Coluna

O centrão engravatado, o centrão armado e o idiota útil

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Manifestantes vestidos de amarelo não passam de meras moedas de troca - TERCIO TEIXEIRA / AFP
No centrão engravatado a coisa vai aos destrambelhos; no centrão armado a coisa não é diferente

Nossos valorosos militares não são muito diferentes do famoso "centrão", famintos por verbas públicas e cargos. Não perdem a oportunidade de uma boa mamata custeada pelos contribuintes (no caso, eu e você) e depois de patrocinarem todo o extremismo dos últimos quatro anos, agora veem o mesmo extremismo lhe morder os calcanhares.

O Partido Liberal (PL) correu para plantar notas na imprensa dizendo estar incomodado com os bolsonaristas do partido. É o mesmo PL de Valdemar da Costa Neto que, na semana passada, disse que só iria reconhecer o resultado das urnas após o relatório dos militares. O mesmo PL que se ajoelhou a Jair Bolsonaro e contratou o insuspeito (contém ironia) Instituto Voto Legal para produzir um relatório pitoresco que visava contestar o processo eleitoral. A loucura vazou para a imprensa e o partido correu para colocar panos quentes na história.

O relatório era tão exótico que sugeria que votos da região Nordeste (onde Lula obteve ampla vantagem) fossem invalidados. É óbvio que o PL iria se desvencilhar da loucura, caso o contrário teria que estar disposto a abrir mão dos 53 (1 senador, 23 deputados federais e 29 deputados estaduais) políticos eleitos na região!

E se no centrão engravatado a coisa vai aos destrambelhos, no centrão armado a coisa não era muito diferente. Os militares começaram o mês com pompa e cinismo, alardeando um suposto relatório em dizia não conseguir provar a lisura do pleito, mas também não poderia provar que houve fraude. Insatisfeitos, lançaram uma segunda nota para alvoroçar os delinquentes amontoados e sofreram com um implacável karma.

Na semana seguinte, a marinha brasileira se provou incapaz de parar um navio à deriva e impedir que ele batesse na ponte Rio-Niterói. E o fracasso não parou por aí. O exército deixou 60 toneladas de munições serem desviadas por uma dupla no Maranhão. Tudo por conta de uma falha no sistema do próprio exército que, pelo visto, não foi auditado. 

A cereja do bolo veio do Tribunal de Contas da União (TCU). Uma auditoria do tribunal descobriu que quase 80 mil militares receberam Auxílio Emergencial indevidamente. E esse é apenas o começo, imagina quando os sigilos forem levantados.

E no meio de tantas trapalhadas (que colocam em risco a vida de milhares de brasileiros), depois de insuflarem os arruaceiros nas portas dos quartéis, agora os fardados são acusados pelo mesmo bando criminoso que culpam generais por impedir um golpe. Em textos que circulam entre os delinquentes antidemocráticos, a mais recente teoria seria de que um grupo seleto de generais do Alto-comando seriam "generais-melancia" (verdes por fora e vermelho por dentro) por defenderem que Lula, o presidente eleito, tome posse.

Os generais ficaram irritados com as publicações que, grosso modo, dizem que eles seriam legalistas. Acusados de defender a legalidade, os militares agora estariam buscando maneiras de DESMENTIR essas alegações. Além disso, os militares passaram a distribuir informes internos para a tropa justamente negar qualquer envolvimento político com esses movimentos e que estão empenhados em seu dever constitucional.

Acho que a história acima não deixa dúvidas do irrisório compromisso que os fardados possuem com a República, mas se ainda restam dúvidas, o motivo desses informes é muito mais decadente. Já existem relatos de militares participando e endossando essas manifestações absurdas. O que é proibido segundo o regramento militar. E é aí que o clima golpista começa a morder os calcanhares dos fardados.

O clima atual estimula a quebra de hierarquia e baderna na caserna! Se deixarem a tropa solta demais, quanto tempo demorará para algum "aventureiro" se achar herói e começar a promover a desordem? Principalmente depois do flagrante processo de politização a que foram submetidos nos últimos anos sob a condução do general Eduardo Villas Bôas.

Se os militares estivessem realmente preocupados com a República, teriam removido os vagabundos que pedem golpe de suas portas e prendido os militares que participam isso. Até o momento nenhum dos dois foi feito.

Acho que aqui fica claro que tanto para o centrão engravatado quanto para o centrão armado, é lucrativo manter os malucos e extremistas por perto, mas que isso não vem livre de ônus.

A verdade é uma só, enquanto país e mães levam crianças para acampamentos insalubres para cometerem crimes e empresários tresloucados torram rios de dinheiro insuflando valentões e criminosos nas ruas do país, há quem com essas pessoas se beneficiem sem o endosso delas. É a definição perfeita do termo "idiota útil". Um termo depreciativo para uma pessoa percebida como propagandista duma causa sem compreender completamente os objetivos da causa, e que é cinicamente usado pelos líderes da causa.

O PL não deve demorar muito para entrar na base do governo, os militares não querem perder as mamatas que conquistaram nos anos do governo Bolsonaro e o futuro ex-presidente sonha em não ser encontrado dentro do baú de uma cama box. E assim como as moedas de 10 centavos, os manifestantes vestidos de amarelo não passam de meras moedas de troca.

Enquanto eles se agarram nas grades dos quartéis, a transição segue e o novo governo começa a se formar. Dia 19 de dezembro, Lula e Alckmin serão diplomados e em janeiro tomarão posse e alguns dos agitadores de hoje ou estarão fora do país ou pagando pelos seus crimes contra a República.

*Cleber Lourenço é observador e defensor da política, do Estado Democrático de Direito e da Constituição. Tem passagens pela Revista Fórum e Congresso em Foco. Twitter e Instagram: @ocolunista_

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Thalita Pires