Resistência

Do quilombo para periferia: SP receberá todo mês alimentos agroecológicos das roças quilombolas

A feira irá levar para zona leste da capital diversidade de frutas, legumes e verduras a preços acessíveis.

Ouça o áudio:

Rosana de Almeida, do Quilombo Nhunguara, coordenadora financeira da Cooperquivale, colhendo inhame em sua roça. - Manoela Meyer / ISA
A feira é uma forma de conectar a periferia com outro polo negro que são os quilombos

A partir deste mês, os moradores da periferia da capital paulista terão acesso a uma feira mensal de alimentos agroecológicos produzidos por quilombolas do Vale do Ribeira, região onde se concentra o maior número de quilombos do estado de São Paulo.

Mandioca, palmito, laranja, cará, arroz pilado, batata doce, banana, abóbora, alface são alguns dos alimentos produzidos nas roças de 16 comunidades quilombolas do Vale do Ribeira. A feira que vai acontecer sempre no primeiro sábado do mês na zona leste de São Paulo é uma iniciativa Quilombo Quebrada, uma parceria do Mulheres de Ori e Kitanda das Minas com a Cooperquivale, Cooperativa dos Agricultores Quilombolas do Vale do Ribeira.

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Adriana Rodrigues do Instituto Socioambiental é uma das idealizadoras do projeto junto com Priscila Novaes. Ela conta que a entidade identificou que era preciso ter uma via de escoar a produção que não fosse apenas por meio de políticas públicas alimentares. 

“Nós idealizamos o Quilombo Quebrada como uma estratégia capaz de conectar os alimentos quilombolas à população periférica de uma forma que esses alimentos fossem subsidiados e que chegassem à periferia com preços acessíveis”. 

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 A Cooperquivale que está distribuindo os alimentos existe há dez anos, com sede em Eldorado (SP), recebe apoio técnico do Instituto Socioambiental (ISA) e parceiros para organizar e escoar sua produção. O líder quilombola e sócio fundador da cooperativa Osvaldo Santos explica que a cooperativa nasce da necessidade de vender o excedente da produção e a diversidade depende da sazonalidade da produção que pode chegar a ter 80 tipos de alimentos. 

“Enquanto a política de governo demora a chegar, a gente tem que traçar novos caminhos com parceiros e com apoio para que a gente mantenha a natureza em pé, os costumes da comunidade. É isso que a gente faz no Vale do Ribeira e quer que o Brasil conheça e apoie. Inclusive hoje ela [cooperativa] chega até a periferia de São Paulo para ajudar na alimentação daquelas que realmente precisam de alimentos saudáveis que vem das roças quilombolas”. 


Barraca Quilombo Sapatu. VI feira de troca de sementes e mudas tradicionais das comunidades quilombolas do Vale do Ribeira, Eldorado, São Paulo / Deborah Mello / ISA

Ele conta que essa estratégia de comercialização de levar para a periferia os alimentos começou na pandemia. A cooperativa comercializava parte dos produtos para a merenda escolar por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), do Ministério da Educação. Porém com fechamento das escolas durante a pandemia, as prefeituras de São Paulo, Santos, Santo André e Cajati suspenderam os contratos com a cooperativa. 

Das roças quilombolas, saíram 332 toneladas de alimentos destinados às comunidades mais vulneráveis de São Paulo.  Cerca de 43 mil pessoas foram beneficiadas e 11 municípios atendidos. No total, R$ 1,5 milhão de renda gerada para a Cooperquivale. 

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Osvaldo é agricultor do Quilombo Porto Velho, ele conta que faz farinha de mandioca, rapadura e feijão e arroz. Ele explica que nos quilombos a prática da agroecologia é centenária.  “Com a prática da roça de coivara que a gente derruba o mato e queima e depois deixa a mata voltar a crescer e novamente no prazo de 10, 11 anos, ela volta ser derrubada para produção de alimentos. Essa é uma prática que vem de 500 anos de geração em geração dentro das comunidades quilombolas”, ressalta. 

A primeira feira aconteceu no dia 9 de julho, no Galpão ZL, da Fundação Tide Setúbal e da Sociedade Amigos do Jardim Lapena, em São Miguel Paulista, zona leste da capital paulista. 

Priscila Novaes da Kitanda das Minas e Mulheres de Ori diz que apesar da periodicidade ser um desafio a ideia é que futuramente as feiras aconteçam quinzenalmente e em outras periferias. Ela fala da importância dessas trocas dessas duas comunidades negras.

“É importante que a feira aconteça na periferia de São Paulo, porque a periferia é composta em sua maioria por pessoas negras e é uma forma de se conectar com outro polo negro que são os quilombos. A periferia e os quilombos têm muito em comum, e muitas trocas a fazer. Além disso, a periferia não tem acesso a alimento orgânico, então a [feira] é uma forma da periferia ter alimentação de qualidade, consumir orgânicos, com valor acessível, que caiba dentro do orçamento familiar”. 

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Foi lançado também o minidocumentário que mostra essa troca entre as comunidades no “Do Quilombo pra Favela - Alimento para a resistência negra”, produzido pelo ISA em parceria com a Cooperquivale e as associações quilombolas do Vale do Ribeira. 

Assista:


A próxima feira do Quilombo Quebrada acontece em 13 de agosto.

Edição: Daniel Lamir