cultura popular

Carnaval em Olinda e Recife terá homenagem a grandes nomes da cultura pernambucana

As cidades homenagem artistas como Geraldo Azevedo, a Rainha Marivalda e Zé da Macuca, que faleceu em 2021

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Festa volta às ruas de Olinda e Recife após dois anos sem acontecer em decorrência da pandemia de covid-19. - Arquimedes Santos/ Prefeitura de Olinda

Todos os elementos que compõem o Carnaval pernambucano só existem e resistem porque diversas pessoas dedicam suas vidas para manter as tradições carnavalescas vivas. As fantasias coloridas, os ritmos e danças diversas, a alegria dos encontros e celebrações têm apoteose em fevereiro, mas são construídas no cotidiano durante o ano todo. 

Como forma de reconhecer a dedicação à cultura, o Carnaval de Olinda e Recife homenageia todos os anos grandes expoentes da cultura popular. Em 2023, Olinda homenageia o Maestro Oséas e Zé da Macuca (in memoriam), e Recife homenageia a passista de frevo Zenaide Bezerra, a Rainha do Maracatu Estrela Brilhante do Recife, Marivalda Maria dos Santos, e o cantor Geraldo Azevedo.

:: Tradição do carnaval de Olinda, os bonecos gigantes são, na verdade, do Sertão de Pernambuco ::

A votação em Olinda aconteceu através de uma urna eletrônica itinerante e pelo site oficial da Prefeitura de Olinda e contabilizou 41.088 mil votos, com 10 personalidades participando da disputa em duas categorias. O Maestro Oséas foi o campeão na categoria ‘Em vida’, arrematando 6.991 votos. Já na categoria ‘In Memoriam’, Zé da Macuca foi alvo do reconhecimento pelo público, conquistando 9.111 votos. No Recife, a escolha feita pela Prefeitura privilegiou expoentes do frevo e do maracatu.

Rainha Marivalda - “Eu sozinha não posso ser uma rainha” 

Rainha da Nação de Maracatu de Baque Virado Estrela Brilhante do Recife desde a década de 1990, Marivalda Maria dos Santos recebeu com alegria a homenagem no Carnaval 2023 do Recife. “Foi uma felicidade. Eu tive covid-19 e estou aqui viva para fazer outros e outros carnavais se Deus quiser e os orixás. Então estou muito feliz de a Prefeitura ter reconhecido meu trabalho. Eu e meu povo, porque eu sozinha não posso ser uma rainha. Tem muito trabalho para fazer”, compartilha Marivalda. 


Rainha Marivalda está a frente do Maracatu Nação Estrela Brilhante desde a década de 1990. / Iphan

O Maracatu Nação Estrela Brilhante foi fundado em 1906 e o título de rainha é uma tradição que remonta às coroações de reis e rainhas do Congo no século XIX. Para ser rainha, é preciso ser mulher negra e estar também ligada ao candomblé, já que o maracatu nação é vinculado às religiões de matriz afro-brasileira. A manifestação cultural é registrada como Patrimônio Cultural do Brasil desde 2014.

Há quase 30 anos, a casa da rainha Marivalda é a sede do Estrela Brilhante e um Ponto de Cultura. Manter a estrutura física e demais custos do maracatu é um dos desafios. “Eu vivo das apresentações. A prefeitura deu uma verba para despesas pequenas em dezembro do ano passado, mas já está acabando. Com as apresentações em congressos, eventos, a gente levanta recursos e investe. A sede é na minha casa e ela já está ficando pequena”, conta Marivalda.

O Carnaval sempre esteve presente na vida da rainha do maracatu, seja nos bastidores, costurando fantasias e fazendo adereços, ou na posição de destaque que assume atualmente. “Sempre gostei de Carnaval. Fui do Maracatu Elefante, depois do Leão Coroado. E estou até hoje aqui. Trabalho com amor, dedicação. Amo o que faço, eu e meu povo”, conclui. 

Leia mais: Conheça Dona Santa, a matriarca dos maracatus e dos terreiros que reinou no Recife

Zé da Macuca - “Uma vida integralmente dedicada ao ativismo cultural”

Foi durante a sua festa de 35 anos, em 1989, que o pernambucano José Oliveira Rocha, mais conhecido por Zé da Macuca, criou o Boi da Macuca, uma mistura de poesia, musicalidade, alegria e originalidade. Ativista cultural e admirador da cultura tradicional e popular pernambucana, Zé da Macuca também foi sinônimo de alegria para os que o conheceram e conviveram com ele. 

E foi também com alegria que Rudá Rocha, filho de Zé da Macuca, recebeu a homenagem ao seu pai. “É muito gratificante receber essa homenagem. É como uma coroação de uma vida integralmente dedicada ao ativismo cultural. Receber isso num carnaval democrático e popular como é o de Olinda é de uma felicidade rara para alguém que trabalha com cultura”, afirma.


Zé da Macuca deixa o legado da valorização da cultura popular nordestina. / Tom Cabral/Secult-PE/Fundarpe

O Boi da Macuca não fica restrito ao período de carnaval. Durante o ano, acontecem diversas ações que movimentam a cena cultural olindense. “O maior legado cultural de Zé da Macuca é a valorização da cultura popular nordestina. Esse é o grande ponto. E de intercambiar isso com culturas de vanguarda. No caso do Carnaval de Olinda especificamente é [o legado] justamente levar um pouco dessa cultura do interior, da zona rural do agreste pernambucano, para a terra do frevo e misturar a música de Luiz Gonzaga e Dominguinhos com o frevo”, explica o filho de Zé.

