Impasse na Bahia

MST é despejado de áreas da Suzano; reunião com movimento, empresa e governo será na quarta (8)

Com a chegada da polícia, a ordem judicial foi cumprida nesta terça (7) nas três áreas da empresa; não houve conflito

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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"A gente está denunciando o rastro de miséria que essa empresa tem deixado no extremo sul da Bahia", diz Eliane Oliveira, do MST - MST-BA

Depois de oito dias ocupando três fazendas da empresa Suzano Papel e Celulose no extremo sul da Bahia, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi despejado nesta terça-feira (7). O cumprimento das reintegrações de posse determinadas pela justiça aconteceu com a chegada de alto contingente da Polícia Militar, mas sem conflitos.

A desocupação dos cerca de 1500 trabalhadores rurais foi acompanhada pela Assistência Social e por seguranças da empresa. Eles estavam acampados em áreas nas cidades baianas de Mucuri, Teixeira de Freitas e Caravelas desde o último 27 de fevereiro.

A disputa entre a maior produtora mundial de celulose e o movimento popular prossegue agora com uma reunião marcada para 14h desta quarta-feira (8). Em Brasília, sentarão à mesa representantes do MST, da Suzano, do governo da Bahia e o ministro Paulo Teixeira, que comanda a pasta de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). O objetivo, afirmou Teixeira, "é retomar o diálogo interrompido". 

Ao Brasil de Fato, o MST disse que inicialmente a saída das áreas foi colocada como condicionante para que a reunião acontecesse. “Como a gente já desocupou em outros momentos e eles não cumpriram, tomamos a decisão de não desocupar simplesmente para ter reunião. O que fizemos foi cumprir a reintegração de posse decidida pela Justiça mediante a chegada de força policial”, explica Evanildo Costa, da direção nacional do MST na Bahia.  

O acordo não cumprido 

Segundo o MST, uma das expectativas da negociação - motivo que impulsionou a ocupação das áreas - é que a Suzano cumpra um acordo firmado com o movimento e a participação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em 2011.  

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Na época, e como resultado de denúncias do MST sobre os danos causados pela monocultura de eucalipto no extremo sul baiano, o pacto foi firmado com três gigantes do ramo. A Veracel, a Fibria e a Suzano se comprometeram a ceder terras para assentamentos da reforma agrária. 

“Nas áreas da Veracel nós assentamos 720 famílias. Nas áreas da Fibria, 612 famílias. Nas áreas da Suzano, que seria o compromisso de 650 famílias, até agora nada”, critica Costa. A expectativa com a reunião, aponta, é que depois de 12 anos, a questão caminhe. 

Em nota, a empresa afirma que “a completa entrega das áreas pela Suzano depende de processos públicos que ainda não ocorreram ou foram implementados pelo Incra”. 


Trabalhadores rurais desmontam acampamento; ao fundo a faixa da jornada de luta das mulheres: "O agronegócio lucra com a fome e a violência" / MST-BA

Deserto verde x reforma agrária 

De acordo com o MST, as ações nas áreas da Suzano tiveram também o objetivo de trazer luz aos custos ambientais e sociais causados pela presença da empresa na região, que cresce nos últimos 30 anos.  

“Aqui no extremo sul da Bahia, 70% das áreas agricultáveis estão nas mãos das papeleiras, da Suzano principalmente”, relata Eliane Oliveira, da direção Estadual do MST na Bahia.  

A Suzano informou que nesta região, ela gera sete mil empregos diretos e que, por meio de seus projetos sociais, alcança 82 comunidades. Somente em 2022, o lucro líquido da multinacional cresceu 20% em relação ao ano anterior, chegando a R$ 22,56 bilhões. 


Em Mucuri (BA), trabalhadores rurais caminham na estrada depois da reintegração de posse / MST-BA

Com uma visão oposta ao da corporação, os trabalhadores rurais argumentam que esse lucro não volta para a sociedade. Ao contrário: em nota, o movimento argumenta que a produção em grande escala de eucalipto está causando uma “crise hídrica nos municípios” e denuncia a “pulverização aérea de agrotóxicos, o assolamento e a secagem dos rios e nascentes e a destruição da flora e fauna na região”.  

"Questionamos a quem interessa que este modelo seja reconhecido como 'produtivo', já que é a população da região que paga o alto custo de tal produtividade", diz o MST. 

Um estudo feito em parceria entre a USP e o Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento (Cirad), da França, ressalta o impacto ambiental dos monocultivos de eucalipto. No seu pico de crescimento, mostram os pesquisadores, essas plantações podem consumir quase o mesmo volume de água trazida pela chuva para as bacias.   

Segundo a Agência Fapesp, dos cerca de 10 milhões de hectares de plantações comerciais de madeira no Brasil, 80% são de eucalipto para produção de celulose.  

Edição: Rodrigo Durão Coelho