Eleições 2022

Debate sobre agenda ambiental é desafio das candidaturas no Ceará

Apesar dos muitos conflitos ambientais que afetam o estado, poucos trazem o tema em seus discursos e propostas

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
Na Chapada do Apodi, comunidades agroecológicas são atingidas pelos impactos da ampliação das atividades do agronegócio - Foto: Tatiana Fortes / SEDET

No Ceará, grandes questões ambientais afetam o estado. Em Caucaia, o Povo Anacé da Terra Tradicional luta pela demarcação do território e preservação do Lagamar do Cauípe. Em Aracati, mais precisamente no Quilombo do Cumbe, a comunidade luta contra os impactos causados pela extração de água no território, o avanço da carcinicultura e a chegada de parques eólicos, cada vez mais comuns no litoral leste do Ceará. Em Santa Quitéria, mais de 200 assentados temem a contaminação causada pelo projeto de mineração de urânio, para gerar energia nuclear, e de fosfato, para fertilizantes.

"Esse projeto vai contaminar o lençol freático e a água vai acabar para a comunidade. Nós tivemos um bom inverno e mesmo assim, o açude Edson Queiroz que abastece Santa Quitéria só tem 48% da capacidade. Nós tivemos seis anos de seca e se tiver de novo? Como vai ter água para eles e para nós?", disse preocupada a Agente Comunitária de Saúde Rejane Mateus, porta voz dos assentados de Queimadas, localizada a 6 km da jazida.

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Na Chapada do Apodi, comunidades agroecológicas são atingidas pelos impactos da ampliação das atividades do agronegócio na região que está ocasionando a morte das abelhas e afetando a produção de mel.

"É preocupante que o projeto de desenvolvimento defendido para o campo continue sendo um modelo que agrava as históricas desigualdades sociais, ao passo que produz mais pobreza e concentração de terra, de água e de renda. O que devemos defender são políticas de promoção da agroecologia, da produção camponesa, da convivência com o semiárido, da conservação da biodiversidade, da economia popular solidária, dentre outras práticas que contribuam efetivamente com a melhoria das condições de vida da nossa população", analisa o geógrafo e professor da UFRN, Leandro Cavalcante.

Nas campanhas eleitorais é raro encontrar candidaturas ao Legislativo que levantem as pautas de clima e meio ambiente. Entre tantas bandeiras e candidaturas, é desafiador se destacar em 46 dias de campanha, contando que a corrida aos poderes começou na última terça-feira (16).

O militante ambientalista, advogado e professor João Alfredo Melo (Psol), já foi vereador de Fortaleza, deputado estadual e federal pelo Ceará, além de presidir a Comissão de Direito Ambiental da OAB. Durante toda sua carreira política, seus mandatos contemplaram os direitos humanos, agrários e ambientais. Assim, ele segue nesse pleito, tentando uma vaga para a Câmara Federal.

"Nós devemos sempre nos posicionar ao lado dos movimentos sociais e ambientais, dos povos originários e das populações das águas e do campo para tensionar o governo atual. O governo do PT é um governo com instâncias de negociações. Eu espero um revogaço do próximo governo, dessas medidas, decretos e portarias em desfavor das questões ambientais no Brasil", defende João Alfredo.

Ele também milita pela aplicação da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho que dispõe sobre a consulta prévia e bem-informada aos povos indígenas e tribais sobre qualquer medida administrativa, ou legislativa que os afete diretamente.

Outro nome que ganhou destaque com pautas ambientalistas foi o vereador de Fortaleza Gabriel Aguiar, mais conhecido como Gabriel Biologia (Psol). O Biólogo, com mestrado em Ecologia e Recursos Naturais, atua há 12 anos na luta pela conservação do meio ambiente em Fortaleza, fazendo parte e coordenando as principais mobilizações ambientais da cidade. Em 2020, ele foi um dos candidatos mais votados para a Câmara Municipal de Fortaleza, com quase 10 mil votos. Nas eleições deste ano é candidato a Deputado Federal, com o objetivo de ampliar o debate do ambientalismo popular.

"Considero esse tema como a coluna vertebral das nossas propostas e ações no dia a dia. Precisamos entender que cada impacto negativo na natureza, retorna para a gente. Temos que juntar os anseios da classe trabalhadora com a luta necessária para salvar o planeta. Existe uma emergência climática batendo na porta e um cenário catastrófico na nossa frente e precisamos agir para ontem", ressalta Gabriel.

Pelo Partido dos Trabalhadores (PT), o Deputado Estadual Acrísio Sena é candidato a deputado federal e tem o desafio de mostrar suas propostas na pauta do meio ambiente. Ele é o atual presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento do Semiárido da Assembleia Legislativa e já presidiu a Comissão de Meio Ambiente e Transporte da Câmara.

Já o PDT apresenta o candidato à reeleição para Deputado Estadual Romeu Aldigueri, advogado, especialista em Direito Ambiental, ex-superintendente da Semace e antigo dirigente de outros órgãos ambientais e o também candidato à reeleição, deputado estadual Guilherme Landim, como nomes que atuam na construção de uma agenda socioambiental no Ceará.

Contexto internacional

A pandemia causada pelo coronavírus (SARS-CoV-2), mostrou de forma árdua, que conservação da biodiversidade e a saúde pública são indissociáveis e que negligenciar os temas têm grandes consequências sociais e econômicas para o planeta. No mundo inteiro, cientistas defendem o conceito One Health (Saúde Única) para buscar respostas aos problemas da sociedade e do meio ambiente, especialmente após a Covid-19. O conceito se baseia em uma abordagem interdisciplinar para alcançar melhores índices de saúde, reconhecendo a conexão entre pessoas, animais, plantas e seu ambiente compartilhado.

Pesquisador da Fiocruz Ceará e especialista no tema, José Luiz Cordeiro explica que a flexibilização das leis ambientais brasileiras, o desmantelamento das instituições ambientais, o descaso com as evidências científicas e os ataques às organizações conservacionistas representam um grande retrocesso nas políticas socioambientais, colocando milhões de pessoas em risco.

"A COVID-19 é um argumento irrefutável da necessidade de integrar conservação da biodiversidade, inclusão social e resiliência econômica por meio de cadeias socioprodutivas inovadoras e sustentáveis. A ciência e a justiça social precisam ser aplicadas como instrumentos para a transformação da formulação de políticas ambientais e de saúde", destaca o pesquisador.

Fonte: BdF Ceará

Edição: Camila Garcia