordem judicial de reintegração de posse e, por isso, consideram a ação ilegal. A organização também relatou que policiais teriam tentado impedir o atendimento de dois feridos em um hospital em Amambai (MS). Em nota, a entidade indígena pediu que “o direito à vida seja respeitado e que a demarcação [da terra indígena] seja realizada”. 

Medo de um novo massacre 

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), diz ter medo de que o conflito “evolua rapidamente” para um novo massacre contra os Guarani Kaiowá, como o de Caarapó (MS), em 2016. Na época, fazendeiros reagiram após indígenas retomarem a Fazenda Yvu. Cerca de 100 homens armados invadiram o território, mataram um indígena e feriram pelo menos outros seis. 

“O Cimi pede, com urgência, o envolvimento de órgãos federais, bem como do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), a fim de controlar a situação e investigar os episódios”, escreveu a entidade indigenista. A Polícia Federal (PF) afirmou que mandaria efetivo para o local. 

O Cimi aponta que a Terra Indígena (TI) Amambaí é a segunda mais populosa do Mato Grosso do Sul, com 10 mil indígenas. O território Guapoy, retomado na tarde de ontem (23), é considerado pelos Guarani Kaiowá uma terra ancestral que foi deixada de fora da demarcação da TI. Em uma publicação nas redes sociais, a Aty Guasu escreveu que o território foi “invadido e roubado pelos fazendeiros”.  

Na região marcada pela violência, a tensão aumentou após o assassinato de um indígena guarani de 18 anos no dia 21 de maio. Segundo o Cimi, Alex Lopes foi morto quando foi coletar lenha nos limites da TI Taquaperi, onde morava. Ele teria sido atingido por cinco tiros e teve o corpo levado para o outro lado da fronteira com o Paraguai, que fica a cerca de 10 quilômetros do local da morte. Até agora ninguém foi preso e o caso segue sem solução. 

Apib responsabiliza Tebet e "agrobanditismo"

Natural do Mato Grosso do Sul, o coordenador da Articulação dos Indígenas do Brasil (Apib), Eloy Terena, afirmou que, no estado, o “Estado de Direito fracassou”. “ A polícia militar, em regime de milícia privada dos fazendeiros, promove despejos sem ordem judicial. Já virou rotina. Um estado onde o Agrobanditismo impera a custo do sangue indígena”, publicou o advogado em seu perfil no Twitter. 

Terena responsabilizou ainda o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) e a senadora e pré-candidata à presidência da república Simone Tebet (MDB), cuja base política está no Mato Grosso do Sul.

“A polícia do estado do governador Azambuja e da senadora Simone Tebet está neste momento atacando os Guarani Kaiowá! Sob o argumento de cumprir a lei, estão atuando sem ordem judicial, afrontando decisão do STF”, publicou a liderança indígena. 

Edição: Rodrigo Durão Coelho