Rio Grande do Sul

FSM 2023

Marcha de abertura do Fórum Social Mundial 2023 traz ares de esperança para lutas sociais

Milhares de pessoas participaram da caminhada, nesta quarta-feira (25), no Centro Histórico de Porto Alegre

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Com o tema "Democracia, direitos dos povos e do planeta", FSM 2023 iniciou na segunda (23) e segue até sábado na capital gaúcha - Foto: Jorge Leão

Após 22 anos da realização do primeiro Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, a tradicional marcha do FSM voltou as ruas da Capital. A alegria estava estampada nos rostos. Na faixa de abertura, a diversidade do povo brasileiro: indígenas, quilombolas, ambientalistas, sindicalistas, agricultores familiares, parlamentares, artistas, trabalhadoras e trabalhadores. O som dos tambores de grupos de percussão como o Ziriguidum e Maracatu Truvão marcou os passos rumo ao novo Brasil que começa a ser construído.

O calor ainda era intenso quando as primeiras pessoas chegaram para a concentração no Largo Glênio Peres e no Paço Municipal, a partir das 17h. Mas a caminhada só começou a subir a Borges de Medeiros por volta das 19h. Com faixas, cartazes, bandeiras, camisetas ou bonés, as lutas de cada movimento presente eram expostas à população que passava pelas ruas ou aguardava o ônibus nas paradas.

Presente na marcha, a reportagem do Brasil de Fato RS conversou com alguns participantes sobre os motivos que os levaram até a caminhada e as perspectivas das lutas para os próximos anos. Confira:

Koawa Kapukaja Apurinã

Da etnia Apurinã, Koawa é do estado do Amazonas, do Médio Purus. É ativista, antropóloga e educadora. Participa desde o início do Fórum Social Mundial em Porto Alegre. Para ela, o Fórum representa a união das resistências, uma construção que reverbera em toda a sociedade brasileira.


Koawa Kapukaja Apurinã é do estado do Amazonas / Foto: Fabiana Reinholz

Ela recorda que toda a sociedade brasileira está chocada com a situação dos yanomamis. “A gente tá anos e anos denunciando essa situação, não tem que ter garimpo, nem legal nem ilegal, nas terras indígenas”, afirma.

Na sua avaliação, o Bolsonaro é responsável pela situação, bem como todas as pessoas que corroboraram com a morte do povo Yanomami e de outros povos indígenas no Brasil. “No próximo período espera-se justiça, que sejam punidas nos rigores da lei todas as pessoas que assassinaram os povos indígenas. Bolsonaro tem que ser denunciado no tribunal de Haia, julgado pelo crime de genocídio como foram julgados os nazistas da época da Segunda Guerra Mundial.”

Patrícia de Iaiá

Ialorixá e trabalhadora da saúde de Porto Alegre, Patrícia conta que está no Fórum Social Mundial porque sente que lutar é um ato coletivo. “Nós temos que estar juntos pra fazer a luta, pra ter um mundo melhor, não se silenciar, participar das lutas. A luta é coletiva e nós temos que pensar na maioria, que é chamada minoria, que é tão violada nesse país.”


Patrícia de Iaiá é ialorixá e trabalhadora da saúde de Porto Alegre / Foto: Fabiana Reinholz

Ela critica os quatro anos de governo Bolsonaro, “um governo genocida e totalmente marginal”. Lembra que o ex-presidente “causou milhares de mortes, queimadas, destruição, ele comprando agrotóxico, e foi provado que ele só usava produtos orgânicos”.

Segundo avalia, o silêncio é uma forma de ajudar o opressor, o colonizador, a se manter. “Eu espero que as pessoas não silenciem, não fiquem silenciadas”, diz, complementando que a população, “povo indígena, povo negro, trabalhador, pessoas em situação de rua”, deve estar junta por um mundo melhor.

Fernando Pigatto

Presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fernando comenta que não é a primeira vez que o Conselho está presente no Fórum Social Mundial. “Estivemos também nos Fóruns das Resistências. Conjuntamente com todas as demais organizações, entidades, movimentos da sociedade civil organizada, nós atravessamos esse período de enfrentamento ao fascismo. Então, com certeza, esse fórum se faz num novo ambiente e a gente renova as esperanças”, afirma.


Fernando Pigatto é presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS) / Foto: Fabiana Reinholz

Contudo, lembra que há de se seguir lutando, visto o que ocorreu no dia 8 de janeiro. “Tá sendo revelado agora o que a gente já vinha denunciando há muito tempo, e que está inclusive nos documentos do Conselho Nacional de Saúde, por exemplo, dos povos e do território Yanomami, e muitas outras questões que vão aparecer e a gente vai precisar ter força, unidade necessária pra reconstruir esse país.”

