Depois de três anos de ausência, a Festa da Semente Crioula de Seberi, realizada pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), retornou com muito simbolismo e grande participação popular. Cerca de 1.500 pessoas foram até a sede da cooperativa Cooperbio, na comunidade de Lajeado Tesoura, para reafirmar a mística das sementes e celebrar a resistência da classe camponesa e da agricultura familiar.
Saiane Santos, dirigente nacional do MPA, que veio da Bahia para participar da festa, comenta a importância da reafirmação da força do campesinato e a disposição do povo para colocar-se em movimento. “A gente só vai avançar com luta e com organização. A festa da semente demarca isso, depois de três anos sem realizar esse evento, o nosso povo veio com muita vontade.”
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Para a dirigente, os temas da soberania alimentar, sementes crioulas, produção de alimentos, agroecologia e abastecimento popular são as principais bandeiras do MPA na atualidade e todas estavam presentes na festa. Outro ponto prioritário apontado pela dirigente nacional é a luta das mulheres, que vem em jornada contínua desde o 8 de março, afirmando “Camponesas em luta, contra a fome e as violências, abastecendo de alimentos e esperanças o povo brasileiro”.
A programação contemplou a partilha de sementes e mudas, apresentações culturais de canto e poesia, lançamento de livros, comercialização de artesanato, práticas de economia solidária e, claro, a grande mesa camponesa compartilhando alimento produzido pelas técnicas da agroecologia com todos os presentes. No tocante às sementes crioulas, foram recebidas mais de 300 variedades de sementes e mais de 200 variedades de mudas de árvores, plantas medicinais e flores compartilhadas na mesa comum. Guardiões e guardiãs de sementes de todo o RS e das regiões oeste e serrana de SC estiveram presentes reforçando, a partir da partilha das sementes, também a partilha dos saberes.
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Diversidade e envolvimento
O presidente da Cooperbio, Marcos Joni de Oliveira, destacou que a comissão organizadora foi surpreendida positivamente pela forte mobilização que aconteceu na promoção da festa e pela adesão dos participantes da comunidade de um modo geral. “Foi uma oportunidade de debater o tema da produção do alimento, da comida de verdade, da agroecologia e através dessas conversas mostrar para a sociedade a importância do campesinato e da produção de alimentos pelas mãos das mulheres e dos homens do campo.”
Acrescentou ainda que o evento teve simbologia positiva para o movimento e de modo especial para a própria cooperativa, que iniciou as comemorações dos 10 anos de implantação do seu centro territorial de cooperação no município de Seberi. “A repercussão positiva que aconteceu e que continua acontecendo nos leva a já pensar em como podemos fazer para intensificar ainda mais a participação do movimento e da cooperativa junto aos demais segmentos comunitários e potencializar ainda mais a Festa da Semente Crioula nos próximos anos.”
A diversidade tem sido uma característica nas ações emanadas a partir do centro de cooperação e formação da Cooperbio ao longo da última década. Isso também foi possível de se verificar de forma sintetizada nos espaços da Festa da Semente Crioula que expandiu sua proposta para também abrigar as iniciativas da Economia Solidária no melhor sentido do preceito do Fórum Social Mundial quando diz que “um outro mundo é possível e uma outra economia é necessária”.
No espaço dos feirantes isso se mostrou de forma especial através do artesanato, livros e publicações, bioinsumos, panificados, chás e ervas medicinais, sementes, licores, destilados, sucos, vinhos, frutas e flores entre outros produtos. Essa diversidade foi exposta e comercializada por preço justo em mais de 30 estandes onde o protagonismo foi exercido pelas agricultoras e agricultores camponeses e familiares, empreendedores sociais e segmentos dos povos originários.
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O prefeito municipal, Adilson Balestrin (MDB), classificou a atividade como “um momento especial, onde se colocou em destaque o desafio da produção de alimentos, oferecendo às famílias camponesas a oportunidade de retomar e fortalecer essa tradição de trocar sementes e saberes”. Para Balestrin é preciso que todos estejam dispostos a “reforçar a produção de alimentos agroecológicos, que favorecem a saúde da população, resgatando a cultura que vem dos nossos antepassados e em momentos como esse se fortalece nos dias de hoje”.
