Novo orçamento

Economista defende PEC da Transição, que exclui Bolsa Família do teto de gastos

Proposta é "fundamental para quem entende hoje a situação em que se encontra o Brasil", destaca Marilane Teixeira

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O vice-presidente eleito destacou que o objetivo do texto "é o cuidado com o social, combater a fome, erradicar a pobreza e atender às crianças" - Agência Câmara

O vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), entregou ontem (16) ao Senado a minuta da proposta de emenda à Constituição (PEC) para a transição de governo. O texto sugere que os valores a serem pagos pelo programa Bolsa Família fiquem de fora das amarras do "teto de gastos", sem referência a limite de prazo de validade para a medida.

"A PEC dá o princípio, que é o cuidado com as crianças e com as família em pobreza extrema, e a LOA (Lei Orçamentária Anual) vai decidir como fazer", disse Alckmin, em entrevista aos jornalistas após a entrega.

A proposta foi recebida pelo senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e pelo relator do Orçamento de 2023, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), no lugar do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que participa da conferência do clima da ONU, a COP27, no Egito. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não compareceu à reunião na presidência do Senado, mas recebeu Alckmin em seu gabinete após a entrega. O vice eleito destacou que o objetivo do texto "é o cuidado com o social, combater a fome, erradicar a pobreza e atender às crianças".

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O relator do orçamento também destacou a medida como uma "salvação nacional". Castro admitiu ainda que, embora, não queira "fazer terrorismo", se a PEC não for aprovada, não será possível fechar o orçamento, segundo o senador. Em meio à entrega, no entanto, o chamado mercado novamente reagiu, criticando o investimento além do teto. De acordo com as estimativas da equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), serão necessários R$ 175 bilhões para o programa social no ano que vem.

PEC dá segurança jurídica

Esse valor inclui R$ 157 bilhões para assegurar a continuidade do benefício mínimo de R$ 600. Além de R$ 18 bilhões para o pagamento da parcela adicional de R$ 150 por criança de até 6 anos. O montante é considerado necessário para cobrir o rombo de R$ 52 bilhões deixado pelo governo de Jair Bolsonaro (PL). Durante a campanha eleitoral, o presidente prometeu que as parcelas do Auxílio Brasil – que voltará a ser chamado de Bolsa Família – seriam mantidas em R$ 600.

Mas a proposta orçamentária enviada por ele estipulou o benefício no valor médio de RS 405, cerca de R$ 105 bilhões do orçamento. O texto de Bolsonaro ainda impôs cortes severos em outras áreas sociais, como habitação e o programa Farmácia Popular.

Por causa disso, a economista Marilane Teixeira, professora e pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit), do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), destacou que a PEC "é absolutamente necessária. Uma medida correta, porque dá mais segurança jurídica". Em entrevista ao Jornal Brasil Atual, ela lembrou que a PEC da Transição é "fundamental para quem entende hoje a situação do Brasil".

Teto de gastos

De acordo com a economista, há condições para sua aprovação tanto no Senado, onde ela começa a tramitar, quanto na Câmara ainda neste ano. "Nós voltamos ao Mapa da Fome, a um grau de vulnerabilidade e instabilidade social tremenda, com um percentual de pobreza e extrema pobreza crescente, e a ampliação desse valor de forma permanente para R$ 600 é de uma necessidade e urgência muito grandes. Ela sem dúvida nenhuma deve se inserir entre as primeiras medidas adotadas pelo novo governo, assim como a valorização do salário mínimo", ressaltou Marilane.

Apesar da reação do mercado, a economista também defende a desvinculação do Bolsa Família do teto de gastos. Ainda não se sabe por quanto tempo o programa ficará de fora. A perspectiva do governo de Lula é que isso se torne definitivo. Mas setores do Congresso defendem que a exclusão valha por apenas um ano ou pelos próximos quatro anos.

O teto de gastos foi aprovado no final de 2016 pelo então governo Michel Temer (MDB). Na prática, a medida limita o crescimento das despesas do governo à correção da inflação. E, com isso, desde 2017, todas as políticas sociais foram corrigidas unicamente pela inflação. Sem previsão ou possibilidade de acrescentar algum valor adicional mesmo com o crescimento da economia. Marilane comenta que a previsão de crescimento da economia para o próximo ano é de pelo menos 2,5%.

Orçamento para universidades

Se mantida a regra do teto, esse percentual continuará a ser canalizado para apenas o pagamento de amortização, refinanciamento e juros da dívida pública. "Para o próximo ano a previsão é transferir R$ 2 trilhões. Comparando com o que está sendo previsto para o pagamento do Bolsa Família, com a aprovação da emenda de R$ 175 bilhões, só o pagamento com juros é 10 vezes mais do que seria direcionado para o programa Bolsa Família", contesta.

Ela também avalia como fundamental a inclusão de outros dois pontos na PEC da Transição, como o que tira do teto e da meta de 2023 o valor equivalente à arrecadação que exceder as receitas correntes do exercício anterior e que também desvincula do teto de gastos as despesas das universidades federais custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios. Esses itens, diz a economista, são importantes para a construção de um novo orçamento no governo Lula.

Se aprovada a PEC da transição, o orçamento do próximo ano terá ainda um montante de R$ 105 bilhões, que estavam originalmente destinados ao Auxílio Brasil, para investir em outras áreas sociais, como bancar o aumento real do salário mínimo. A equipe de Lula quer sugerir uma nova remuneração mínima perto de R$ 1.320, o que teria um custo adicional de R$ 6,8 bilhões.

Com informações da Folha de S. Paulo