Para Fernando, é preciso fortalecer o Sistema Único de Saúde e garantir direitos e democracia no país. No governo Bolsonaro, segundo ele, as políticas públicas de saúde foram destruídas e as fake News levaram muita gente à morte. “Na semana passada, na Secretaria de Comunicação da Presidência da República, com o ministro Paulo Pimenta, fizemos uma parceria de enfrentamento e combate as fake News, porque na saúde as mentiras propagadas e que continuam agora mesmo, com quem estava lá no governo espalhando, continuam e geraram muitas mortes. Precisamos fazer com que o Brasil da verdade prevaleça salvando vidas”, defende.

Leonardo Rodrigues

Vice-presidente da Associação de Ciclo-entregadores do RS, Leonardo conta que hoje a categoria realizou a primeira atividade de paralisação e protesto em frente ao ponto do Ifood Pedal, em Porto Alegre. “Reunimos entregadores de bicicleta, de moto, entidades parceiras e marchamos em direção ao Largo Glênio Peres, aqui onde estão agora militantes e ativistas de várias tendências compondo o Fórum Social Mundial”, conta.


Leonardo Rodrigues é vice-presidente da Associação de Ciclo-entregadores do RS / Foto: Fabiana Reinholz

Para ele, o Fórum é um espaço de deliberação, onde trabalhadores podem colocar suas demandas de forma organizada, debater coletivamente, somar forças. “Hoje pela manhã fizemos fala no Fórum, tivemos reunião com o secretário de Economia Solidária, Gilberto Carvalho”, conta. Uma oportunidade de identificar pontos comuns entre a sua categoria e outras, como trabalhadores terceirizados, motoristas de aplicativo, “entre tantos outros que sofrem situações semelhantes de exploração e precarização”.

Também é a oportunidade de dar visibilidade à luta para conquistar as demandas da sua categoria, que listou: “o reajuste da tarifa conforme o aumento da inflação; o direito de resposta e defesa dos trabalhadores quando bloqueados pelas plataformas; redução dos planos, que hoje os ciclo-entregadores, entregadores de bicicleta, precisam pagar pra trabalhar; pagamento por parte de empresas de planos e previdência e seguros que funcionem, que sejam fiscalizados, que quando o trabalhador se acidenta, ele tenha facilidade pra acessar isso, não tenha dificuldade como tem sido hoje. Pra isso as empresas precisam colocar atendimento humanizado, chega de robô pra responder trabalhador”.

Leonardo avalia positivamente o novo governo. “Nacionalmente os trabalhadores têm observado que há uma disposição crescente, principalmente do Ministério do Trabalho, de chamar os trabalhadores a discutir o problema, a regulamentação. Foi muito importante os acenos que o governo têm feito de que estará do lado dos trabalhadores e não das plataformas, isso pra nós é uma vitória”, afirma.

Lurdes Marta Santinho

Integrante do Movimento das Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD), Lurdes é de Eldorado do Sul (RS). Ela conta que o movimento se organiza no Fórum desde a primeira edição. Nós acreditamos que o FSM é um espaço de debate, de trazer novas ideias, de organização pra transformação, porque nós acreditamos que um novo mundo é possível.”


Lurdes Marta Santinho é militante do Movimento das Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD) / Foto: Fabiana Reinholz

Contudo, alerta que só é possível “se a classe trabalhadora, se os movimentos sociais e as pessoas tiverem a consciência de que é possível construir esse novo mundo, ou esse mundo possível”. Ressalta que é por isso que o MTD está no Fórum.

Sua expectativa para o próximo período é de mudanças, de volta dos direitos do povo trabalhador. “O governo anterior foi nos saqueando em todos os direitos, inclusive no direito de sonhar, a juventude não tem mais perspectiva, não sonha mais. Nós esperamos que seja possível a gente renovar as esperanças, mas com a concretude que uma vida melhor com direitos propõe”, comenta.

Gabriel Argenton

Membro da União Estadual dos Estudantes na cadeira de movimentos sociais, Gabriel também afirma que participa do Fórum Social Mundial por considerar um espaço importante de articulação da esquerda. “É um espaço já tradicional de construção das lutas populares, e agora pra esse próximo governo ainda mais importante, porque é hora de nós botarmos mesmo o nosso bonde na rua e reivindicar as melhoras pra nossa vida como trabalhadores, com políticas públicas, e todas as mudanças que a gente precisa pra ter uma sociedade mais justa, mais igualitária”, afirma.


Gabriel Argenton é membro da União Estadual dos Estudantes / Foto: Fabiana Reinholz

O estudante conta que participou anteriormente do Fórum Social das Resistências, que acredita que cumpriu um espaço importante. Mas para ele a atual edição, com mais representações, mostra mais força e “dá mais ânimo pra entrar nesse governo novo, e a gente reivindicar as mudanças realmente estruturais”.

Para ele, a única forma de colocar a democracia em vigência, frente às tentativas de golpe, é organizando o povo. “Acho que o fórum vem muito nessa perspectiva, da participação popular e da gente estar construindo alternativas a partir dessa construção popular, pra estar pautando um governo realmente democrático e estabelecer de novo a democracia no nosso país”, finaliza.