Para o Carnaval 2023, o Boi da Macuca planeja um momento especial, com explica Rudá: “Da sexta para o sábado de Carnaval, a gente vai sair pontualmente à meia noite, porque o dia 18 de fevereiro, que é o sábado, é o aniversário do meu pai e o aniversário do Boi. Então esse ano a gente vai fazer um cortejo especial para abrir o sábado de Zé Pereira”.

Zenaide Bezerra - “faço de tudo um pouco pra ir sobrevivendo. Invento coisa”

Zenaide Bezerra é considerada a mais antiga passista em atividade do Brasil. São pelo menos 65 anos dançando e ensinando frevo. Os primeiros passos foram dados com incentivo do seu pai, o renomado passista Egídio Bezerra. Para Zenaide, receber essa homenagem no Carnaval de Recife foi “uma surpresa muito grande. Aos 73 anos de idade, eu já não estava esperando muita coisa. Fiquei muito feliz”. 

Em 2022, Zenaide foi declarada Patrimônio Vivo do Recife como reconhecimento à sua  história dedicada a transmitir para as próximas gerações o legado do Carnaval e da cultura pernambucana. Da sua trajetória, Zenaide destaca o ofício de ensinar. “Danço desde os 8 anos. Já trabalhei no Estado dando aula. Trabalhei em Olinda. Dei aula na Casa da Cultura nos finais de semana. Toda a minha família dança, toca. Eu tenho 4 filhos e uma filha e todos participam do frevo. Passei muito tempo trabalhando com a comunidade”, compartilha


Seguindo o legado do pai, Zenaide Bezerra passou a tradição do frevo para a família e para a comunidade. / Arquivo pessoal

Na pandemia, o isolamento necessário fez com o que algumas integrantes do grupo se afastassem do cotidiano de ensaios. “Eu fiquei triste, porque as pessoas foram embora. Agora eu junto os filhos, netas e bisnetas para nos apresentarmos”. Aos poucos, o grupo vem se recompondo. 

Ao acionar a memória do início como passista, Zenaide conta: “Eu e meu pai começamos o Baile Municipal. Eu ia como passista junto com ele. Fico muito emocionada. Faço de tudo um pouco pra ir sobrevivendo. Invento coisa. Aprendi a dar aula com ele. Meu pai ia trazendo algumas pessoas aqui para casa e a gente ensinava os passos”.  

Maestro Oséas - "Para mim o frevo é tudo. É minha vida. Daí que eu criei minha família"

Oséas Leão de Souza, o Maestro Oséas, tocou os primeiros frevos aos 15 anos, na banda de Henrique Dias, a qual integra de forma permanente desde os 18 anos. O reconhecido trompetista agita grandes blocos carnavalescos de Olinda, a exemplo do Menino da Tarde, Elefante, Vassourinhas, João Travolta, Ceroula e Cariri. 

Há mais de 40 anos tem a sua própria orquestra, animando os foliões por onde passa. O maestro é conhecido por gostar de tocar frevos difíceis e já virou símbolo do Carnaval de Olinda. Ao receber a homenagem, o maestro afirma: "eu me sinto feliz. Eu mesmo não esperava não. Tanta gente bem mais conhecida por aí, mas me senti feliz em ser homenageado. Vi que o povo gosta de mim".


Maestro Oséas é conhecido por tocar frevos difíceis e animar os foliões em grandes blocos do Carnaval de Olinda. / Arquivo pessoal

Quando perguntado sobre o que significa o carnaval para ele, Oséas é categórico: "Eu comecei a tocar frevo com 15 anos. Para mim o frevo é tudo. É minha vida. Daí que eu criei minha família". Para a festa desse ano, o maestro não espera menos do que ladeiras lotadas e muita música em Olinda. "Vai ser lotado de gente. A minha orquestra está com muitos trabalhos já marcados e vai ser ótimo. Espero que seja um dos melhores", pontua. 

Esse é também um momento para reivindicar um olhar mais cuidadoso para o frevo ao longo do ano todo. "Eu queria que o governo e o povo abraçassem mais o frevo, porque ele está abandonado. O carnaval de Pernambuco é o melhor carnaval do mundo, mas a turma não está dando muito valor para tudo o que a gente tem. Queria que a turma olhasse mais para isso", conclui. 

Geraldo Azevedo - o sertanejo consagrado pelo frevo

O cantor nasceu em Petrolina, no sertão pernambucano, e começou a carreira musical com o frevo, quando integrou uma banda de carnaval. A estreia como compositor em 1967 também foi com o frevo. A música “Aquela Rosa”, escrita em parceria com Carlos Fernando, foi a vencedora do Festival de Música Popular do Nordeste, e atualmente é um clássico momesco.


Ao longo da carreira, Geraldo Azevedo coleciona músicas de sucesso. / Namaste Produções/Monalisa Marques

Sua trajetória é marcada por grandes clássicosparcerias importantes com Naná Vasconcelos, Alceu Valença, Xangai e Elomar, Elba e Zé Ramalho, por exemplo. Geraldo gravou mais de 20 discos e levou para o mundo não só o frevo, mas também  forró, xote, baião e maracatu.  Em 2019, o cantor revisitou o frevo ao lançar um disco inédito todo dedicado ao ritmo.

Leia mais: “Temos que perder a vergonha de defender um projeto socialista”, convoca o cantor Siba

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vanessa Gonzaga