Já a vereadora Mara Falcão (MDB), presidente da Câmara de Vereadores local, afirmou em seu pronunciamento a importância de ser reconhecido o protagonismo das mulheres no setor produtivo, de modo especial nos espaços da agroecologia. Ela frisou que a proximidade com o 8 de março também estava em destaque no espaço, repleto de mulheres fortes e protagonistas nos mais diversos setores, mas que ficava ainda mais relevante no tema da preservação e partilha das sementes crioulas, que são o esteio para compor a base de uma alimentação saudável para todo o povo brasileiro.
Tradição e ressignificação
Irene Reis da Silva, camponesa da base do MPA em Seberi, comentou que “a festa da semente voltou para ficar, é uma marca do movimento e se tornou uma referência territorial também neste espaço”. Ela destaca ainda a forma envolvente que os participantes demonstraram ao longo das atividades: “Foi um evento maravilhosos, foi lindo ver a empolgação das pessoas participando, se sentindo parte do que estava acontecendo, essa é a verdadeira mística da semente!”.
Irene, que ao longo de toda sua vida vem defendendo a bandeira da agroecologia, da sabedoria popular e do protagonismo do campesinato na produção de alimentos saudáveis também celebrou a forte presença feminina no evento. “Nós somos as protagonistas no trabalho com as sementes crioulas e no resgate da diversidade, essa grande celebração tem a marca da força da mulher camponesa”.
O músico Antônio Gringo, que juntamente com o poeta Odilon Ramos e diversos talentos artísticos locais e regionais assumiram a frente das apresentações de arte popular, destacou que a arte também é uma espécie de semente, semeia vida, semeia consciências, alimenta a alma e anima o caminho daqueles que lutam pela construção de um mundo melhor. “Assim vamos resistindo, caminhando e fazendo a história acontecer, como companheiros e companheiras vamos levar o nosso esperançar para poder avançar”, arrematou Gringo.
A relação entre os saberes tradicionais do campesinato e a sua ressignificação através dos espaços acadêmicos também foi marcante, com a presença de turmas de alunos, professores e pesquisadores vinculados a universidades federais e comunitárias. O espaço da Cooperbio – que se propõe a ser uma sala de aula aberta e permanente para a fundamentação da agroecologia, produção de alimentos saudáveis e os temas relacionados as questões ambientais nos espaços de educação pública – oportunizou às delegações universitárias um momento ímpar de relacionar-se com os saberes milenares do campesinato em toda sua diversidade.
Mobilização e resistência
Integrante da direção estadual do MPA, Vanderleia Chitó, do município de Progresso, resumiu a festa da semente como um grande momento de reencontro depois de um tempo que não foi só de ausência pela questão da pandemia, mas também da superação da opressão que representou o último período político para a classe camponesa. “Nos reencontramos em um novo momento, de renovação em todos os sentidos, onde buscamos resgatar o que perdemos: resgatar as sementes para os plantios e resgatar a esperança das pessoas para seguir em frente”.
Léia destacou que para o MPA foi um passo dado enquanto movimento, conseguindo reunir as pessoas e compartilhar saberes. “Pudemos ver que a diversidade resistiu, a diversidade do que produzimos e de quem somos resistiu e seguimos firmes neste novo tempo”, concluiu.
Frei Sérgio Görgen, dirigente vinculado à Via Campesina, que durante as duas semanas que antecederam a Festa da Semente Crioula circulou na região, em uma jornada de mobilização da base do MPA, afirma considerar a atividade como “um marco na reconstrução do MPA, com sua pauta estratégica de transformar o campo, produzindo alimentos saudáveis e protegendo a natureza sendo demonstrada na prática”.
Nos próximos dias a comissão organizadora vai se reunir para avaliar a atividade e sistematizar as sugestões de melhorias, bem como já deixar encaminhada a data de sétima edição da Festa da Semente Crioula e a segunda edição da Feira de Economia Solidária.
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Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Marcelo Ferreira