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Governo Bolsonaro bateu três vezes recorde de viagens oficiais à Arábia Saudita

Levantamento dos últimos sete anos mostra que gestão bolsonarista gastou, só em 2019, R$ 1,5 milhão com missões ao país

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Em 2019, o então presidente Jair Bolsonaro encontrou o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, que teria enviado as joias à Michelle - Alan Santos/ Presidência da República

Um levantamento feito pelo Brasil de Fato, com base em dados do Portal da Transparência dos últimos sete anos, aponta que o governo federal, durante o mandato de Jair Bolsonaro (PL), bateu três vezes o recorde anual de viagens oficiais à Arábia Saudita – o único ano em que não superou a marca foi em 2021, quando a pandemia impôs duras restrições de circulação internacional. 

Em 2019, foram realizadas 82 viagens, que custaram ao governo R$ 1,5 milhão. No ano seguinte, em 2020, foram R$ 423 mil gastos em 23 viagens. Em 2021, seis viagens tiveram custo de R$ 122 mil. Já em 2022, foram 40 viagens que custaram R$ 1 milhão. Nos três anos anteriores (2016 a 2018) foram 32 viagens, com custo total de R$ 539 mil. O maior gasto, até então, havia sido registrado em 2018, com 14 viagens que custaram R$ 265 mil. 

Para efeitos de comparação, o Brasil de Fato utilizou o período de 2016 a 2022 para realizar o levantamento. O recorte se refere à uniformização dos dados no Portal da Transparência, já que informações anteriores a essas datas podem estar incompletas, desatualizadas e sem o mesmo nível de detalhamento nos painéis do site.

Confira abaixo os números dos últimos sete anos:

2022: R$ 1 milhão, 40 viagens
2021: R$ 122 mil, 6 viagens
2020: R$ 423 mil, 23 viagens
2019: R$ 1,5 milhão, 82 viagens
2018: R$ 265 mil, 14 viagens
2017: R$ 232 mil 13 viagens
2016: R$ 42 mil, 5 viagens

O levantamento demonstra que a relação do governo brasileiro com a Arábia Saudita ganhou tração sob Bolsonaro. Essa interação, no entanto, pode ser controversa. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, o ex-presidente teria atuado pessoalmente para tentar liberar um presente do governo saudita que havia sido trazido de forma ilegal ao Brasil.

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O presente, um conjunto de joias e relógio de diamantes avaliado em três milhões de euros, foi apreendido pela Receita Federal em julho de 2021, de acordo com reportagem publicada na sexta-feira (3). Em meio a esse contexto, o aumento no número de viagens do governo federal ao país árabe levanta questionamentos sobre a natureza dessas viagens.

A intensa relação do governo brasileiro com a Arábia Saudita também é alvo de críticas de grupos de defesa dos direitos humanos. O país do Oriente Médio é conhecido por violações de direitos humanos e restrições à liberdade de expressão e à diversidade cultural.

Justificativas

O Brasil de Fato consultou as justificativas feitas pelos ministérios para emissão das passagens e diárias para as visitas à Arábia Saudita, que também estão disponíveis no Portal da Transparência. 

A maior parte das viagens ocorreu tendo como objetivo a participação de servidores do Executivo Federal em eventos internacionais, como feiras, seminários e encontros temáticos - sendo energia e indústria de defesa os temas mais abordados. 

Além disso, há uma série de viagens feitas por diplomatas do Itamaraty que atuam na região. Os ministérios das Relações Exteriores e da Defesa lideram o número de deslocamentos ao país.

“Estou rindo”

"Estou rindo", postou Michelle Bolsonaro (PL) em suas redes sociais, chamando de "vexatória" a revelação feita pelo Estado de S. Paulo sobre a tentativa do governo de seu marido de entrar ilegalmente no país com joias avaliadas em R$16,5 milhões de reais para a então primeira-dama.

As peças de diamantes teriam sido um presente dado em 2021 pelo governo do príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman – o mesmo que é acusado de ordenar o assassinato, em 2018, de Jamal Khashoggi, jornalista do Washington Post crítico de seu regime.

:: ONU aponta envolvimento de príncipe da Arábia Saudita em assassinato de jornalista ::

"Quer dizer que eu tenho tudo isso e não estava sabendo? Meu Deus! Vocês vão longe mesmo hein?! Estou rindo da falta de cabimento dessa imprensa vexatória", postou a ex-primeira-dama.

O ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), declarou que vai pedir que a Polícia Federal (PF) investigue a tentativa de importação ilícita do colar, do anel, do relógio e dos brincos. Segundo ele, um ofício com todas as informações será apresentado à PF na segunda-feira (6).

Entenda o caso

As joias foram encontradas em outubro de 2021 na mala do militar Marcos André Soeiro, assessor do então ministro de Minas e Energia de Bolsonaro, Bento Albuquerque. Na ocasião, a comitiva voltava de uma viagem à Arábia Saudita. Os agentes da Receita Federal retiveram as joias na alfândega do aeroporto de Guarulhos.

De acordo com a legislação brasileira, para entrar no país com mercadorias acima de mil dólares, o passageiro precisa pagar um imposto de importação que equivale à metade do valor do item. Se a pessoa é pega tentando omitir que está com o produto, como aconteceu nesse caso, há ainda uma multa adicional de 25% do seu valor.

A única forma de não pagar o imposto e a multa, que somariam cerca de R$ 12 milhões, seria declarar que se trata de um presente oficial para o Estado. Neste caso, no entanto, as joias ficariam com o Estado brasileiro, não com Michelle. Não foi a opção que quiseram, conforme revelam documentos de tentativas do governo Bolsonaro de reaver os diamantes.

*Matéria atualizada em 06 de março, às 9h50, para incluir informação sobre o período utilizado para fins de comparação

Edição: Geisa Marques