Missão complicada

Sakamoto: debate complica tarefa de Michelle de convencer que Jair gosta das mulheres

Presidente tem longo histórico de desrespeito machista e misógino

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Soraya Thronicke: "Tchutchuca com os homens. Tigrão com as mulheres'" - Reprodução

A primeira-dama Michelle Bolsonaro, que foi escalada pela campanha do marido para convencer as eleitoras de que ele "gosta das mulheres", terá que trabalhar dobrado após o comportamento do presidente no debate, deste domingo (28), realizado pelo UOL, Folha de S.Paulo, Band e TV Cultura.

Foi da senadora Soraya Thronicke o mais enfático resumo dos ataques machistas de Jair Bolsonaro tanto à jornalista Vera Magalhães quanto à senadora Simone Tebet. Para ela, o presidente é "tchutchuca com outros homens, mas vem para cima da gente sendo tigrão".

Instado por Vera a comentar uma resposta de Ciro Gomes sobre a cobertura vacinal contra a covid-19, Bolsonaro disse que a jornalista dorme pensando nele e tem por ele alguma paixão escondida. Afirmou ainda que ela é uma vergonha para o jornalismo.

Tebet aproveitou o destempero violento do presidente para expor a sua conhecida misoginia, questionando por que ele sente tanta raiva das mulheres. Citou que ele já defendeu um assassino de mulheres, votou contra a proposta de emenda à Constituição que garantiu direitos às empregadas domésticas e ameaça frequentemente jornalistas mulheres. Sim, elas são seu alvo preferencial para ataques à liberdade de imprensa desde 2019.

Como resposta, o presidente também disse que a candidata era uma vergonha no Senado Federal e ecoou um dos seus antigos bordões machistas ("chega de vitimismo"), alegando que mulheres são defendidas só porque são mulheres.

Apesar de ter tentado consertar o que havia feito mais de uma vez depois disso, sua misoginia foi um dos assuntos mais falados nas redes sociais durante o debate. Certamente, a primeira-dama sentiu parte do trabalho que vem fazendo virar pó cada vez que Bolsonaro agiu como se estivesse no cercadinho do Palácio do Alvorada falando ao seu rebanho.

Após um período inicial de relutância, ela entrou de cabeça na campanha eleitoral não apenas para ajudar a ampliar o voto evangélico mas, principalmente, suavizar a figura bruta do marido a fim de atrair o voto feminino.

Há uma parcela das mulheres que reprova Bolsonaro por seu comportamento historicamente misógino e violento. Quando parlamentar, ele afirmou, por exemplo, à deputada federal Maria do Rosário que ela não "merecia" ser estuprada por ele. Também disse que teve uma filha mulher porque deu uma "fraquejada".

Sua política de liberação de armas tem efeito negativo junto ao público feminino, apesar de conseguir bons resultados junto a homens inseguros. E seu negacionismo na pandemia de covid-19, que ajudou o país a passar de 680 mil mortes, também é repudiado mais por mulheres do que homens.

Os impactos da crise econômica se fazem sentir mais entre as mulheres (principalmente as negras) do que entre os homens, de acordo com a Síntese dos Indicadores Sociais do IBGE. Não apenas porque elas foram atingidas em cheio pelo desemprego e pela queda de renda, mas também porque muitas delas são as responsáveis pelo bem-estar de suas famílias.

'Falam que ele não gosta de mulheres'

No evento de oficialização da candidatura do marido, no dia 24 de julho, a primeira-dama afirmou: "Falam que ele não gosta de mulheres. E ele foi o presidente da história que mais sancionou leis para mulheres, para a proteção das mulheres".

A última pesquisa Datafolha apontou 18 pontos de vantagem de Lula sobre Bolsonaro entre as mulheres (e 11 juntos aos homens) e a última Genial/Quaest mostrou que a diferença é de 16 pontos a favor do petista (e seis entre os homens). Em 4 de fevereiro, Bolsonaro ironizou essa rejeição, afirmando que "segundo pesquisa, as mulheres não votam em mim".

Votam sim, mas reações como a deste domingo devem fazer com que sua rejeição junto às mulheres, que vinha conhecendo uma queda, volte a crescer.

Contudentes, Simone Tebet e Ciro Gomes foram melhores que os demais candidatos, criticando a gestão de Lula, mas, principalmente, a de Jair Bolsonaro. Se transformarem essa percepção em votos, isso pode aumentar a chance de segundo turno. Lula, que estava mais apagado em comparação à entrevista que deu ao Jornal Nacional, jogou pelo empate e fez sinalizações aos candidatos do MDB e do PDT.

Já Bolsonaro investiu no antipetismo, foi cobrado sobre a fome, demonstrou raiva e falou para o seu público. Pela avaliação dos institutos de pesquisa que acompanharam o debate, não ganhou votos, apenas consolidou os que já tinha.