FEMINISMO

Conheça a experiência de organização das mulheres do Saara Ocidental

18 de fevereiro se celebra o Dia da Mulher Saaraui: símbolo de luta anticolonial na África

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Bouba Mohamed Ali é professora de espanhol no acampamento de Dajla: "nosso maior objetivo é alcançar nossa independência", diz - Michele de Mello / Brasil de Fato

Neste 18 de fevereiro se celebra o Dia da Mulher Saaraui, data estabelecida para reforçar o protagonismo das mulheres na luta pela independência do Saara Ocidental. Essa organização vem de longe. A União Nacional de Mulheres Saarauis (UNMS) foi criada em 1974, apenas um ano depois da fundação da Frente Polisário, que unificou todas as organizações de base saaraui para lutar pela independência da Espanha. 

Desde então, a UNMS realiza seus próprios congressos, elege uma secretária geral e dez diretoras que atendem áreas específicas, entre elas: saúde reprodutiva, direitos humanos, território, informação e microcrédito. 

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"São vários departamentos para que a União consiga trabalhar com sua base a nível nacional e local", explica a secretária-geral da União de Mulheres Saarauis, Chaba Seini.

"Já levamos muitos anos entre guerra e paz, portanto precisamos informar as mulheres e prepará-las em todos os níveis: político, social e econômico", completa.


Chaba Seini é secretária geral da União Nacional de Mulheres Saarauis / Michele de Mello / Brasil de Fato

História

Em 1975, após vencer a monarquia espanhola, os saarauis passaram a resistir à invasão do reino de Rabat. A Marcha Verde foi uma invasão armada com 350 mil civis e militares enviados pelo rei Hassan II para tomar o Saara Ocidental. 

Durante mais de 30 anos de guerra contra o Marrocos, foram as mulheres que edificaram as Wilayas (cidades) nos acampamentos de refugiados, levantando as construções e organizando o governo local. 

Hoje existem cerca de 260 mil saarauis vivendo em cinco acampamentos na cidade de Tindouf, Argélia. Cada Wilaya tem o nome de uma cidade que existe no Saara Ocidental: Dajla, Auserd, Aaiun, Bujador e Smara. 

"Somos a base. Temos a responsabilidade de nos organizarmos na base, mas também para a luta armada. Vamos para o front sempre que seja necessário", comenta Chaba Seini. 

Nos primeiros anos de guerra e vida no exílio foram as mulheres saarauis que ensinaram aulas de idiomas, matemática e conhecimentos gerais às crianças. As pessoas que possuíam ensino superior escreveram os livros pedagógicos usados em sala até que os saarauis passaram a receber apoio de organismos multilaterais. 

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Apesar de contar com escolas, comércio e hospitas em todas as Wilayas, as crianças saarauis devem viajar a outras grandes cidades da Argélia ou ao exterior para cursar alguma graduação ou especialização técnica.


As mulheres eram a maioria da delegação eleita no último Congresso da Frente Polisário, realizado em janeiro deste ano, na Argélia / Michele de Mello / Brasil de Fato

As restrições da vida em situação de refúgio, como a ausência de universidades, são os principais fatores que levam as mulheres saarauis a deixar suas Wilayas. 

Mas há também quem emigre para estudar e decida voltar ao lar de origem. Bouba Mohamed Ali é da geração de mulheres que já nasceu no exílio, estudou na Espanha e acabou regressando à Dajala para assumir como professora de espanhol na escola de ensino primário.

"Escolhi essa profissão para ajudar o meu povo, as crianças do meu povo. Também posso ajudar qualquer país que precise da nossa ajuda, mas primeiro quero ajudar o meu povo. Tomara que tenhamos nossa independência para poder ajudar outros povos refugiados, como nós somos hoje", conta.

Ainda que Chaba e Bouba pertençam a distintas gerações, o compromisso com a libertação do seu povo é o mesmo. 

"O nosso desejo é viver assim como outras mulheres em qualquer parte do mundo, que podem viver em liberdade nos seus países, na sua terra, e nós não. Quem não tem sua independência não tem nada", sentencia Bouba Mohamed Ali. 

Edição: Patrícia de Matos