Nesta terça

Audiência do ministério da Saúde debate manual sobre aborto, rejeitado por especialistas

Criticado por médicos, documento foi produzido pela própria pasta e nega existência de interrupção legal da gravidez

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Produzido pelo Ministério da Saúde, documento ignora as previsões legais para a realização de aborto no Brasil - Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O Ministério da Saúde (MS) irá realizar, nesta terça-feira (28), uma audiência pública que vai discutir um dos assuntos mais polêmicos já encampados pela pasta: um manual que trata de aborto e discute, entre outras coisas, “aspectos ético-profissionais e jurídicos” ligados a casos do tipo.

Intitulado "Atenção técnica para prevenção, avaliação e conduta nos casos de abortamento", o documento afirma que não existe aborto legal no país. A informação é inverídica, pois contradiz o entendimento já firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de que a interrupção voluntária da gravidez deve ser autorizada em casos de bebês anencéfalos, gestantes que correm risco de vida e gravidez resultante de estupro.

O manual tem 70 páginas e foi produzido pelo secretário de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, Raphael Câmara, que é conhecido pelas posições antiaborto.

O documento já foi criticado por grupos feministas e pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), por exemplo. Em nota pública, esta última disse que o material tem "inúmeros equívocos e incoerências".

"Traz ainda considerações sobre os permissivos legais do aborto, tentando não somente desqualificá-los por meio da construção de narrativa jurídica equivocada, como também da criação de barreiras de acesso, seja por listagem de (poucas) comorbidades incompatíveis com a gravidez, seja por orientação de denúncia compulsória à autoridade policial de toda interrupção de gestação decorrente de estupro", afirmou a entidade.

A Febrasgo chamou atenção ainda para outro ponto: “Essas orientações criminalizam não somente as mulheres, mas também os profissionais de saúde que delas cuidam, entre eles os ginecologistas e obstetras”.

A entidade destacou que, no Brasil, há aborto legal e que o assunto precisa ser tratado como “questão de saúde pública”, bem como os diferentes documentos que versem sobre o tema devem contar com a participação das entidades científicas que reúnem profissionais da área de atenção à saúde.

Já o MS afirma que "o objetivo da publicação é apoiar gestores, profissionais e serviços de saúde nas abordagens de casos de abortamento, oferecendo acolhimento humanizado, atenção qualificada e efetiva às mulheres".

A audiência agendada pela pasta surge dias após o país assistir a diferentes casos de violência contra a mulher que ganharam o noticiário na última semana. Entre eles, tiveram destaque o da menina de 11 anos que engravidou depois de ser estuprada e teve o aborto ilegalmente negado por uma juíza em Santa Catarina.

Também veio à tona o caso de uma atriz de 21 anos que engravidou após sofrer abuso sexual, gestou a criança e a entregou para a adoção, sendo depois indevida e publicamente exposta pelo colunista Leo Dias, do portal Metrópoles, e por outros atores.

A audiência pública do ministério ocorrerá das 8 horas às 15 horas, com transmissão virtual pelo canal do MS no Youtube: https://www.youtube.com/minsaudebr.

 

 

 

 

Edição: Rodrigo Durão Coelho