Combustíveis

Análise | As desonerações não resolvem o problema

Inesc sugere que Petrobras deixe de vincular o preço dos combustíveis aos mercados internacionais

Brasil de Fato | Santos (SP) |
Petrobras fup
É preciso retomar a Petrobras como uma empresa realmente pública que responda aos interesses do país - Divulgação

As desonerações são um remédio amargo. Elas desorganizam o financiamento das políticas sociais e incentivam o consumo de combustíveis com efeitos ambientais deletérios. Elas não resolvem a causa da doença (a volatilidade das cotações internacionais do petróleo) que, verdadeiramente, provocam o aumento no preço repassado aos consumidores.

Abrir mão dos impostos sobre os combustíveis, apresentada como a única solução para evitar preços exorbitantes na gasolina, não resolveu o aumento na inflação e apenas beneficiou as empresas petrolíferas (e seus acionistas) e a classe que se locomove com carro individual.

Desonerações amplas, como a aplicada em 2022, geram implicações na questão das desigualdades. Como são os mais ricos quem mais consomem combustível, realizar desonerações amplas beneficiam especialmente as classes mais altas, além de estimular o aumento da demanda como um todo. Logo, são subsídios de caráter regressivo.

Incentivos focalizados naqueles mais impactados pelo aumento ou flutuação de preços são mais baratos e realmente capazes de reduzir desigualdades. Por exemplo, o Auxílio Gás foi um programa focalizado em subsídios. 

O governo Lula, após dois meses de extensão das desonerações dos impostos federais, decidiu pela reoneração do PIS/Cofins para gasolina e etanol, o que aponta para um caminho positivo. O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) fez uma análise histórica e constatou que as desonerações não evitam novos e elevados aumentos, uma vez que os mesmos não estão relacionados com a majoração de impostos, mas são explicados pelas variações do preço internacional do petróleo.

Mesmo com as desonerações ao longo de 2022, o preço da gasolina acumulou alta de 35% entre janeiro de 2019 e junho de 2022, valores divulgados pela Fenafisco corrigidos pela inflação do período.

A partir da análise, o Inesc sugere para o curto prazo, a revisão da política do Preço de Paridade de Importação (PPI) e estabelecimento de uma nova composição de preços da Petrobras. No médio e longo prazo, a meta deve ser diminuir o peso dos combustíveis fósseis na matriz energética, principalmente no setor do transporte.

A solução para o problema no preço dos combustíveis depende ainda da adoção de medidas como realizar avaliações dos subsídios concedidos até agora às empresas petrolíferas de modo a evidenciar quem estão sendo os ganhadores desses subsídios; limitar e direcionar os subsídios aos combustíveis fósseis às pessoas mais afetadas pelos aumentos dos preços; e desestimular o transporte individual motorizado, subsidiando o transporte coletivo e movido com eletricidade ou energias renováveis - rumo à tarifa zero do transporte público.

Além disso, é preciso retomar a Petrobras como uma empresa realmente pública que responda aos interesses do país.

O poder público estava abrindo mão de recursos que poderiam ser aplicados em políticas sociais e ambientais e, ao mesmo tempo, indo na contramão das tendências internacionais de adotar medidas voltadas à redução do consumo de energias não renováveis. 

Tanto o PIS/COFINS, na esfera federal, quanto o ICMS, nas esferas estadual e municipal, são fundamentais para o financiamento das políticas sociais. Enquanto o PIS/COFINS é uma das bases da seguridade social no Brasil, o ICMS é o principal tributo dos estados.

O ICMS, responde por praticamente ¼ da carga tributária nacional e é também relevante para os municípios, posto que 25% da arrecadação são partilhados com esta esfera de governo. Ademais, o ICMS compõe a base para vinculação constitucional das aplicações mínimas que os entes subnacionais precisam aportar para a educação (25% das receitas de cada esfera de governo) e a saúde (12% para os estados e 15% para os municípios), indicando que quedas na arrecadação terão impactos diretos sobre os sistemas públicos de ensino e os serviços prestados pelo SUS. 

Enquanto desonerações ao etanol são mais favoráveis ao clima, ainda que a origem deste combustível seja a monocultura que degrada o meio ambiente e explora mão de obra, desonerações ao diesel e à gasolina são subsídios aos combustíveis fósseis que dificultam a transição energética no país.

Hoje no Brasil, são mais de R$ 100 bilhões anuais para o apoio aos subsídios fósseis. A reoneração proposta por Lula vai neste sentido, ao onerar mais a gasolina do que o etanol.

Enormes incentivos fiscais para a exploração e produção de petróleo, somados às desonerações ao consumo, só contribuíram para que empresas petrolíferas gerassem lucros extraordinários, a partir de preços altos, em dólar e não controlados pelo governo. A Petrobras, por exemplo, seguiu com um recorde de lucratividade atrás do outro, agradando acionistas com vultosos dividendos. 

*Livi Gerbase, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)

** Este é um artigo de opinião. A visão expressa não representa necessariamente a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

 

Edição: Rodrigo Durão Coelho