Discurso calculado

Tom de Bolsonaro no 7 de setembro deve ser definido por resultados das pesquisas eleitorais

Especialista em eleições afirma, no entanto, que discurso mais contido não deve ser adotado pela base fiel do presidente

Bolsonarismo usa bicentenário da Independência para inflamar sua base - Evaristo Sa / AFP
Se as pautas que não são do presidente são demonizadas, seus guardas da esquina podem agir por si

Os elementos do discurso de Jair Bolsonaro (PL) no 7 de setembro devem levar em consideração os resultados das mais recentes pesquisas eleitorais, na opinião da cientista política Mara Telles.

Ela participou da segunda edição da nova temporada do podcast Três por Quatro, produzido pelo Brasil de Fato. O episódio analisa projeções para o tom das ruas no bicentenário da Independência do Brasil.

"Se a pesquisa for avaliada como positiva para ele, é possível que ele baixe um pouco o grau de radicalização e não vá para o tudo ou nada. Se ele esperava um melhor resultado, ele pode radicalizar, que é uma das características do presidente", avalia Telles, que atua na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e é presidenta da Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais (Abrapel).

Fortemente influenciada pelas eleições, a efeméride vem sendo tratada por bolsonaristas como uma oportunidade de demonstração de força nas ruas.

Não é a primeira vez que a data é usada pelo presidente da república e candidato a reeleição. No ano passado, Bolsonaro participou de atos em Brasília e São Paulo, onde atacou o Supremo Tribunal Federal (STF) e disse que as eleições são uma farsa. "Só saio (da presidência) preso, morto ou com vitória", gritou Bolsonaro na ocasião, do alto de um carro de som.

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Para Mara Telles, o tom golpista pode até mudar este ano. Mas na base fiel de Bolsonaro, a violência e a radicalização não devem perder espaço. A professora lembra que o núcleo duro de apoio ao presidente está "apto a praticar qualquer ato em nome daquilo que eles consideram um enviado de deus".

Ela cita como exemplo a morte do guarda civil, Marcelo Arruda, assassinado em julho pelo bolsonarista  Jorge José da Rocha Guaranho, policial federal penitenciário. Arruda comemorava 50 anos em uma festa de aniversário com temática petista. "Considero quase como um ato de terrorismo", diz Mara Telles.

"Se nós estamos em uma luta do bem contra o mal e se qualquer adversário é tratado como demônio. Se as pautas que não sejam as pautas do presidente são demonizadas, os seus guardas da esquina podem agir por si. Mesmo que ele tenha um discurso, que não é mais moderado, é menos radical. O tom nas mídias ocultas é um tom bastante radicalizado."

Esquerda nas ruas

João Pedro Stédile, liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e comentarista fixo do Três por Quatro, pediu que a esquerda vá às ruas no centenário da Independência.

"Eu acho que os movimentos populares devem fazer um esforço, essa é a orientação que temos debatido em plenárias, para que não entreguemos a bandeira do Brasil e nem o 7 de setembro para a direita, para os fanáticos."

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Para Stédille, mesmo que as manifestações de defesa da democracia tenham números modestos de participantes, é preciso usar a efeméride para uma reflexão.

"A nossa pegada será ampliar o número de municípios e usar a data para um momento de reflexão. É ridículo, conquistamos há 200 anos a nossa independência e não dá nem para comemorar, esse governo está roubando nossa soberania."

A nova temporada do podcast Três por Quatro analisa as eleições de 2022. A atração é apresentada por Nara Lacerda e Igor Carvalho e criada e dirigida por Rodrigo Gomes e Camila Salmazio. Episódios inéditos são lançados toda sexta-feira pela manhã. Clique aqui para acessar o primeiro episódio desta temporada.

Edição: Nicolau Soares