Política na Copa

EUA e Irã disputam vaga na Copa do Mundo em jogo com pesada carga política

Países rivais na política internacional disputam dentro de campo quem se classifica para a próxima fase

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Torcedora do Irã na arquibancada da Copa - Fadel Senna / AFP

Há muito mais entre Estados Unidos e Irã do que o futuro do Grupo B na Copa do Mundo. A disputa entre os dois países não se resume ao campo de futebol, mas é uma das mais tensas do cenário geopolítico mundial. Nessa disputa extracampo, entram em partida elementos como a hegemonia global, petróleo e os recentes protestos que são registrados no Irã.

Os dois países ocupam blocos geopolíticos opostos na arena internacional. Enquanto Teerã se alia com a China e a Rússia para enfrentar as sanções da Casa Branca contra sua economia, os Estados Unidos fazem uma pesada marcação para tentar frear o avanço tecnológico da China, paralisar o programa nuclear do Irã, além de que fornecem armas para a contraofensiva da Ucrânia em sua guerra contra a Rússia.

O Irã é alvo da cobiça internacional desde o século 20 por dois elementos: sua importância como produtor de petróleo e sua proximidade com o Estreito de Ormuz, ressalta o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Reginaldo Nasser. O Estreito de Ormuz é um pequeno pedaço de oceano entre o Golfo Pérsico e o Golfo de Omã que concentra um intenso trânsito de navios carregando petróleo e gás natural.

Nasser relembra que existem historiadores que apontam para a disputa política no Oriente Médio para explicar o surgimento da Guerra Fria, a disputa política e econômica entre Estados Unidos e União Soviética que definiu boa parte do Século 20.

"Já no limiar da Segunda Guerra Mundial, começou uma disputa de influência na região com a presença soviética e já aparecendo os EUA, então a questão dos EUA com o Irã é a consequência, em primeiro lugar, de uma transição em toda a região do Oriente Médio, e ali, vamos chamar a Ásia Central, que é a saída do Império Britânico, vai sair de uma vez, vai ser um poder decrescente, e os EUA um poder ascendente", diz o professor da PUC-SP.

Protestos no Irã e bandeira errada dos EUA

A Federação de Futebol dos Estados Unidos (USSF, na sigla em inglês) publicou uma versão das bandeiras do Irã em suas redes sociais sem os emblemas da República Islâmica. O registro da bandeira apenas com as suas cores branco e vermelha foi posteriormente apagada.

Para a CNN, a USSF afirmou que a versão da bandeira do Irã foi um "gráfico usado uma vez" e que as publicações foram atualizadas. O Departamento de Estado dos EUA negou, em mensagem enviada à CNN, ter coordenado qualquer ação com a USSF.

“Esperamos uma partida tranquila e competitiva dentro de campo. Os Estados Unidos continuam a encontrar maneiras de apoiar o povo iraniano diante da violência patrocinada pelo Estado contra as mulheres e uma repressão brutal contra manifestantes pacíficos”, disse o Departamento de Estado à CNN.

Não confundir Estado, governo e sociedade

A vitória da Arábia Saudita contra a Argentina na Copa foi celebrada por dirigentes Houthis, do Iêmen, como uma vitória do "futebol árabe" informa a Al-Jazeera.

Mas a relação entre Houthis e sauditas não é pacífica: eles estão em guerra desde 2015. Na guerra civil no Iêmen, eles estão em lados opostos e a Arábia Saudita joga bombas contra o Iêmen, enquanto os Houthis lançam mísseis contra o território saudita. A Organização das Nações Unidos (ONU) classifica o Iêmen como uma "das maiores crises humanitárias do mundo"

Reginaldo Nasser usa esse exemplo para demonstrar que não podemos confundir Estado, governo e sociedade. Os Houthis torcem para o time da Arábia Saudita, não para o governo saudita.

"É preciso tomar cuidado e não confundir Estado, governo e sociedade. Distinguir isso bem. É claro que [para] quem dirige os governos é o inverso, as elites fazem o inverso, tentam mostrar que tudo isso é a mesma coisa, assim elas se salvam", avalia o professor da PUC-SP.

Para o jogo entre Estados Unidos e Irã, o pesquisador de relações internacionais prevê um "bom jogo" e uma vitória iraniana.

Edição: Rodrigo Durão Coelho