Orlandino dos Santos

Orlandino dos Santos veio a Porto Alegre especialmente para participar do Fórum. Do Rio de Janeiro, ele ressaltou a importância da prevenção de acidentes nas escolas. “Em nosso país, através da presidente Dilma, foi sancionada a lei 12.645, que deu o Dia Nacional de Segurança e Saúde nas Escolas, comemorado no dia 10 de outubro, onde todas as escolas falam em prevenção de acidentes. Nós estamos querendo fazer com que o Brasil seja conhecido como o país onde a prevenção de acidentes comece nas escolas, e nesse Fórum Social eu vi uma maneira pela qual a gente possa divulgar que o nosso país se preocupa com isso”, afirma.


Orlandino dos Santos veio do Rio de Janeiro / Foto: Fabiana Reinholz

Conta que não é a primeira vez que ele veio ao Fórum, esteve também há oito anos. “É um momento festivo, a gente vê aqui a maioria do povo com alegria, com esperança. Quero parabenizar todos os organizadores desse fórum, em meu nome, em nome da minha família, em nome do povo do RJ, em nome do Xerém, onde eu moro.”

Na avaliação de Orlandino, o Brasil passa por um momento de esperança e o povo está voltando a sorrir. “Parece que nós estamos vivendo uma nova era agora, com o presidente Lula eleito, o mundo todo acha que ele é o melhor presidente do mundo todo, não é só nós brasileiros que falamos, agora o mundo todo tá ouvindo ele”, diz, dedicando a atual edição do Fórum à presidenta Dilma[...], esse fórum esse ano aqui em Porto Alegre eu dedico ele à senhora.

Célio Golin

Representando o coletivo LGBTQIA+ Nuances, Grupo Pela Livre Expressão Sexual, Célio Golin celebra o Fórum como um dos maiores eventos políticos que a esquerda organizou no Brasil nas últimas décadas. “Esse Fórum tem que sobreviver e tem que ser potencializado pro futuro, pra esquerda conseguir colocar todo o seu potencial, ocupar todos os espaços, pela representatividade, por tudo que significa a democracia participativa”, defende.


Célio Golin é militante do coletivo LGBTQIA+ Nuances / Foto: Fabiana Reinholz

Segundo ele, o FSM traz consigo a esperança de “enterrar o fascismo, que é difícil”, a partir do protagonismo político e da autonomia para colocar as ideias e o projeto político da esquerda. “Estado, neoliberalismo, economia, saúde, educação, as pautas LGBTQIA+, cultura são fundamentais, são superimportantes pra esse novo Brasil que surgiu, inclusive dentro do processo do fascismo”, avalia.

Sobre a pauta LGBT, ressalta que “desde 2016 do golpe contra a Dilma, ela vem sendo atacada e usada politicamente pra construir o pânico moral, ódio, discurso de ódio”. Para ele, “o governo fascista desse sociopata que passou com certeza usou muito, a extrema direita usou os setores religiosos, a Damares e companhia limitada, continuam usando, mas com certeza foi um ataque muito forte contra nossas pautas”.

Cacica Gãh Té

A cacica Gãh Té, também conhecida como Iracema, da etnia Kaingang, de Porto Alegre, conta que participa desde o começo do Fórum Social Mundial, “no tempo do Olívio Dutra, que também foi muito bom o nosso poder aqui, todo mundo participava, a sociedade”. Lembra que depois foram realizadas edições em outros países e também em outros estados brasileiros e defende que sua realização não pode terminar.


Cacica Gãh Té, também conhecida como Iracema, da etnia Kaingang / Foto: Fabiana Reinholz

Para ela, o governo Lula primeira vai ter que “limpar a casa”. “Está muito suja a nossa casa, que é com o nosso dinheiro que tá lá feita essa sujeira, o último governo deixou muito a desejar. Então o nosso presidente Lula vai fazer essa limpeza e o povo, nós brasileiros, temos que ajudar ele limpar, pra depois avançar juntos de mãos dadas.”

Gãh Té comentou sobre o caso do povo Yanomami, “que são meus parentes também”, atacado pelo governo Bolsonaro. “Fiquei triste, doeu meu coração quando eu vi aquilo, como que pode, por causa de uma mineradora que tá na terra, que não podia fazer aquilo, tem que dar valor à terra”, conta.

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Confira a cobertura fotográfica da marcha


Foto: Jorge Leão


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Foto: Jorge Leão


Marcha de Abertura do Fórum Social Mundial / Foto: Jorge Leão


Foto: Jorge Leão


Fórum Social Mundial / Foto: Jorge Leão


Foto: Jorge Leão


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Marcha de Abertura do Fórum Social Mundial / Foto: Jorge Leão


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Edição: Katia Marko