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Educação

Estudantes e professores no Paraná pedem revogação do novo ensino médio

Para especialista, mudança precarizou a aprendizagem. Comitê pela revogação é lançado em Curitiba

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Alunos e professores do Colégio Estadual, o maior do Paraná, criticam novo ensino médio - Divulgação

Aprovado em 2017 no governo Michel Temer e implementado em meados de 2022, o novo ensino médio tem provocado intenso debate entre estudantes e professores. No papel, o sistema aumenta a carga horária de ensino e apresenta nova grade curricular voltada para a formação profissional. Sua implementação vem ocorrendo de forma gradual, a partir do 1º ano do ensino médio, e com os estudantes do terceiro podendo optar por uma espécie de itinerário formativo, com divisão nas áreas de Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Humanas e Sociais e Formação Técnica e profissional.

Estudantes que, por exemplo, optarem por Matemática, não terão no currículo aulas de Arte, Sociologia e Filosofia. Outras matérias como “projeto de vida” ou até mesmo aulas de “empreendedorismo” têm sido acrescentadas na base curricular. Especialistas na área da educação e professores, assim como parte do movimento estudantil, vêm criticando há anos as alterações propostas pelo novo ensino médio têm pressionado o governo Lula para que revogue a medida.

Lorena Fontalvo, 16 anos, está no terceiro ano do ensino médio no Colégio Estadual do Paraná e é vice-presidente do grêmio estudantil da escola (GECEP). Conta que a entidade vem acompanhando a implementação nas outras séries e destaca que a adaptação ao novo currículo tem sido exaustiva. “A adaptação nunca é fácil e acaba sendo mais exaustivo, porque são matérias que nem os próprios professores sabem ainda como lidar.” Lorena ainda critica a ausência de matérias da área de humanas. “Parece que os alunos não vão sair do ensino médio pensando sobre a vida, questionando. Matérias como Sociologia e Filosofia e Artes foram se perdendo, e entrando matérias que só preparam a pessoa para o mercado de trabalho e não os estimulam a pensar”, critica.

Para o professor Ney Jansen, que dá aulas na escola e participa do Comitê Revoga Novo Ensino Médio PR, a implementação do novo sistema curricular no estado trouxe um cenário de esvaziamento científico. “Esse novo ensino médio significou, na prática, a sonegação à função social da escola, que é a sistematização, problematização e apropriação dos conhecimentos filosóficos, científicos e artísticos produzidos historicamente. (...) Fatiou-se o currículo com os itinerários formativos, impondo aos estudantes do 1º ano do ensino médio uma escolha precoce de qual itinerário deve seguir (Matemática e Ciências da Natureza e Linguagens e Humanas).”

O professor conta ainda que teve vários alunos que se arrependeram dos itinerários escolhidos, e critica a introdução de matérias como Empreendedorismo e Educação Financeira. “Ano passado tive vários estudantes que ficaram insatisfeitos com a imposição da escolha do itinerário e com sensação de arrependimento por ter feito uma escolha precoce ou pela influência do amigo. Esse novo ensino médio significa ainda a introdução no currículo de componentes sem viés científico, na linha da doutrinação ideológica neoliberal de viés coaching motivacional, com um discurso de responsabilização individual pelos sucessos e fracassos como Projeto de Vida, Empreendedorismo, Educação Financeira e Ética e Liderança. Ademais, os professores não são formados em ‘coach’ e se deparam com materiais produzidos por manuais de autoajuda”, critica.

“Extermínio do conhecimento”

A pedagoga e ex-diretora do setor de Educação da Universidade Federal do Paraná, Andrea Caldas, destaca que a revogação interromperia o que ela chama de “extermínio do conhecimento” na educação dos jovens e defende a retomada da discussão de um outro modelo. “É importante dizer que é preciso revogar o novo ensino médio, a gente não pode ficar esperando a construção democrática de um novo modelo enquanto os estudantes matriculados estão perdendo conteúdo e conhecimento, isso vai, inclusive, impactar na entrada deles no ensino superior”, reflete.

E faltando um ano para o vestibular, estudantes do segundo ano ouvidos pelo Brasil de Fato concordam com a preocupação de Caldas. Para o aluno do CEP, João Gabriel Varela, a grade do novo ensino médio prejudica no preparo para o exame. “Eles separam os alunos sem se preocupar se eles gostam de História ou Física. Eu, por exemplo, não tenho Física na minha grade, que é uma matéria que cai no vestibular. Em outras grades não tem Educação Física, então vem atrapalhando e precarizando o ensino, é algo que não dá mais, vem desgastando os alunos e a cada ano a grade vem ficando pior”, critica.

O Ministério da Educação ainda não se pronunciou publicamente a respeito da revogação, mas fontes ouvidas pelo Brasil de Fato afirmam que em princípio o governo Lula não deverá revogar o novo ensino médio, mas propor melhorias na lei que o regulamentou. Mas o Comitê Revoga Ensino Médio Paraná, que foi lançado neste início do mês de março, promete desenvolver uma agenda de atividades e mobilizações nas escolas para levar a discussão à frente.

Edição: Frédi Vasconcelos