Contingenciamento

Bloqueio de Bolsonaro nas federais impactará mais pobres, alimentação e empregos terceirizados

Orçamentos haviam caído pela metade desde Temer e novo corte pode inviabilizar instituições

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Contingenciamento do Ministério da Educação é superior a R$ 1 bilhão - Marcelo Camargo /Agência Brasil

O contingenciamento (bloqueio temporário até que o governo decida se o corte será ou não definitivo) de verbas para as universidades federais vai causar impactos em todas as instituições do Brasil e pode inviabilizar o funcionamento de muitas delas. Em coletiva de imprensa concedida nesta quinta-feira (6), o presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Ricardo Fonseca, alertou que a situação é “preocupante e dramática”.

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Segundo ele, mesmo antes do anúncio do bloqueio, já havia instituições que enfrentavam a possibilidade de colapso financeiro, devido a cortes e queda no orçamento destinado pelo governo federal ao longo dos últimos anos. O contingenciamento imposto agora pelo governo de Jair Bolsonaro acentua as dificuldades, que podem se generalizar.

“O que posso dizer agora com convicção é que, depois desse contingenciamento, as consequências vão ser gerais para todo o sistema. Uma série de projetos importantes e estratégicos podem ser afetados. Um exemplo, existe um conjunto de universidades que estão desenvolvendo a vacina contra a covid-19. Evidentemente que, com a inviabilização orçamentária, é difícil imaginar que esse projetos não serão afetados.”

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O contingenciamento pode causar impactos também nos programas destinados a estudantes de baixa renda e nos projetos de extensão, que reúnem ações que beneficiam diretamente as comunidades externas às universidades. Os riscos mais imediatos passam por mudanças nas políticas dos restaurantes universitários, nas aulas em campo e na contratação de terceirizados, por exemplo. 

“Despesas de luz, água, manutenção, contratos de limpeza e vigilância e assim por diante. Isso traz um iminente risco de deixar muitas pessoas vulneráveis, sobretudo para estudantes de baixa renda, eventualmente sem algum auxílio. Traz um perigo iminente de que muitos trabalhadores terceirizados - em um momento em que o desemprego é alto e que existe uma carência econômica muito grande - possaM, efetivamente, perder seus empregos. Porque os gestores não terão onde cortar se não em vários dos contratos terceirizados.”

Na conversa com os jornalistas, Fonseca ressaltou que o orçamento das universidades federais caiu pela metade entre 2016 e 2020. A verba para 2022, aprovada no final do ano passado, era superior à aplicada no ano anterior, que sofreu as consequências da pandemia do coronavírus. No entanto, ficou abaixo do que era praticado antes da emergência sanitária e  sofreu cortes de mais de 7% no primeiro semestre. 

Entidades reagem

A notícia causou repercussão entre organizações de defesa da educação. A União Nacional dos Estudantes (UNE) convocou uma série de mobilizações para os próximos dias nas universidades e marcou manifestação nacional para o próximo dia 18.

“O governo Bolsonaro confiscou o orçamento do Ministério da Educação, fazendo com que milhares de universidades e institutos federais pelo Brasil corram o risco de fechar as portas. Não podemos aceitar mais esse ataque ao nosso futuro”, afirma publicação nas redes sociais da UNE.

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Andressa Pellanda, coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação ressalta que as instituições já estão esgotadas por cortes e orçamento insuficiente nos últimos anos.

“No projeto de lei orçamentária de 2023, nós já temos também uma proposta reducionista dos recursos para a educação, muito aquém do piso mínimo emergencial. Isso tem causado retrocessos graves no direito à educação no Brasil e essa notícia de mais confiscos, depois de uma série de outros cortes para as universidades e institutos federais, tem gerado um processo de redução tão drástica dos recursos, que sequer elas poderão sobreviver até o final de 2022. Depois de termos tido filas do osso, como disse a Andifes, o governo corta o osso da própria educação”, declarou ela ao Brasil de Fato.

As entidades que compõem a Iniciativa para a Ciência no Parlamento (ICTP.Br), entre elas a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), também demonstram preocupação com o contingenciamento. 

A medida foi classificada pela organização como mais uma ação do governo federal “que segue na linha da destruição das instituições produtoras do conhecimento brasileiro e desenvolvimento científico e tecnológico.”

O outro lado

O ministro da Educação, Victor Godoy Veiga, afirmou em entrevista coletiva que o contingenciamento tem data para acabar e que os valores serão liberados em dezembro. Mas para a Andifes não há garantias de que o processo vai ser revertido e a decisão chega em um momento que pode prejudicar o fechamento das contas anuais das e paralisar serviços já contratados.

Godoy Veiga acusou universidades de fazerem uso político do assunto e negou que exista risco de paralisação de atividades, "Lamento ver algumas instituições que têm utilizado isso de maneira política". 

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O presidente da Andifes rebateu as afirmações do ministro.

“Nós temos um respeito muito grande pelo ministro Victor Godoy. De longe, é o ministro que trata com o mais respeito, consideração e atenção os reitores dentro desse governo. Se ele está entendendo que política significa uma política de funcionamento das universidades e estabelecimento de uma política institucional, nesse sentido todos nós, por ofício, devemos fazer essa política. Nós devemos estar preocupados com o bom funcionamento das universidades. Essa política nós fazemos.  Se ele se refere à política partidária, respeitosamente, tenho que discordar. O timing desse decreto aconteceu entre o período eleitoral, mas isso não se deve às instituições. Nós estamos fazendo o que faríamos em qualquer período.”
 

Edição: Rodrigo Durão Coelho